A psicóloga Shirley Simeão destaca a importância do desenvolvimento das habilidades sociais na adolescência como fator de proteção de problemas emocionais e comportamentais nesta fase da vida marcada por diversas transformações e pela definição da identidade, dos padrões de comportamento e de relacionamentos.

Com formação em terapia cognitivo-comportamental na infância e adolescência, Shirley tem doutorado em psicologia social pela Universidade Federal da Paraíba (UFPB) e pós-doutorado em psicologia pela Universidade Federal de São Carlos (UFSCar/SP).

É professora do Departamento de Psicologia da UFPB, universidade na qual coordena o Laboratório de Pesquisa em Cognição e Comportamento (LAPECC) e faz supervisão clínica e atendimentos na Clínica-Escola de Psicologia, em que desenvolve o grupo Interações, com foco no desenvolvimento de habilidades sociais na adolescência.

A importância do tema e a necessidade de ferramentas para trabalhar com pacientes juvenis na psicoterapia também a levaram a escrever livros sobre o tema. Entre os títulos que têm sua coautoria, estão ‘Solução de problemas interpessoais na adolescência – Avaliando possibilidades para a tomada de decisão’ e ‘Assertividade na adolescência – Expressando desagrado e recusando pedidos’?, ambos publicados pela Sinopsys Editora.

A capacidade de solucionar problemas interpessoais está entre as habilidades sociais consideradas mais fundamentais a serem desenvolvidas no cenário da adolescência, em razão de sua importância frente a uma diversidade de situações da vida e de sua relação com outras classes de habilidades, como assertividade, autocontrole emocional, civilidade e empatia.

Por sua vez, a assertividade – ou a habilidade social de recusar pedidos – é de fundamental importância face às situações de risco às quais estão expostos os adolescentes, como uso de drogas, envolvimento com pares desviantes, bullying e gravidez precoce.

Por que escolheu o trabalho com o universo juvenil?

Ao longo da prática profissional, sempre me interessei por conteúdos e intervenções que permeavam o universo juvenil, o que me levou a fazer uma formação em terapia cognitivo-comportamental na infância e adolescência. Dentre tantos conteúdos estudados, me deparei com a temática habilidades sociais, quando pude perceber a evidente importância na fase da adolescência, por ser este um período do desenvolvimento marcado por diversas transformações e pela definição da identidade, dos padrões de comportamento e de relacionamentos na vida.

O que são as habilidades sociais na adolescência?

Na adolescência, é requerida a ampliação do repertório de relações interpessoais de forma a atender às exigências próprias da fase, que exige do jovem um maior envolvimento em relacionamentos/situações de risco e novas habilidades para lidar com as demandas próprias da etapa, como iniciar ou encerrar um relacionamento afetivo ou mesmo as habilidades exigidas nas relações profissionais. Segundo Del Prette e Del Prette (2009), no contexto da adolescência, foram identificadas seis classes de habilidades sociais relevantes: autocontrole, civilidade, empatia, assertividade, abordagem afetiva e desenvoltura social.

Qual a importância de desenvolvê-las?

Quando desenvolvidas, as habilidades sociais podem auxiliar os adolescentes a apresentarem desempenhos socialmente competentes, além de provocar relações sociais satisfatórias. Entre as habilidades de destaque, encontra-se a assertividade como uma das estratégias que vêm se apresentando como importante fator de proteção de problemas emocionais e comportamentais, com reconhecida efetividade para o favorecimento do incremento de outras habilidades, bem como para o desenvolvimento socioemocional e prevenção de psicopatologias (Fleury & Murta, 2008).

No dia a dia, diante das demandas que chegam na clínica, as HS se configuraram como uma importante estratégia de intervenção a favor do desenvolvimento saudável e do manejo de alguns comportamentos desadaptativos evidenciados entre os adolescentes. Assim, o desenvolvimento de habilidades sociais se faz cada vez mais necessário, sendo uma das principais intervenções utilizadas na prática clínica com crianças e adolescentes, visando promover saúde e manejar as mais variadas dificuldades vivenciadas entre os jovens.

Quais são os principais problemas decorrentes dos déficits em habilidades sociais na juventude?

Os déficits em habilidades sociais na adolescência podem constituir um fator de risco para abuso de substâncias, ansiedade, depressão, dificuldades de relacionamento e insegurança. É cada vez mais evidente que um repertório deficitário de HS na adolescência pode estar relacionado a uma maior vulnerabilidade para dificuldades emocionais. Por outro lado, o desenvolvimento de habilidades sociais na adolescência é considerado como preditor de bem-estar psicológico, qualidade de vida e saúde mental.

Qual o papel da psicologia no sentido de contribuir para a saúde mental e a qualidade de vida na juventude?

Considerando o papel protetor das habilidades sociais na adolescência, na prática, comumente, o psicoterapeuta é solicitado a desenvolver estratégias para melhorar a comunicação, desenvolver a assertividade, desenvolver estratégias para resolução de problemas, autocontrole emocional e assim preparar o jovem para lidar com os desafios da fase. Dessa forma, as habilidades sociais se apresentam como um campo teórico e conceitual que muito tem contribuído com o desenvolvimento de intervenções efetivas no cenário da adolescência, no sentido de promover a melhoria de relações interpessoais e de comportamentos desadaptativos, contribuindo, consequentemente, para a promoção de saúde e bem-estar emocional a partir da superação dos déficits no repertório de habilidades sociais e do estabelecimento de um desempenho social satisfatório, com foco na competência social.

Como surgiu a ideia de escrever livros sobre o tema?

Considerando a relevância de um repertório de habilidades sociais satisfatório, foi surgindo a necessidade de pensar em recursos e materiais que pudessem respaldar as intervenções realizadas e servir de apoio para a aplicação de técnicas importantes para o desenvolvimento de HS. Dessa forma, surgiram alguns recursos e jogos, tais como os livros ‘Assertividade na adolescência’ e ‘Solução de problemas interpessoais na adolescência’, pensados de forma a facilitar a comunicação com os jovens e permitir a compreensão de elementos importantes presentes em suas interações sociais e que estariam relacionados a inúmeras dificuldades e comprometimento em diversas áreas da vida, com impacto no desempenho acadêmico, na vida familiar e social.

Fale sobre o programa Interações desenvolvido na UFPB.

Tendo em vista a relevância do desenvolvimento/melhoria do repertório de habilidades sociais na adolescência, o Interações vem sendo desenvolvido periodicamente desde 2016. Trata-se de um programa de intervenção realizado na Clínica-Escola de Psicologia da Universidade Federal da Paraíba, de forma gratuita, como um projeto de extensão direcionado à comunidade em geral, com o objetivo de favorecer o desenvolvimento das habilidades sociais na adolescência. Anualmente, o serviço é divulgado, por meio das principais redes sociais do grupo e nas escolas públicas e particulares da cidade de João Pessoa/PB. O programa ocorre ao longo de dez encontros que reúnem intervenções que foram desenvolvidas para a melhoria do repertório de HS por meio de atividades que proporcionam a aprendizagem de elementos importantes para a convivência, para a melhoria das relações estabelecidas e para lidar melhor com situações de risco e com os desafios próprios da fase vivenciada.