Esses dias rodou nos feeds de nossas redes sociais a propaganda de um curso de graduação em psicanálise, no modo EaD. A primeira coisa que chama a minha atenção é a urgência permanente de escrever sobre a formação do psicanalista. Parece paradoxal o termo “urgência permanente”, mas é exatamente disso que se trata. Como quando se trata de outros importantes assuntos de nossa sociedade, há que repetir incessantemente para que não esqueçamos.

A prática da psicanálise é algo que requer tempo, idas e vindas ao consultório do analista, interesse pela leitura das obras fundamentais – sempre Freud presente entre elas! –, busca de interlocução com os pares nas Escolas psicanalíticas e prática clínica. Esse tempo não é determinado nem linear, corre em espiral, transformando toda a vida daquele que a esse processo se submete. Assim, a formação do psicanalista não tem tempo determinado, estende-se permanentemente.

O princípio é outro

As Escolas e instituições psicanalíticas defendem o tripé formado por análise pessoal, formação teórica e supervisão. Esses componentes são fundamentais, mas não se resumem a itens em uma lista a se ticar. São meios de um processo de (de)formação do próprio sujeito que a ele se submete. Não basta elencá-los como parte integrante do curriculum. O princípio é outro.

Deve-se destacar que o curso de graduação mencionado anteriormente é oferecido à distância. O necessário isolamento social que se deu desde março de 2020 acelerou um processo e uma discussão que já ocorriam nas duas áreas que se cruzam na proposta desse curso: a educação e a psicanálise. É possível ensinar e aprender online? É possível fazer a própria análise ou atender online? Para as duas perguntas, a resposta é sim e não.

Sim, é possível: esses dois anos nos mostraram que conseguimos nos adaptar à realidade imposta pelo vírus que ameaçava e ainda ameaça a vida. E não, esse mesmo período nos mostrou como o encontro presencial, o intervalo povoado pelas conversas de corredor e o percurso ao destino do encontro constituem parte importante dos dois processos, o educacional e o analítico. Somos corpo e, como Freud percebeu desde o início de sua prática, o corpo tem um papel essencial em nossa existência.

Compromisso selado

A psicanálise é essencialmente um compromisso selado entra a dupla analista-analisante, trato este que conta com a trama transferencial, impossível de ser emoldurada em contratos comerciais rígidos. Isso também ocorre com o processo de formação teórica e a supervisão na prática clínica. Escutar é a base de nosso ofício – escutar, pontuar e interpretar. Para tanto, há que se estar presente.

Fazer-se presença de analista não é apenas estar logado, expor conteúdos ou sentar-se na poltrona. Fazer-se presente é comprometer-se com uma formação contínua, pois a garantia da função do analista está justamente na tensa certeza de que ela não existe, sendo construída a cada encontro com o paciente, a cada corte de sessão ou a cada interpretação feita.

E MAIS…

Posição ética

Não há diplomas nem boas notas que possam asseverar esse artesão. Sabemos que um sujeito tornou-se analista só anos depois, quando temos notícias das análises que conduziu e de seu compromisso com a transmissão da psicanálise. Não há diploma que viabilize tal percurso, é a posição ética que vai sustentar o ofício do psicanalista.