Abordarei nesse texto o tema específico sobre Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC), trazendo um apanhado da importância da Hipnose em psicoterapia, para apontar os aspectos mais importantes que têm congruência teórica e neurocientífica com as bases da hipnose clínica. Do contrário nos estenderíamos demais em assuntos acadêmicos intermináveis sobre a abordagem. Também porque foi a minha especialização e porque o meu trabalho está ligado a esta leitura de ser humano que entra na minha clínica. Impossível ser ateórico em abordagem psicológica, seria como navegar um barco sem rumo algum.

A TCC nos traz exatamente a percepção de que nossos comportamentos e nossas emoções, bem como nosso corpo em nível de sensações, são diretamente afetados pela forma como pensamos, como avaliamos os eventos à nossa volta, como os processamos no cérebro. Baseada em evidências científicas, ela nos aporta com conceitos seguros e com resultados comprovados em grandes populações. Tudo isso graças a Aaron T. Beck, psiquiatra, ex psicanalista, e sua filha Judith Beck, criadores da abordagem e autores de obras de alta qualidade e relevância científica, e em parceria com outros personagens importantes na TCC.

Padrões alterados

A Terapia Cognitivo-Comportamental é geralmente de curto prazo e focada em ajudar os clientes a lidar com um problema muito específico. Durante o curso do tratamento, as pessoas aprendem a identificar e alterar padrões de pensamento destrutivo ou perturbador que têm uma influência negativa sobre o comportamento

A abordagem geralmente concentra-se em dificuldades no aqui e agora e confere ao terapeuta e cliente o desenvolvimento de uma visão compartilhada do problema do paciente. Isto então leva à identificação personalizada, a terapia de tempo limitado com metas e estratégias que são constantemente monitoradas e avaliadas pelos dois e auto monitoradas pelo cliente. Psicólogos cognitivos-comportamentais trabalham com indivíduos, famílias e grupos. A abordagem pode ser usada para ajudar a qualquer um, independentemente da capacidade, cultura, raça, sexo ou preferência sexual.

De acordo com a TCC, os indivíduos atribuem significado a acontecimentos, pessoas, sentimentos e demais aspectos de sua vida e, com base nisso, comportam-se de determinada maneira e constroem diferentes hipóteses sobre o futuro e sobre sua própria identidade. As pessoas reagem de formas variadas a uma situação específica podendo chegar a conclusões também variadas.

Em alguns momentos, a resposta habitual pode ser uma característica geral dos indivíduos dentro de determinada cultura, em outros momentos estas respostas podem ser idiossincráticas, derivadas de experiências particulares e peculiares a um indivíduo. Em qualquer situação, essas respostas seriam manifestações de organizações cognitivas ou estruturas. Uma estrutura cognitiva é um componente da organização cognitiva em contraste com os processos cognitivos que são passageiros (Beck, 2011).

A natureza de conceitos

A teoria cognitiva tem como objeto de estudo principal a natureza e a função dos aspectos cognitivos, ou seja, o processamento de informação que é o ato de atribuir significado a algo. O objetivo da Teoria Cognitiva é descrever a natureza de conceitos (resultados de processos cognitivos) envolvidos em determinada psicopatologia de maneira que, quando ativados dentro de contextos específicos, possam caracterizar-se como mal adaptativos ou disfuncionais. 

Atualmente, outras abordagens psicológicas já se apropriam de técnicas e conceitos da TCC como ferramenta complementar e coadjuvante no desenvolvimento de seus trabalhos, qualificando as intervenções e principalmente trazendo melhores resultados com seus pacientes.

O que mais surpreende hoje é a utilização do termo “imagens mentais e imaginação” na literatura da TCC, principalmente nos livros de Judith Beck, matéria-prima da hipnose na clínica. O ansioso tem uma imaginação antecipatória e auto derrotista muito forte, com cenários negativos percebidos como reais, transmitindo ao corpo toda a sorte de alertas e hipervigilância constante. Já dizia Albert Einstein em seus estudos, “a imaginação é mais forte do que o conhecimento”.

Impulso emocional do pensamento

Quando falamos em pensamento, este só é validado quando se liga a um impulsionamento emocional e uma imagem mental. Sozinho é apenas uma hipótese insipiente. O que o valoriza é ter campo receptivo a ele, vulnerabilidade e cenários que o estruturem, palco, vitrine. Nós, como terapeutas cognitivos, temos um vício que vem naturalmente da especialização, que é perguntar ao paciente: “o que você estava pensando naquela situação?”.

O que 99% dos pacientes nos responde? “Não lembro”.

Por que isso ocorre? Claro que um paciente que chega ansioso e sintomático, na maioria das vezes está em estado de alerta, em fuga, com o corpo preparado para fugir, com hipoativação pré-frontal, hiperativação amidaliana, e, portanto, pensar não é necessário e a memória está igualmente fraca. No entanto, se você mudar a pergunta e questionar de outra forma: “o que você imaginava naquela situação?” cria uma amplitude mnemônica muito maior, que valoriza o cenário, as imagens mentais e depois fica muito mais fácil extrair a cognição ou mesmo os pensamentos automáticos neste novo conceito de abordagem cognitiva.

Psicoeducação do raciocínio

Uma psicoeducação do paciente sobre este raciocínio é fundamental para que ele possa acompanhar didaticamente como funciona o processo e como obter melhor resultado. Todos podem entender. Ensinar ao paciente por que e como as coisas ocorrem é fundamental. Colocá-lo no processo hipnótico e identificar pensamentos automáticos por imagens mentais dentro de cenários vivificados como reais é muito mais fácil para o ele e tem maior envolvimento de todos os seus sentidos e todas as suas emoções. Você vai entender mais adiante o que eu falo. Portanto, você vai entender como a hipnose clínica se apropria das técnicas da TCC para potencializar a intervenção terapêutica, buscando maior campo emocional, vivificação de cenários e experienciação avaliada como real. Não haverá mudança em psicoterapia enquanto não houver profundas mudanças emocionais no setting, segundo Young (2008).

A hipnose clínica ensina os pacientes a usar um estado de relaxamento profundo para resolver problemas como tabagismo, perda de peso, alívio da dor, ou auto aperfeiçoamento. A decisão de usar a hipnose em contextos clínicos, além do tratamento, só pode ser tomada em consulta com um profissional de saúde, aqui saúde mental, qualificado, treinado no uso e nas limitações da hipnose clínica.

Existem várias definições de hipnose, a partir de uma variedade de perspectivas, variando de fisiológicas a psicanalíticas. A American Psychological Association (APA) define a prática como “um procedimento durante o qual um profissional de saúde ou pesquisador sugere que um cliente, paciente ou sujeito experimente mudanças nas sensações, percepções, pensamentos ou comportamento”. O contexto hipnótico é geralmente estabelecido por um procedimento de indução.

Embora existam muitas induções hipnóticas diferentes, a maioria inclui sugestões de relaxamento, calma e bem-estar. Instruções para imaginar ou pensar em experiências agradáveis ​​também são comumente incluídas nas induções hipnóticas. Quando em psicologia, operacionalizam-se demandas da psicoterapia.

Quais benefícios e preocupações?

A hipnose ofereceu aos adeptos alívio da dor, da depressão, da ansiedade, do estresse, da privação de sono, auxiliou no controle de dietas alimentares, e muitos outros problemas médicos e psicológicos. Demonstrou-se particularmente eficaz durante o parto (hipnoparto) e em ambientes pediátricos e até promoveu anestesia durante o parto a cirurgia e procedimentos médicos dolorosos.

A hipnose geralmente apresenta poucos riscos para as pessoas mentalmente saudáveis. Existem algumas precauções com funcionamento de personalidade e transtornos psiquiátricos graves. A hipnose pode não ser recomendada para pessoas com depressão com sintomas psicóticos ou distúrbios de personalidade, como transtornos esquizofrênicos, limítrofes. É essencial que qualquer pessoa interessada em hipnose escolha um profissional competente da área de saúde mental, licenciado, com treinamento e certificação específicos para hipnose nos procedimentos clínicos ligados à psicoterapia.

A hipnose é um estado neurologicamente modificado, assim como o sono também o é, em que o paciente experimenta um relaxamento intensamente profundo, com mudanças rápidas de tônus muscular e aumento da acuidade mental. A pessoa vivifica como reais cenários e comportamentos sugeridos pelo psicólogo, operacionalizando de forma compulsiva dentro de um planejamento terapêutico prévio, sempre baseado em um psicodiagnóstico e uma psicoeducação adequada por meio de um “pré-talk”.

Chama-se hipnose clínica por sua utilização neste campo profissional e não atrelada ao entretenimento ou trabalhos de palco. Existem muitos preconceitos que distorcem absurdamente o valor terapêutico da hipnose, principalmente atuando nos transtornos mentais ou associando ao esoterismo, religião, rituais satânicos, etc. É um processo totalmente consciente, sempre importante lembrar isso!

E MAIS…

A Hipnose está presente em diversas áreas da saúde

A hipnose hoje tem atuação em vários segmentos da área da saúde e não só na saúde mental, como na fisioterapia, enfermagem, terapia ocupacional, quiropraxia, nutrição, nutrologia, endocrinologia, psiquiatria (toda a área médica), odontologia, educação física, estendendo-se à área da educação para pedagogos e psicopedagogos. Tem um braço forte no esporte, principalmente na preparação de atletas de elite e competição.

Referências
Beck, A. T. & Alford, B. A. (2011). Depressão: Causas e tratamento. Porto Alegre: Artmed.
Beck, J. (2012). Terapia cognitivo-comportamental: Teoria e prática (2.ed.). Porto Alegre: Artmed.
Craske, M. G. & Barlow, D. H. (2006). Mastery of your anxiety and worry. NewYork: Oxford University Press.
Denis, M. & Kosslyn, S. M. (2015). Neuroimaging of mental imagery: A special issue of the European Journal of Cognitive Psychology. New York: CRC Press.
Jagot, P. C. (1993). Iniciação à arte de curar pelo magnetismo humano. São Paulo: Pensamento.
Krisch, I., Montgomery, G., & Sapirstein, G. (1995). Hypnosis as an adjunct to cognitive-behavioural psychotherapy: A meta-analysis. J. Consult. Clin. Psychol., 63(2), 214-220.
Lewis R Goldberg Publication date  1993/1  – Journal American psychologist  volume    Publisher  American Psychological Association
Paivio, A. (1979). Imagery and verbal process. London: Taylor & Francis.
Schultz, J. H. (1932). Das Autogene Training. Leipzig: Thieme.
Silberfarb, B. (2011). Hipnoterapia cognitiva. São Paulo: Vetor.