O apego a uma forma ultrapassada de capitalismo, centrada unicamente no lucro do acionista, impede que avanços importantes aconteçam. São necessários fatos externos e novos, além do bom senso (que deveria bastar), para provar e mostrar que esses passos precisem ser dados.
Muito poder concentrado
Um desses fatos aconteceu no dia 18 de janeiro e veio na forma de uma carta. Larry Fink, CEO da BlackRock, (a maior gestora de ativos no mundo, com um fundo de 10 trilhões de dólares para gerir e investir nas empresas que escolher), como faz todo ano, há mais de 10 anos, fez publicar no site da empresa a sua mensagem de 2022 aos CEOs das empresas que gere.
Você faz ideia da importância dessa carta, de Larry Fink e da BlackRock? É muito poder concentrado. Se fosse um país, a BlackRock seria o terceiro maior PIB do mundo, atrás apenas de Estados Unidos e China.
Criticado por alguns e admirados por muitos, todo início de ano, nessa mensagem em forma de ritual, que vai além dos CEOs das empresas que recebem investimentos da BlackRock, Fink faz afirmações afinadas, aponta a direção de uma nova era e mostra que ela já chegou, assim como uma nova economia e um novo capitalismo, o capitalismo de stakeholders.
A carta
Perceba a força das palavras e da direção em que ele destaca nesses trechos:
“O capitalismo de stakeholders não é sobre política. Não é uma agenda social ou ideológica. É o capitalismo, impulsionado por relacionamentos mutuamente benéficos entre você e os funcionários, clientes, fornecedores e comunidades em que sua empresa depende para prosperar. Este é o poder do capitalismo.”
“No mundo globalmente interconectado de hoje, uma empresa deve criar valor e ser valorizada por toda a sua gama de partes interessadas, a fim de fornecer valor de longo prazo para seus acionistas. É por meio do capitalismo de partes interessadas eficaz que o capital é alocado de forma eficiente, as empresas alcançam lucratividade durável e o valor é criado e sustentado no longo prazo.”
“Nunca foi tão essencial para os CEOs ter uma voz consistente, um propósito claro, uma estratégia coerente e uma visão de longo prazo. O propósito da sua empresa é sua estrela norte nesse ambiente tumultuado.”
Novo mundo do trabalho
E ele vai mais longe, pela primeira vez ele se permite invadir o campo das Pessoas, Gestão e Cultura denunciando o que será o novo mundo do trabalho e anunciando: ou sua empresa se ajusta e se redesenha, ou terá vários problemas e riscos de sobreviver no futuro. As pessoas estão exigindo mais das empresas, tornando o cenário de talentos mais competitivo. A busca por profissionais experientes e referências será decisivo nos próximos anos.
“À medida que as empresas se reconstroem, saindo da pandemia, os CEOs enfrentam um paradigma profundamente diferente do que estamos acostumados. As empresas esperavam que os trabalhadores viessem ao escritório cinco dias por semana. A saúde mental raramente era discutida no local de trabalho. E os salários daqueles de baixa e média renda mal cresciam. Esse mundo se foi“, afirma ele.
Sim, isso virou coisa do passado, assim como muitos outros pontos, e nem tente ir na linha de acreditar que isso é uma moda e logo vai passar. Estamos diante de uma nova era, uma nova economia, novas relações com mercado, novas relações sociais, talvez uma nova sociedade e novos humanos.
O futuro chegou.
Para ser bem sincero, à medida que eu lia a carta dois sentimentos brotaram: um primeiro de repetição e de dejavu e um segundo, de alegria, que Larry Fink pode dizer com todas as letras que o futuro chegou.
Vale lembrar que na carta de 2018, Fink já trazia a pauta de sustentabilidade – ESG. As medidas que precisam ser tomadas para a questão ambiental, que sempre parecem vir com enorme lentidão, também ganham impulso com esse destaque dado por Fink em sua mensagem. Coincidência ou não, no mesmo dia em que a carta foi publicada, a Exxon prometeu reduzir para zero suas emissões líquidas de carbono até 2050. Está nas mãos das empresas as medidas mais efetivas para que a ideia de sustentabilidade passe a ser corrente.
Recursos humanos
E para nós, profissionais de RH, Fink desenha o conceito de Recursos Humanos Estratégico. Você ainda tem alguma dúvida?
“Colocar o propósito da sua empresa na base de seus relacionamentos com seus stakeholders é fundamental para o sucesso a longo prazo. Os funcionários precisam entender e se conectar com o seu propósito; e quando o fizerem, eles podem ser seus defensores mais leais. Os clientes querem ver e ouvir o que você representa à medida que procuram cada vez mais fazer negócios com empresas que compartilham seus valores. E os acionistas precisam entender o princípio orientador que orienta sua visão e missão. Eles estarão mais propensos a apoiá-lo em momentos difíceis se tiverem uma compreensão clara de sua estratégia e do que está por trás dela.”
Imperdível, importante e atrasada essa constatação. Não tenho dúvida de como é fundamental a questão estratégica da área de Pessoas, Gestão e Cultura. Torço muito para que a gente pare com as crises de identidade e possamos assumir o papel que temos em essência.
É importante entender essa evolução
Há movimentos acontecendo, há muito tempo, e agora vemos a conexão e integração deles na voz de alguém de destaque, que vem com o peso de 10 trilhões de dólares.
É uma pena que precisamos de alguém para dar voz e referendar essas posições, mas que bom que esse movimento tem voz. É importante entender que a evolução e implementação de todos esses conceitos é aquilo de que precisamos com urgência. Nessa caminhada, toda ajuda é necessária.
“Na mudança do presente a gente molda o futuro”, disse Gabriel, o Pensador.