Os cuidados paliativos são os cuidados de saúde ativos e integrais prestados por equipe multidisciplinar às pessoas com doenças graves, progressivas e que ameaçam a continuidade de suas vidas. Têm como objetivo promover a qualidade de vida do paciente e de seus familiares por meio de prevenção e alívio do sofrimento, da identificação precoce de situações possíveis de serem tratadas, da avaliação cuidadosa e minuciosa e do tratamento da dor e de outros sintomas físicos, sociais, psicológicos e espirituais.

Diante do diagnóstico de uma doença grave e incurável, a missão conferida aos profissionais da saúde, entre eles o psicólogo hospitalar, é oferecer amparo fundamentado na ética da atenção e do cuidado autenticamente interessado em quem se cuida. Nesse contexto, a intervenção leva em consideração uma tripla dimensão: os pacientes, seus familiares e os próprios profissionais de saúde.

“A morte precisa ser trabalhada e elaborada, e uma das formas disso acontecer é trazendo-a para o campo do real, das palavras, que é um campo palpável, auxiliando assim todos os envolvidos a trabalharem melhor essa questão dentro de si, ressignificando a finitude da vida”, afirma a psicóloga clínica e hospitalar Niliane Brito, que aprofunda o tema nesta entrevista.

Psicanalista, Niliane é especialista em relacionamentos, ansiedade e depressão. Também é idealizadora do Projeto Amour, que existe desde 2019 direcionado aos relacionamentos e seus conflitos. Palestrante e engajada nas redes sociais, busca levar conhecimento às pessoas sobre a importância da terapia.

Por que se tornou psicóloga e o que a levou para a psicologia hospitalar?

Tornei-me psicóloga devido a minhas próprias questões e demandas, ao querer olhá-las de forma mais delicada e por sempre me debruçar na psicanálise. Faço análise há mais de 20 anos e me senti querendo adentrar mais o campo da existência humana e amo isso: conhecer e desconhecer as pessoas, o sujeito (subjetivo de cada uma). A psicologia hospitalar entrou em minha vida quando, em muitos casos, eu recorria ao hospital como um local no qual eu tinha um certo conforto em estar presente (como doente). Então utilizei, a partir da minha análise, instrumentos e estratégias para que eu estivesse ocupando esse lugar de um outro viés, uma nova posição de sujeito em minha vida, como profissional e pessoal.

Explique o que são cuidados paliativos.

Quando penso em cuidados paliativos, penso nas palavras proteção, conforto, respeito à dignidade, não só do paciente, mas de todos os envolvidos no adoecimento do mesmo. Dessa forma e com base também nesse tipo de assistência, deve-se levar em conta a qualidade de vida do paciente, seus familiares e seus cuidadores em geral. O atendimento por cuidados paliativos não apenas abrange toda a assistência citada acima, como também suporte físico, acompanhamento psicológico e emocional de que o paciente necessita nesse momento crítico de sua vida. A morte precisa ser trabalhada e elaborada e uma das formas disso acontecer é trazendo-a para o campo do real, o campo das palavras, o qual é um campo palpável, auxiliando assim todos os envolvidos a trabalharem melhor essa questão dentro de si, ressignificando a finitude da vida.

Como se encontra o emocional de um paciente em fim de vida e o de seus familiares?

O paciente, quando está em processo de adoecimento, se apresenta em uma nova posição em sua estrutura familiar, na maioria das vezes, até de ordem dependente, como no caso de quem necessita dos cuidados paliativos. E isso gera muita angústia, ansiedade e, em alguns casos, transtornos como depressão, não somente nos pacientes, mas em seus familiares, que precisam reajustar toda essa dinâmica. Portanto é preciso que a equipe de saúde esteja preparada para trabalhar da forma mais humanizada possível com esse sujeito que se apresenta, seja ele paciente, familiar, cuidador. É imprescindível o elo entre equipe e essa nova dinâmica familiar.

Qual a importância do engajamento e do suporte à família do paciente nesse momento?

A família também precisa de cuidados. Ela precisa ser escutada, acolhida, ser notada no adoecimento desse paciente. Ela faz parte desse cenário, está em cena também e, com isso, precisa de suporte para que possa dar o apoio, os recursos necessários, para esse paciente que está em uma situação/condição crítica e totalmente fora do seu habitual. É preciso entender essa dinâmica familiar, essa estrutura, para que se possa entender não só o funcionamento do paciente nessa família, mas o lugar de cada um e sua importância.

E qual a importância do suporte psicológico também aos profissionais de saúde que atuam diariamente atendendo pessoas em fim de vida?

O psicólogo tem a função de estar também com o olhar voltado para essa equipe, percebendo suas necessidades emocionais, acolhendo-a para que, dessa forma, a confiança e o vínculo entre esses profissionais da saúde e os envolvidos no adoecimento se estabeleça da melhor forma. É importante também o investimento em conscientização por toda a equipe médica, que tanto tem como propósito a luta pela vida, para ter um olhar mais íntimo para com a morte e saber que estar diante dela e falar sobre ela não dizem respeito à desistência ou ao fracasso, muito pelo contrário.

Fale um pouco sobre como está o campo de trabalho na área da psicologia hospitalar atualmente.

O campo da psicologia hospitalar vem sendo muito direcionado para a ordem de gestão. O psicólogo hospitalar vem sendo colocado em um lugar que muitas vezes não lhe cabe, como algo administrativo (apenas). Espero que isso mude com o passar dos anos e percebam não só a importância do lugar dos profissionais dessa linha de atuação, como os benefícios que pacientes, familiares e profissionais da saúde têm com seu trabalho.