Aprender outro idioma, como o inglês, é uma habilidade cada vez mais valorizada no universo profissional, mas as vantagens vão além das questões gramaticais e de conseguir melhores oportunidades no mercado de trabalho. A cognição, as relações interpessoais, a tolerância com as diferenças, a motivação, a empatia, a capacidade de concentração e, especialmente, de se comunicar também são impactadas de maneira positiva.
Por meio do estudo de uma nova língua, diversos aspectos que antecedem a comunicação são exercitados. Entre eles, estão as habilidades socioemocionais. Trabalhar as questões socioemocionais é fator fundamental para a comunicação efetiva. Ajudar os estudantes a identificar, analisar, controlar e expressar emoções faz com que eles desenvolvam maior autoconsciência, motivação e compaixão pelos outros, além de uma maior habilidade de gerenciamento de estresse.
A empatia, elemento essencial para a comunicação, também não passa ilesa, pois os alunos, no contato com outro idioma, aprendem a ser mais flexíveis e mais tolerantes às diferenças. Outro benefício é a autoconfiança, pois o processo de aprender uma nova língua é desafiador, uma vez que requer coragem e, acima de tudo, comprometimento. Em outras palavras, aprender sobre qualquer assunto se torna complicado se o indivíduo não está disposto a sair de sua zona de conforto. Quando se trata de uma língua estrangeira, isso se intensifica.
Nesta entrevista, o tema é aprofundado pela professora de inglês Julia Wengrover, da Red Balloon de Porto Alegre/RS. Ela é formada em letras pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e atualmente estuda psicologia na Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre (UFCSPA).
Como trabalhar as questões socioemocionais no aprendizado de outro idioma?
No dia a dia, questões socioemocionais podem surgir organicamente durante as atividades regulares de sala de aula, tanto nos momentos de aprendizado de conteúdo quanto nos momentos de convivência. Como professores, podemos aproveitar essas situações de sala de aula para trabalhar os sentimentos, as relações com os colegas e professores, além de outras questões relacionadas ao mundo do aluno.
Nesses momentos, nós incentivamos que as crianças compartilhem sobre como estão se sentindo e trazemos vocabulário para ajudá-las a se expressarem de acordo com o nível e a idade de cada grupo. Podemos trazer, por exemplo, imagens de crianças tristes, felizes, assustadas etc. e ensinar esses adjetivos para uma turma de crianças pequenas. Com adolescentes, porém, podemos propor uma atividade em que eles escrevem um pequeno ensaio sobre como se sentiram em determinada situação. Dessa forma, desenvolvemos habilidades ligadas à linguagem, mas também às inteligências intra e interpessoais.
Além desses momentos ligados às situações cotidianas, também as histórias trabalhadas em aula contribuem para esse trabalho. Ao lerem e escutarem histórias, as crianças e os adolescentes são expostos a realidades diferentes das que vivem todos os dias. Assim, são incentivados a pensar sobre como agiriam naquelas situações, desenvolvimento de repertório de língua, mas também de habilidades de convivência, de respeito às diferenças e de autoconhecimento.
Qual a importância de começar a aprender outra língua desde cedo e como isso interfere no desenvolvimento pessoal do indivíduo?
Enquanto profissionais da área, sabemos que o aprendizado de uma língua adicional é mais do que só aprender palavras e frases. Adquirir uma língua nova é aprender a entender o mundo a partir de uma visão adicional: é o famoso “aprender a pensar em inglês”, do qual tanto se ouve falar. Como usuários de uma língua, nós não apenas traduzimos tudo o que vemos, de forma robótica, como se estivéssemos passando tudo por um dicionário na cabeça para então agir. Quando conversamos em inglês com naturalidade, é porque nós estamos entendendo a outra pessoa em inglês e respondendo sem precisar fazer uma ponte entre as duas línguas.
Por isso, sabemos que, quanto mais cedo se começa o aprendizado de outro idioma, mais se aproveita o fato de que, na infância, estamos naturalmente aprendendo a conhecer o mundo a partir dos recursos que temos disponíveis. A criança que é exposta a essa segunda língua desde pequena constrói o mundo dela tanto em inglês quanto em português, tornando o uso da língua adicional muito mais natural e intuitivo, algo com que os adultos relatam ter muita dificuldade.
Na prática, isso vale tanto para questões mais abstratas, como o funcionamento das estruturas de gramática (que vai sendo aprendida de forma leve e intuitiva), quanto para conhecimentos mais pragmáticos, como as matérias da escola, os dias da semana, os nomes dos animais e outros vocabulários. Assim, o aprendizado de outro idioma acompanha o desenvolvimento geral em vez de se tornar algo muito complexo e pesado para o que a pessoa precisará dedicar muito tempo e esforço no futuro.
De que modo outro idioma pode ser um benefício para o desenvolvimento das relações interpessoais?
Em primeiro lugar, de forma mais evidente, podemos citar como a convivência com colegas de outras escolas oportuniza que a criança adquira um círculo social maior e aprenda a conviver com pessoas de locais diferentes. Um exemplo interessante seria uma criança que é tímida na escola regular, mas que encontra no inglês a oportunidade de conversar com outros colegas da idade dela, pois nesse ambiente as turmas são menores e há pelo menos um interesse em comum: o próprio inglês.
Outra habilidade que tem sido cada vez mais valorizada é o equilíbrio entre autonomia e trabalho em equipe, que pode ser desenvolvido nesse ambiente. Os projetos realizados em pequenos grupos, com a orientação de professores que têm a possibilidade de atender os alunos de maneira mais próxima, proporcionam momentos de resolução de problemas, compartilhamento de ideias e a navegação de conflitos de modo saudável – sempre tendo o aprendizado da outra língua como objetivo e guia.
Dessa forma, é desenvolvido um repertório maior, com o qual vêm mais ferramentas para enfrentar os desafios da vida. Como comentei anteriormente, capacidade de se colocar no lugar de outros, a tão falada empatia, é aprendida por meio do contato com diferentes pontos de vista. Assim, um ambiente no qual há mobilização de conhecimentos sobre o mundo, sobre si e sobre os outros, se torna ideal para o desenvolvimento das relações interpessoais.