A morte de Maria Mendonça, cantora sertaneja de 26 anos, em um trágico acidente aéreo, suscita reflexões, do tipo: Como lidar com as perdas inesperadas de pessoas queridas? Como lidar com o sumiço imediato de pessoas que, em um piscar de olhos, sabemos que nunca mais veremos? Estamos preparados para isso? E o que vem a ser o luto coletivo? Porque as pessoas sofrem tanto com a morte de pessoas famosas, que nunca, em muitos casos, nem viram ou tiveram qualquer contato? Um luto coletivo. Uma perda que nos faz repensar a morte e repensar a vida. Uma dor aumentada por ter sido ceifada em seu auge.

Conexão estabelecida

Se sentir triste e chorar pela morte de uma celebridade é comum porque formamos ligações pessoais com a vida daquela pessoa. Nos conectamos com famosos e, apesar de não os conhecermos pessoalmente, a presença deles pode ser sentida em nossas vidas. Por exemplo: talvez a pessoa tenha feito parte de uma fase importante da infância dessa pessoa. Talvez representasse algum ideal, algo que você desejasse também ser. Ou talvez a celebridade signifique uma memória importante em sua vida, como, por exemplo associar a presença dela com uma música ou cena que você cresceu assistindo ou assistiu em momentos especiais da sua vida. Nesses casos, a morte pode representar uma perda daquele momento particular da sua própria vida.

Além de tudo isso, um famoso pode ser não só uma conexão com o seu passado, mas uma parte alegre do seu dia-dia. Quando uma celebridade que gostamos morre, o sentimento pode ser como o da perda de alguém próximo, pois ela foi parte integral de nossos momentos felizes ou tristes. Elas nos proporcionam boas risadas, nos fazem chorar, mas o mais importante, nos ajudam a esquecer momentos difíceis da nossa realidade quando mais precisamos. E não importa que você não conheça a celebridade pessoalmente. Se você sente a morte dela, se dê o direito de sentir a perda. A grande verdade é que, quanto mais você sente, mais você aprende e cresce, independente da dor. Por isso, você pode aproveitar o sentimento de luto da perda de uma pessoa famosa para se preparar para outros lutos que você terá, naturalmente, em sua vida. A consciência da morte de alguém querido é saudável e uma ótima oportunidade para rever e mudar sua vida, encontrando formas de melhorar no que for preciso.

Maior intensidade

Esse luto coletivo trás sentimentos como fragilidade, ansiedade, frustração, angústia, desamparo e revolta e coloca o tema em discussão fazendo-nos pensar em nossa própria finitude, o quanto a vida é frágil e que poderia ser com qualquer um de nós. E essa imprevisibilidade da vida traz à tona diversos sentimentos, convida-nos a refletir sobre a nossa própria vida e escolhas que fazemos ao longo dos dias, relembrando que a morte é uma realidade que chegará a todos nós. Também é importante salientar que uma nova morte pode fazer a ferida voltar a doer com maior intensidade. Por isso, acolher seus sentimentos faz toda a diferença, pois cada um sofre à sua maneira e de acordo com o seu contexto.

Dores intensas que demonstram as fragilidades, vulnerabilidades do ser humano ao se ver frente a um processo de finitude. A verdade é que não estamos nunca preparados. No entanto, a grande questão está relacionada a como devemos passar pelo processo de elaboração do luto, seja ele coletivo ou não. Apesar da dor, a consciência da morte de alguém querido é saudável e uma ótima oportunidade para rever e mudar sua vida, encontrando formas de melhorar no que for preciso a cada dia.

Despedidas não são fáceis

Dizer que a vida é um sopro, acaba sendo uma redundância. Despedidas não são fáceis. Estamos a todo momento ouvindo que podemos partir a qualquer tempo.  Ouvimos e muito essa frase, principalmente nos últimos dias com a descoberta da morte trágica e inesperada, tão precoce de Marilia Mendonça. Muito jovem, no auge de uma carreira brilhante de muito sucesso. É claro que, sabemos todos que não há uma morte anunciada. Todo dia pode ser nosso último dia nessa trajetória chamada vida. E, infelizmente, essa consciência só se faz realmente presente quando vemos a morte se aproximar de alguém que conhecemos, seja famoso ou não. A grande verdade é que estamos sempre envolvidos na pressa de viver. Na urgência efêmera da vida que nos agita e nos leva a extremos de sensações e sentimentos. E este é, talvez, o principal motivo pelo qual evitamos pensar na morte. E tudo bem por isso. A grande realidade é que não queremos nos certificar do quanto nossa estadia neste mundo é limitada e que não temos o controle de nada. Pois bem, ninguém está no controle de nada. A angústia, o medo e a insegurança do ser humano estão alicerçados exatamente na condição de não conseguir controlar o que irá acontecer no minuto seguinte. Quando as questões fogem das nossas mãos nos sentimos vazios, frágeis e perdidos.  

Porém, a empatia deve estar presente em todo o processo de elaboração do luto, uma vez que o mais importante é não haver julgamentos, afinal cada um irá reagir e viver seu momento da forma como aprendeu, da forma como consegue e da maneira como processa e compreende suas perdas. Cada um entende dentro de si como irá vivenciar a dor do luto. A morte, por mais presente que esteja, precisa ser lembrada para que possamos aprender a valorizar a própria vida. Não dá para ficar pensando nisso a todo momento, não é preciso viver sob a atmosfera do medo. Mas é importante viver a cada dia tentando fazer o seu melhor e ser melhor para você e para o outro. Visto que, somos seres humanos e imperfeitos e saber lidar com nossas imperfeições, certamente, é o nosso maior aprendizado. Pois, nada é para sempre. Celebrar e honrar a vida é a forma mais genuína de reconhecer nossas potencialidades.

Equilíbrio emocional

Dentro de um luto coletivo, onde multidões lamentam a mesma partida e se amparam na mesma dor, surgem várias questões que consternam as pessoas e nos fazem refletir sobre a necessidade de viver um dia de cada vez, valorizar as pequenas coisas da vida, se aproximar de quem amamos, dizer que amamos, verbalizar o que se sentimos e o que o outro representa para nós. Não fechar os olhos para a dor e expressar o sentimento, pode aliviar e ajudar a elaborar as emoções e os sentimentos que estão sendo evidenciados.  É muito válido para nosso equilíbrio emocional, não deixar para depois. Praticar a empatia, o autocuidado e a gratidão por estarmos vivos.

Perdas súbitas e inesperadas podem nos levar, naturalmente, a desconfortos físicos e emocionais. Tristeza profunda, dores no peito, sensações de afogamento e até a momentos de depressão profunda; reações dolorosas que podem surgir e se perpetuar quando não exploradas todas as etapas do luto.

Portanto, é importante desenvolver o autoconhecimento, reconhecer suas forças, fraquezas, elevar sua autoestima e compreender o quão importante você é para si e para muitos. Isso ajuda a minimizar a dor da perda e a criar mais empatia. Afinal, episódios como esses mostram o quanto a morte pode ridicularizar as nossas urgências, revelando nossas fragilidades e nos fazer concluir que precisamos amar mais e viver um dia de cada vez. Além de dar a importância devida aos pequenos detalhes, gerando leveza e paz através do cultivo de bons hábitos que favoreçam o equilíbrio da saúde física e mental.

E MAIS …

A indignação e a culpa velada no inconsciente

Estudos demonstram que os estágios precisam ser vividos para que a aceitação, última etapa do luto, venha coroar a necessidade real de seguir a vida. De continuar trilhando seu caminho, mesmo com a memória do outro que se foi. É preciso desta maneira, compreender a morte como um remédio amargo, do qual estamos todos sujeitos a tomar um dia. É inevitável. Apesar de estarmos sempre em busca de respostas, as interrupções da vida são carregadas por angústias, questionamentos e uma mistura insana de emoções.

Nestes momentos, lembramos dos beijos que não demos. Dos abraços que ficaram escondidos. Dos afetos que nunca chegamos a retribuir ou expressar. Vem a indignação e a culpa velada no inconsciente. Pois, sempre acreditamos que ainda teremos tempo de aparar arestas, de aproveitar mais, ou mesmo de viver aquilo que postergamos. Estamos sempre sofrendo por antecipação. Aliás, o ser humano vive a dor do futuro e esquece do momento presente. No entanto, uma lição que deve ser aprendida com a importância de se vivenciar o luto é que, nenhuma morte será capaz de apagar a memória de quem vive em nós, mesmo que a interrupção seja abrupta e precoce.