A orientação profissional/vocacional atravessa a relação orientador e orientando em que sua própria denominação traz a ideia de um que possui o saber e o transmite e o outro recebe de forma passiva as determinações para encontrar um caminho profissional mais adequado a sua personalidade.

Trata-se de um processo que objetiva resolver um problema: a dúvida sobre a profissão, seja na escolha ou na nova escolha de um caminho laboral.

O conceito de trabalho

No livro mais vendido do mundo, a Bíblia, o trabalho é o castigo dado a Adão e Eva por terem desobedecido uma ordem. Na história da escravidão, o trabalho é visto como atributo daquele que não tem valor, não tem alma e, portanto, deve forçosamente contribuir com o seu senhor para construir a riqueza deste.

Somente com esses dois exemplos, a palavra trabalho traz a ideia de dificuldade, de algo com peso e penoso. Nem sempre essa foi uma questão que interessasse estudos e a relação das teorias psicológicas com o trabalho. Ele surge somente na década de 1920, com a necessidade de regularizar os cursos profissionalizantes para a indústria, o comércio e a agricultura.

Maior produtividade

Eram utilizados testes psicométricos para a medição de interesses e aptidões do trabalhador ou futuro trabalhador. Estudava-se a “natureza humana” e as formas de adaptá-la aos contextos empresariais. O objetivo era o estudo e avaliação para a possibilidades de maior produtividade, “o homem certo no lugar certo”, sem levar em consideração a história do sujeito e possibilidades de mudança.

Nos anos 1970, Rodolfo Bohoslavsky publica seu livro sobre a estratégia clínica em Orientação Vocacional, que é utilizado como referência até os dias de hoje no campo da orientação profissional/vocacional. A grande mudança nesta teoria é de enxergar o indivíduo como agente ativo de sua escolha.

Um novo olhar

Rodolfo Bohoslavsky critica a modalidade estatística onde o sujeito é mensurável e passivo frente ao processo de escolha e traz ideias significativas para um novo olhar do sujeito em processo de orientação profissional/vocacional.

Na modalidade clínica, o orientando pode chegar a uma decisão se conseguir elaborar os conflitos e ansiedades que experimenta em relação ao futuro. As potencialidades não são estáticas. A satisfação ao estudo e a profissão depende do vínculo. A realidade sócio-cultural sofre mudanças e com isso os campos de trabalho também.

O indivíduo tem papel ativo na escolha e a tarefa do psicólogo ou orientador é de esclarecer e informar, auxiliar no trajeto.

Identidade construída

Apesar da grande importância da teoria de Bohoslavsky não posso deixar de citar e considerar aqui a abordagem do brasileiro Silvio Duarte Bock e sua grande contribuição para os processos de orientação profissional/vocacional.

Na abordagem sócio-histórica trás em seus fundamentos que existe uma condição humana, nenhum aspecto de habilidades, aptidões “nascem” com o homem e este é um ser histórico, ativo e sociável.

Essas são duas teorias no campo de estudos da orientação profissional/vocacional e que embasam o meu trabalho na clínica, e por isso continuarei o texto considerando os aprendizados que obtive a partir delas.

Até aqui já dá para ter uma ideia daquilo que posso propor com a orientação profissional/vocacional, pois trata-se de um processo que abarca a vida do sujeito como um todo e trabalha a questão da identidade profissional construída através de sua história, capacidades, oportunidades, interesses, aptidões – dimensões não estáticas e por isso tão ricas.

A quem se destina?

Diferente do que muitos pensam, o processo não é só voltado para o adolescente e jovem que quer fazer a escolha de sua profissão. Ou ainda para o jovem ou adulto que está cursando uma faculdade, mas não está satisfeito com o curso e busca outras possibilidades fora ou dentro da mesma área.

Ele também pode fazer toda a diferença para a pessoa que quer ser empreendedora. Para aqueles profissionais que não estão enxergando sentido na função ou posição e que exercem no momento atual. Para aqueles profissionais e querem alterar o rumo de sua vida e se preparar para uma aposentadoria. As possibilidades são muitas e com objetivos distintos.

Para encarar os desafios

Eu sempre penso a partir de que toda profissão tem o objetivo de contribuir para a construção de uma sociedade justa e próspera para todos. Fora isto, estamos andando em sentido contrário ao propósito do trabalho e paga-se um preço alto por isso: a falta de saúde mental.

O comprometimento da saúde mental do trabalhador, respinga em toda a sociedade: na família, na comunidade, nas pessoas a quem ele presta serviços…

Sendo assim, é correto dizer que o processo de orientação vocacional/profissional vai muito além da escolha. Ela atua na promoção da saúde e isso significa compreender e trabalhar com o indivíduo em uma das facetas mais importantes da vida: o trabalho. A partir das suas relações sociais e construir com ele as transformações necessárias, ampliando a consciência que a pessoa possui sobre sua realidade, dando suporte e instrumentos para que ele possa agir sobre as dificuldades e desafios que é apresentado a ele. Um trabalho para um significado, um propósito, um esclarecimento de quem se é, para onde quer ir incluindo a sua história e a história da sociedade que o cerca.

Com o trabalho promovido por um profissional experiente em encontros individuais ou em grupo é possível alcançar os objetivos estabelecidos.

Projeto de vida

Depois de um levantamento de expectativas e contrato o Orientador irá utilizar de técnicas e mediadores específicos, focado na resolução do conflito e em busca de uma ou algumas decisões e ações a serem tomadas. A orientação também pode incluir a elaboração de um projeto com as etapas da construção de seu caminho dali em diante. E com a reforma do Ensino Médio, é possível que este serviço chegue a um maior número de jovens, trazendo a oportunidade de trilhar mais que a escolha de uma profissão, mas o caminho de um projeto de vida.

E MAIS…

Rumo à construção de uma sociedade mais consciente

Dada a história da humanidade em relação ao trabalho e tantas alterações, mudanças e desafios a orientação profissional/vocacional tende a ser um serviço mais valorizado e utilizado para a promoção da saúde emocional, mental de todos nós, afinal se reconhecer em nossas potencialidades, dificuldades, ser quem se é pode nos fazer a andar com passos mais firmes, para caminharmos juntos na construção de uma sociedade mais consciente, justa e próspera.

Referências:
Orientação profissional, a abordagem sócio-histórica, Silvio Duarte Bock. 4 ed. Ampl. – São Paulo: Cortez, 2018.
Orientação Vocacional: A estratégia clínica, Rodolfo Bohoslavsky. 11 ed. São Paulo – Martins Fontes, 1991.