Para entendermos melhor essa trajetória que vai estabelecer vínculos entre passado e o presente no aparelho psíquico do sujeito, ou de um certo paciente, vamos compreender melhor as definições de Neurose de Angústia e Neurose Atual.

Não é de se negar que em sua maioria, profissionais da saúde mental, tenham uma grande dificuldade de trabalhar entre um conjunto de sintoma a outro, gerando muitas vezes um diagnóstico impreciso, portanto ineficaz para o tratamento dos transtornos ansiosos.

Resta compreender que, se até mesmo pessoas tão preparadas ocupacional e profissionalmente para lidar com as demandas de sofrimento mental dos seus pacientes, sofrem com o número crescente de ramificações e critérios diagnósticos atualmente redigidos em nosso novo Manual Diagnóstico de Transtornos Mentais, o DSM V, quanto mais leigos e pessoas ainda que curiosas procurando por uma resposta nas redes de busca da internet e tem desprendido um enorme esforço para entender as relações conflitantes que parecem emergir em seu estado consciente através de sintomas emergentes (DALGALARRONDO).

Basendo-se nisso, propomos aqui, através de uma releitura do capitulo vinte e seis do Manual de Técnicas Psicanalíticas de David Zimerman, uma investigação desses conflitos e uma classificação mais adequada aos quadros de ansiedade, depressão e de neuroses clássicas.

Associação entre neurose e ansiedade

Para Zimerman, uma das características mais próximas de uma pessoa sob estado de ansiedade, ao contrário do que se presume como sintomas clássicos de pensamento acelerado, alta performance cognitiva e um prejuízo claro da concentração, está a angústia.

O autor descreve a angústia na maior parte do tempo como a forma mais flutuante e emergente dos sintomas de um determinado paciente em colapso com suas proporções internas e portanto, na sua maioria, inconscientes.

Desejos de ruina, baixa autoestima, tristeza e sofrimento, não são sintomas apenas classificados pelo DSM V como observáveis em casos de uma depressão.

A sensação de ruina em determinados setores como os da família, do trabalho, no desempenho sexual e até certo grau de insatisfação com sigo mesmo, são características costumadas às neuroses.

Como pudemos afirmar, as características de pensamento acelerado, sintomas do pânico, perda de concentração entre outros sintomas ansiosos, também são elencados entre os sintomas neuróticos, onde o seu portador requer uma grande energia interna para lidar com o seu sofrimento, com a sua angústia que, logo se desenvolve numa armadura, gerando assim os sintomas ansiosos.

O conceito vem do século passado

A Neurose é um termo proposto em 1769 pelo médico escocês William Cullen (1710-1790) para definir as doenças nervosas que acarretavam distúrbios da personalidade. O termo foi popularizado na França por Philippe Pinel (1745-1826) em 1785. Retomado como conceito por Freud a partir de 1893, o termo é empregado para designar uma doença nervosa cujos sintomas simbolizam um conflito psíquico recalcado, de origem infantil. Com o desenvolvimento da psicanálise, o conceito evoluiu, até finalmente encontrar lugar no interior de uma estrutura tripartite, ao lado da psicose e da perversão. Em consequência disso, do ponto de vista freudiano, classificam-se no registro da neurose a histeria e a neurose obsessiva, às quais é preciso acrescentar a neurose atual, que abrange a neurose de angústia e a neurastenia. (ROUDINESCO E PLON – 534/535)

Os pacientes portadores de uma estrutura neurótica caracterizam-se pelo fato de apresentarem algum grau de sofrimento e de adaptação em alguma, ou mais de uma, área importante de sua vida, diz Zimerman.

Pacientes com certo grau de neurose, para o médico e psicanalista didata, possuem um histórico de sofrimento e uma carga de ansiedade, preocupação e de aflição que estejam relacionados com também, o aqui e o agora.

As diferentes formas de neurose

Elisabeth Roudinesco e Michel Plon, descrevem as neuroses em suas múltiplas formas clássicas como, neurose atual, neurose de angústia, fobias, obsessivo-compulsiva e histerias. Já aqui, iremos destacar as que se manifestam pelas somatizações, pelos transtornos alimentares, depressivos, etc. Numa clínica atual, é difícil diagnosticar um quadro de ansiedade pura. Uma estrutura neurótica simples. Assim portanto, passo a fazer aqui, algumas observações sobre este assunto.

A NEUROSE DE ANGUSTIA – A respeito da neurose, Zimerman destaca:

Freud estudou a angústia em dois momentos de sua obra. Na primeira formulação, a angústia seria consequente à repressão, o que provocaria uma libido acumulada que funcionaria de uma maneira tóxica no organismo. A partir de sua monografia Inibições, sintomas e angústias (1926), a conceituou de forma inversa, ou seja, a repressão é que se processa como uma forma de defesa contra a ameaça de irrupção da angústia, mais especificamente, a angústia de castração.

Freud não disse, nada mais nada menos que, o sujeito que vive sob a força de uma angústia, reproduz os conflitos que carrega, por fora e por dentro, ou seja, uma falta do desejo (uma inibição – um represamento do desejo) e os excessos dele (um disparo de energia da libido, deslocada de maneira inapropriada, porém, no intuito de proteger o ego).

De maneira resumida, ainda me apropriando das palavras do psicanalísta David Zimerman é considerável que uma neurose de angústia, manifeste por meio de uma angústia livre. O mesmo já dizia:

“A ansiedade do paciente expressa-se tanto por equivalentes somáticos (como uma opressão precordial, uma taquicardia, uma dispneia suspirosa, uma sensação de uma ‘bola no peito’, etc.), como por uma indefinida e angustiante sensação de medo de que possa vir a morrer, enlouquecer, ou da iminência de alguma tragédia.”

NEUROSE ATUAL E NEUROSE DE ANGÚSTIA – É condição sine qua non que se apresente uma clara definição entre os conceitos de neurose atual e neurose de angústia, onde em cada uma delas, o paciente/ sujeito, sente e trabalha de maneira diferenciada as suas manifestações. Numa ele estará envolvido na infância como veremos mais a frente, noutra, ao esforço de pensar no porquê se rendeu a conflitos pessoais e nada primitivos, porém, hodierno.

Numa neurose atual, é difícil corresponder as armadilhas de uma agonia que se processa no hoje sem saber a sua origem. Já na neurose de angústia, o sujeito retorna aos seus relacionamentos ancestrais por dentro, no seu estado inconsciente e possivelmente tais vínculos sejam de origem edipiana e de castração.

Édipo, filho de Jocasta, mata seu pai em um conflito a beira da estrada e se torna rei no lugar do pai. Mais tarde, ao descobrir que matou o próprio pai, se entrega em um declínio até a morte. Freud chamava Édipo, ou Castração, ao fenômeno que se dá de interrupção de uma criança em seus cinco ou seis anos de idade, aos afetos do pai ou da mãe.

A relação com ansiedade e depressão

O maior desafio diante de um quadro como esse, é o de identificar primeiramente cada uma das relações entre uma definição e outra como vimos anteriormente, portanto agora que sabemos que uma ansiedade em determinado aspecto caracterológico e inconsciente, trata-se de um porquê pertencente aos quadros de angústias emergentes, o nosso segundo e grande desafio é tratar do ponto de vista analítico em como estabelecer um ponto de contato entre os tipos de neurose de angustia e os seus determinados tratamentos.

Primeiramente é importante considerar que, em uma neurose atual, numa das subdivisões freudiana da mesma, tratando-se de algo correspondente aos conflitos do ego com a sua própria realidade atual, direciona o clínico que se baseia na identificação do ou dos porquês que estão acossando o ego do paciente causando-lhe sofrimento à tarefa de levar este mesmo paciente a desenvolver o conceito de auto continência. Isso, claro, para estabelecer vínculos seguros entre a sua condição atual, com o equilíbrio psicológico através de uma leitura do seu estado inconsciente e das facetas envolvendo o seu Id, Ego e Superego. É preciso fazer com que, através do autoconhecimento, o sujeito descubra meios e mecanismos internos que equilibrem essas instâncias psíquicas, fortalecendo o seu ego mediante um registro de perigo real ou imaginário.

Em casos de uma neurose de angustia propriamente dita, é necessário que o analista, terapeuta psicanalista, psicólogo ou um médico psiquiatra, possa através dos métodos utilizados em um campo de Análise, identificar junto com os seus pacientes, qual seria a verdadeira motivação subconsciente e retrógrada, vinculada, atrelada ao seu estado mental. Seja um trauma de infância, uma memória revivida do setting, uma descrição de um sonho ou um forte apego emocional e incorporado ao sujeito, o trabalho é fazer com que essas antigas repressões tornam-se claras e até mesmo experienciadas novamente pelo método catártico numa sessão de análise. É preciso que o paciente/ analisando, saiba da importância da existência de complexos primitivos como a castração e no que eles podem interferir no agora, causando sintomas ansiosos de depressão e pânico, portanto, são necessários ser revividos e relembrados/ repensados.

Memórias, sentimentos, emoções

Segundo Zimerman, “também é frequente que o paciente portador de uma neurose de angústia tente convencer o analista para que o ajude a ‘esquecer’ os traumas do passado, já que, segundo ele, isso não vai contribuir em nada para o tratamento, porquê já pertence ao passado e não tem como o consertar”.

Nestes casos, é preciso fazer com que o paciente compreenda o quando, ainda que ele pense estar livre dessas memórias, sentimentos, emoções, ao mesmo tempo esteja tentando fugir exatamente deles. Portanto, a melhor maneira de conscientizar o sujeito dessas façanhas do seu estado inconsciente é despertá-lo afirmando que como BION dizia: “Não é possível esquecer aquilo que não conseguimos lembrar”. (1992)

Outra característica marcante para lidar com a ansiedade e com as angústias do paciente é oferta-lhe a competência e a habilidade de poder desenvolver uma capacidade só e poder lidar com os seus conflitos. Isso pode ser feito no processo de psicoterapia em que o analista propõe fortalecer o seu ego mediante tantos conflitos e cargas interiores dentro de si mesmo.

A nossa mente é um verdadeiro campo de batalhas, onde o tempo todo estamos subjugados a facetas do nosso estado de inconsciência e ao mesmo tempo pela forma com que cada um de nós, particularmente, encara a nossa própria realidade. Desenvolva o desejo de apreciação do conhecimento, as técnicas e manejos estratégicos de lidar com cada conflito e a partir daí, fortaleça o sujeito interno, dando a ele a capacidade de auto continência, resiliência e de adaptação.

E MAIS…

Estruturas psíquicas das psicoses

Uma informação de extrema relevância para o tratamento de pessoas portadoras de ansiedade é que, mesmo diante de uma definição que inclui a neurose as estruturas psíquicas das psicoses e perversões, todo o neurótico possui sua capacidade de manter integra, sua relação com o mundo externo e com o seu self, bem como é capaz de se adaptar em meio a tudo aquilo que o envolve num entrelaçado de conflitos atuais.

“Sempre existe em todo neurótico uma parte psicótica da personalidade.” (Bion – 1957)

REFERÊNCIAS
ZIMERMAN, David E. Manual de Técnicas Psicanalíticas – uma re-visão. Editora Artmed. Porto Alegre/ RS, 2008.
FREUD, Sigmund Schlomo.Inibições, sintomas e angústias – Obras Psicológicas Completas – Volume VI – Edição Standard. Imago Editora Ltda. Rio de Janeiro/ RJ, Primeira Edição: 1926.
DALGALARRONDO, Paulo. Psicopatologia e Semiologia dos Transtornos Mentais. Editora artmed. Porto Alegre/ RS, 2019.
ROUDINESCO e PLON, Elisabeth e Michel. Dicionário de Psicanálise. Editora ZAHAR. Rio de Janeiro/ RJ, 1998.