Vivemos em uma sociedade que, ao longo dos anos, foi demonstrando o alto nível de preconceito e resistência ao perpetuar a padronização dos corpos de maneira binária: masculinos e femininos. No entanto, sabemos que esta é uma maneira de simplicar a forma como somos. Entre a pluralidade de possibilidades, temos as pessoas intersexo. São aquelas que apresentam características variadas na anatomia sexual ou reprodutiva, no genótipo, ou seja, componentes biológicos que geram a noção de identidades masculinas ou femininas. O hermafroditismo é um exemplo.

Identidade de gênero

Você já se perguntou sobre sua orientação sexual e identidade de gênero? Se reconhece nelas como indivíduo e ser social? Já parou para pensar na pluralidade de meios de declararmos a nossa identidade em um mundo que não é apenas binário? É cada vez maior o número de possibilidades para representar as identidades de gênero na atualidade. Dentro desse universo diverso de escolhas, os indivíduos podem se autodeterminar CIS ou trans, por exemplo, independente da natureza biológica feminina ou masculina de seu corpo ou de sua transição. Ao longo dos séculos, hábitos, costumes e rótulos foram criados para nos encaixar nos sistemas sociais que, por diferentes interesses e ideologias, excluíram grupos de minoria.

Autoconhecimento é a chave para a busca da autodeterminação de gênero, quando o sujeito sente dúvidas. A busca por ajuda especializada em Psicologia ou Psicanálise é importante, pois percebemos que há muita desinformação e, consequentemente, uma enorme confusão conceitual, que gera ainda mais preconceito e afastamentos entre grupos simpatizantes e não simpatizantes do movimento LGBTQIA+. Todos os indivíduos podem escolher como gostariam de se autoidentificar. Gênero biológico é diferente de identidade de gênero. Todo esse contexto complexo pode dificultar ainda mais o autorreconhecimento e a autoaceitação. O  primeiro passo contra o preconceito é perceber como somos diferentes e aceitar isso. Só depois desse processo interno e individual é que podemos nos engajar em  movimentos sociais na luta contra a homofobia e a rejeição dos grupos de minoria

Luta internacional

O mês de junho é marcado pela rebelião de Stonewall de 1969, um momento histórico que inspirou o orgulho LGBTQIA+. O movimento não é uma luta exclusiva de gays, lésbicas, bissexuais, transgêneros, queers+, mas sim de todos nós. “É importante não tratar os nossos corpos apenas como uma visão médica, mas também como uma visão de subjetividade do ser humano”, ensina o Dr. Shay Bittencourt, vice-presidente da Associação Brasileira Intersexo (ABRAI). O movimento não é exclusivo de gays, lésbicas, bissexuais, transgêneros, queers+, mas sim uma batalha de todos nós.

Há quem diga que a sigla, originalmente LGBT, deveria ser LGBTI para incluir também os intersexos. Os influenciadores do canal das Bee, no YouTube, explicam as diferenças entre sexualidade, transexualidade e intersexualidade.

Preconceito ideológico

Sexualidade tem a ver com quem a gente se relaciona, se envolve afetivamente ou sexualmente. Transexualidade tem a ver com quem a gente se identifica, intersexualidade diz respeito ao nosso sexo biológico.

Palavras como homossexualidade e, particularmente, homossexualismo são carregadas de preconceito, pois remetem-se ao vocabulário científico-moral dos séculos XVIII e XIX que deu origem à ideia do ser homossexual. Na verdade, se pesquisarmos a história ocidental, o preconceito sexual parece ser um produto da ideologia evolucionista posta a serviço da sociedade burguesa do século XIX. “No caso da homossexualidade, a confusão entre papel de gênero e orientação sexual é grande: estereótipos frequentemente mostram os homossexuais como indivíduos que se sentem desconfortáveis com suas identidades de gênero, querendo modificar seu sexo biológico”.

Esclarecimento conceituais

Em primeiro lugar, comportamento sexual (isto é, ter práticas eróticas ou afetivas homossexuais) não é o mesmo que identidade sexual (definir-se como homossexual).  Segundo o livro “Homossexualidade: do preconceito aos padrões de consumo” de autoria da psicóloga Adriana Nunan, o termo homossexual refere-se a homens e mulheres cuja orientação sexual e afetiva principal é para com pessoas de seu mesmo sexo biológico. “Segundo Mott (2000c), a palavra homossexualidade propriamente dita só teria sido criada em 1869, pelo jornalista e advogado húngaro Karol Maria Kertbeny. Para proteger sua pessoa e conferir maior respeitabilidade à defesa dos homossexuais, Kertbeny teria usado o pseudônimo de Dr. Benkert, embora nunca tivesse sido médico”.

A psicóloga faz na obra, uma distinção entre os diversos componentes (socialmente construídos) pelos quais classificamos a sexualidade humana: sexo biológico (ser macho, fêmea ou intersexual anátomo-fisiologicamente 1), orientação sexual (atração por pessoas do sexo oposto ou do mesmo sexo biológico, isto é, ser heterossexual, bissexual ou homossexual), identidade de gênero (ser mulher ou homem) e papel de gênero (comportar-se de forma feminina, masculina ou andrógina). Outros autores de obras sobre esse assunto, apontam ainda para o papel sexual, ou seja, o modo através do qual o indivíduo se insere na relação sexual (por exemplo, de forma ativa ou passiva).

E MAIS…

Processo de autorreconhecimento é um desafio múltiplo

Entender os nossos sentimentos e definir como vamos nos expressar para o mundo requer, em muitos casos, ajuda de psicoterapeutas especializados em sexualidade e que possam facilitar o processo de autorreconhecimento dos pacientes de forma acolhedora e sem julgamentos. Dentro de um contexto histórico, houve épocas onde grupos de minoria eram vítimas de “doença psíquica” ou “um mal social”. Infelizmente, estamos muito distantes de um ambiente menos preconceituoso e tóxico onde, em pleno século XXI, ainda existem profissionais que prometem a “cura gay”.

Apoiar as pessoas que não conseguem assumir como percebem a sua natureza diversa é um desafio para todos os psicoterapeutas, amigos e familiares. A liberdade de expressão é um direito de todos e uma garantia constitucional. Ajudar as pessoas a entenderem o seu corpo e como se sentem nele é um ato de amor ao próximo. Muitas pessoas se escondem e vivem uma vida infeliz porque não conseguiram apoio para uma mudança. Decisões sobre intervenções cirúrgicas, mudanças de nome e conversa com a família sobre identidade de gênero, por exemplo, devem sempre contar com apoio psicológico para serem bem-sucedidas.