Heidegger escreveu que o tédio é “como névoa silenciosa que desliza para cá e para lá nos abismos da existência e nivela todas as coisas, numa estranha indiferença”. O tédio é um problema pode afligir qualquer pessoa, ou seja, é um fenômeno humano.
O tédio foi identificado como complicador no tratamento de transtornos mentais, como a esquizofrenia. Ele também está associado a outros quadros, como depressão e ansiedade e casos de somatização.
Associando a psicologia à filosofia, o filósofo alemão Theodor Lipps, propôs uma das primeiras definições psicodinâmicas de tédio: “O tédio é uma sensação de desprazer, surgindo de um conflito entre a necessidade de intensa atividade mental e falta de incitação a ele, ou incapacidade de ser incitado”.
Envolvimento mental
Psicanalistas enfatizam que o indivíduo entediado é incapaz de articular o que ele deseja fazer. Eles argumentaram que o tédio envolve o desejo de envolvimento mental e a inibição simultânea de tal envolvimento.
Essa experiência pressupõe uma sensação distorcida em que o tempo passa lentamente. O termo alemão para “tédio” é “langeweile”, que se traduz como “longo período de tempo”. Podemos dizer que o medo é orientado para o futuro; a tristeza, para o passado; mas o tédio é angústia do presente.
Famoso por ser terapeuta de Marilyn Monroe, o psiquiatra e psicanalista americano Ralph Greenson afirmou que o tédio está associado com “uma sensação distorcida de tempo em que o tempo parece permanecer ainda”. Ele observou que o tédio envolve uma tortura e uma dolorosa lentidão.
Sentimento de repulsa
Já o professor de história da Universidade de Calgary, no Canadá, Peter Toohey, autor de “Tédio: uma História Animada”, descreveu o tédio como um sentimento de repulsa a tudo e a todos, produzido temporariamente em circunstâncias previsíveis, mas inevitáveis.
O seu estudo mostra que o tédio é uma emoção universal experimentada pelos mais variados seres humanos ao longo da história, dos aborígenes australianos aos romanos.
Em 1986, os psicólogos Richard Farmer e Norman Sundberg, da Universidade de Oregon, nos Estados Unidos, criaram o Boredom Proneness Scale (BPS), um teste projetado como uma forma distinguir aqueles que sofrem de tédio como um estado transitório, dos que sofrem de tédio crónico.
Neurotransmissores
Segundo os psicólogos, algumas pessoas têm uma propensão metabólica para o tédio crónico, relacionada com desequilíbrios de neurotransmissores e riscos mais elevados de depressão, ansiedade, dependência ou distúrbios alimentares.
Ao longo dos séculos, o tédio desempenha um importante papel na cultura e provou ser um estímulo para a arte e a literatura. Ele teria uma função social na medida em que impele o ser humano a buscar novos caminhos e explorar o novo por meio da criatividade.
Os pesquisadores John D Eastwood, Mark James Fenske e Alexandra Frischen e Daniel Smilek por sua vez, definem o tédio como uma experiência adversa de querer, mas não conseguir exercer uma atividade gratificante.
Estado aversivo
Segundo eles, o tédio está relacionado a problemas de atenção. O tédio seria um “estado aversivo” que ocorre quando a pessoa não é capaz de orientar sua atenção para informações internas (pensamentos e sentimentos) e externas (estímulos do ambiente), necessárias para participar de atividades que lhe deem satisfação.
Nesse caso, a pessoa não é capaz de dar atenção e de participar de atividades que o satisfaçam e atribui a causa de seu estado aversivo ao ambiente que o cerca.
A experiência do tédio está ligada ao ritmo frenético da sociedade contemporânea. Em resposta a esse tempo acelerado, o sujeito “mata o próprio tempo”. O aprofundamento da solidão e a precariedade das relações afetivas resultam numa sensação de vazio e falta de sentido na vida.
Suicídio
O filósofo Lars Svendsen, em “Filosofia do Tédio”, lembra que o tédio produz graves consequências. O autor se debruça sobre o tédio existencial, um tipo de tédio profundo, desconhecido e angustiante, que se refere à perda de significado diante da vida.
Há, por exemplo, um risco aumentado de suicídio, uma vez que o tédio, associado à depressão, faz com que o indivíduo encare a morte como a única saída para a ausência de sentido na vida.
Exames de neuroimagem
Uma pesquisa da Universidade de Michigan, nos Estados Unidos, resolveu investigar o que acontecia no cérebro de voluntários entediados. Enquanto eram feitos exames de neuroimagem, os participantes recebiam a tarefa de identificar letras numa tela durante uma hora inteira.
Os pesquisadores observaram que, quando os participantes ficavam entediados, as áreas do cérebro ligadas à visão, linguagem e autocontrole se desconectavam umas das outras.
Tudo indica que as pessoas mais criativas sofram mais de tédio. Um estudo da Universidade Vanderbilt, nos Estados Unidos, mostrou que aqueles que buscam mais novidades possuem menos receptores de dopamina, um neurotransmissor do sistema de recompensa do cérebro, cuja ação influencia as nossas emoções, aprendizado, humor e atenção.
Ondas cerebrais
Ao analisar 54 voluntários, um estudo da Universidade Estadual de Washington, nos Estados Unidos, identificou quais as principais diferenças das reações cerebrais entre aqueles que eram mais inclinados a ficar entediados e os que não tinham essa sensação com frequência.
Os pesquisadores mediram as ondas cerebrais dos participantes com um capacete a partir de pontos no couro cabeludo. Eles foram colocados em frente a uma tela de computador em que eram exibidos pinos para que pudessem clicar neles.
No teste, aqueles participantes que responderam ao questionário dizendo serem mais inclinados a experimentar tédio apresentaram maior atividade cerebral frontal direita e ficaram mais entediadas ao longo do experimento.
Emoções negativas
A região frontal direita é aumentada por emoções negativas ou ansiosas. Nas pessoas que se preocuparam mais em pensar em outra coisa para diminuir o tédio, ou seja, mudar a situação entediante, o córtex esquerdo foi mais ativado.
Cientistas da York University, no Canadá, chegaram à conclusão de que a sensação está relacionada ao estado de atenção. Em outras palavras, a pessoa entediada não consegue prestar atenção ao que está acontecendo dentro dela (pensamentos ou sentimentos) ou fora dela (o que acontece ao nosso redor).
Morte precoce
Publicado no International Journal of Epidemiology, outro estudo relacionou o aumento do tédio ao risco de morrer mais cedo. Uma boa saída é recorrer aos exercícios físicos, que espantam o tédio e aumentam a longevidade.
Após analisar questionários respondidos por 7,5 mil funcionários públicos londrinos, pesquisadores da University College London, na Inglaterra, concluíram que o tédio pode levar a comportamentos de risco, como abuso de álcool, tabagismo e consumo de drogas.
Teoria da relatividade foi fruto de tédio
Há personalidades muito conhecidas que sofriam de tédio. É o caso de Einstein, que não se sentia desafiado na escola. Foi para espantar a monotonia que ele criou a teoria da relatividade. Isso mostra que o tédio também tem sua função, pois nos permite enveredar por novos caminhos e explorar territórios desconhecidos, estimulando nossa criatividade.