Um dos primeiros a estudar os hábitos de acasalamento dos animais, Charles Darwin descreveu a “evasão das fêmeas”, isto é, a presunção de que as mulheres são mais monogâmicas e menos motivadas sexualmente do que os homens. Na verdade, hoje o que se sabe é que, com essa ideia, o estudioso estava refletindo os costumes vitorianos de sua época.

No entanto, a tese de Darwin foi resgatada pelo antropólogo americano Donald Symons, em seu “The Evolution of Human Sexuality”, no qual ele afirma que é natural que os homens procurem múltiplas parceiras sexuais, enquanto as mulheres são motivadas a se estabelecer com um único “bom provedor”.

Estudo da sexualidade humana

Acusado de determinismo genético, Symons é conhecido como um dos fundadores da Psicologia Evolutiva e como pioneiro no estudo da sexualidade humana a partir de uma perspectiva evolutiva. Mas é também verdade que sua obra foi alvo de muitas críticas no meio científico.

Segundo a abordagem científica, nosso comportamento sexual seria guiado por certos mecanismos biológicos envolvidos no desejo sexual, e eles estariam programados para trabalhar a favor da manutenção da espécie. É estranho falar dessa maneira, porque somos mais do que aves ou chimpanzés, mas essa teoria ainda é explorada por muita gente.

Na contramão, há estudos recentes que endossam as bases biológicas para a infidelidade feminina. Neste sentido, a traição seria resultado de uma programação genética e biológica. O epidemiologista britânico Tim Spector, pesquisador da universidade King’s College London, no Reino Unido, concluiu que as algumas mulheres estariam programadas geneticamente para serem infiéis.

Entre irmãos

Ao acompanhar o desenvolvimento de duplas de irmãs gêmeas, Spector constatou que se uma delas tivesse se mostrado infiel, a probabilidade de a irmã também apresentar esse tipo de comportamento era de 55%. O pesquisador diz ter observado que as chances de que os dois irmãos sejam ou não infiéis é bem maior quando eles são univitelinos.

Nesse caso, haveria uma influência genética para a infidelidade, mas os fatores ambientais também pesam. “São várias combinações genéticas que induzem a pessoa, além é claro, dos fatores ambientais e de relacionamento“, diz o pesquisador.

Autor de “The Naked Ape” (ou o “Macaco Nu”), o historiador Desmond Morris, zoólogo e especialista em sociobiologia humana, acredita que a monogamia nos seres humanos foi uma evolução, sobretudo social. Os homens caçadores foram levados a criar vínculos para garantir os direitos reprodutivos dentro de cada tribo.

Sobrevivência do ser humano

Quando o ser humano passou a caminhar com dois pés, seus filhos se tornaram mais frágeis e dependentes dos pais por um longo período. Assim, a atração sexual e o romance amoroso tornaram-se fundamentais para a sobrevivência do ser humano.

“Foi nesse período que os machos começaram a caçar em grupo e as fêmeas passaram, também em grupo, a construir casas, coletar frutos e cuidar dos filhos. Elas dirigiam a vida social e os homens traziam os alimentos. Após milhões de anos, essa divisão de trabalho fez com que nossos antepassados começassem a ter um comportamento sexual diferente dos outros primatas”, explica.

O orgasmo seria uma dessas mudanças. Outro aspecto é que os seres humanos passaram a se envolver emocionalmente com seus parceiros, de modo que o ato sexual deixou de ser algo puramente instintivo.  

A verdade é que a presença da monogamia continua a intrigar os biólogos evolucionistas. Existem diversas teorias que explicam o surgimento da monogamia e o cuidado paterno nos primatas. O motivo é que esse cuidado é fundamental na criação da prole.

Segundo a antropóloga norte-americana Sarah Blaffer Hrdy, que fez importantes contribuições para a sociobiologia, mulheres tendem a ser mais cautelosas no estabelecimento de relações sexuais do que os homens são. “Frequentemente, presume-se que esses padrões refletem diferenças essenciais entre os sexos. No entanto, a mesma dicotomia entre machos ‘ardentes’ e fêmeas ‘tímidas’ não é encontrada em outros primatas”, explica.

Segundo ela, que estudou uma espécie de macacos chamada langur, o acasalamento com vários machos é uma estratégia de reprodução vantajosa para as fêmeas. Ao acasalar-se com o maior número possível de machos fora do grupo, as fêmeas langures garantem sua prole contra o infanticídio, caso um desses machos assuma o controle do grupo posteriormente. “O conflito é básico para todas as criaturas que se reproduzem sexualmente, porque os genótipos e, portanto, os interesses próprios dos cônjuges não são necessariamente idênticos. Infanticídio entre langures ilustra uma forma extrema deste conflito”, escreveu Hrdy.

O mamífero monogâmico

Segundo os zoólogos britânicos Dieter Lukas e Tim Clutton-Brock, estudiosos da ecologia comportamental, em artigo “The Evolution of Social Monogamy in Mammals”, publicado na revista “Science”, as primeiras fêmeas de mamíferos não eram sociáveis e não se relacionavam bem com outras da espécie, por isso viviam bem longe umas das outras. Dessa forma, o macho precisava correr de um lado para o outro para ter várias parceiras. O mamífero monogâmico ancestral encontrou na fidelidade a forma mais segura de garantir o acasalamento, para não ficar sem nenhuma fêmea.

Das 2.543 espécies de mamíferos cujos sistemas sociais puderam ser classificados, as fêmeas eram classificadas como solitárias em 1740 espécies (68%), como socialmente monogâmicas em 226 espécies (9%), convivendo em grupos instáveis ​​em 133 espécies (5%) e vivendo em grupos estáveis ​​em mais 444 espécies (17%).

“A proporção de espécies socialmente monogâmicas em nossa amostra é ligeiramente maior do que as estimativas anteriores frequentemente relatadas, na ordem de 3%, mas ainda é uma ordem de magnitude menor do que em pássaros, em que 90% das espécies são consideradas socialmente monogâmicas”, dizem os pesquisadores. 

Biologia e cultura

A monogamia ocorre com mais frequência em algumas ordens de mamíferos, como primatas e carnívoros. No caso dos nossos ancestrais, mudanças biológicas e culturais teriam levado à monogamia, que nos levou a ponderar perdas e os ganhos. Embora a reprodução sexual com diversos parceiros permita a diversidade genética, essa não é regra em alguns mamíferos, portanto, a monogamia parece ser uma forma de manutenção da espécie.  

Segundo estudos de Lukas e Clutton-Brock, a monogamia surge nos mamíferos quando as fêmeas ocupam espaços discretos que não se sobrepõem aos espaços das outras fêmeas; dessa maneira, os machos não podem monopolizar mais de uma fêmea. O risco de infanticídio surge como um aspecto importante, que é minimizado quando há monogamia social e o cuidado paterno.

E MAIS…

Seleção diferente

As mulheres procuram um parceiro de longa duração, pois precisam de colaboração ao longo de nove meses de gestação, além do tempo para amamentação e para os cuidados com os bebês, que são muito imaturos e dependentes ao nascer. Por isso, a seleção é de essencial para elas. Já a estratégia dos homens é produzir maior número de filhos possível.