Os gregos dispunham de duas palavras para nomear suas apreensões: deos, que se referia a um temor refletido e controlado; e phobos, que representava o medo intenso e irracional, acompanhado de fuga. Quando algo nos ameaça, é esperado sentirmos medo, sentimento este que provoca em nós comportamentos de luta ou fuga, além de ativar o nosso sistema nervoso autônomo de modo a garantir o dispêndio súbito de energia que se segue. Nossos medos normais podem ser comparados a um sistema imunológico de detecção de perigos, funcionando como uma proteção instintiva em relação a eventuais situações que nos exponha a riscos. Enquanto isso, o medo exagerado de algo, o pânico, o terror, o susto são reações extremas de medo podem advir de uma situação concreta ou apenas da lembrança. 

Conceito histórico

Em meados do século XIX surgiram registros histórico-científicos que apontam para a descrição da síndrome conhecida hoje como Transtornos de Estresse pós-traumático (TEPT). A primeira referência clínica remonta a Silas Weir Mitchell, que reconheceu respostas de TEPT em veteranos da guerra civil. Nessa época, o médico alemão Eulenberger introduziu o conceito de trauma psíquico paracaracterizar reações de grito e medo que costumam ocorrer após um trauma. Eventos traumáticos podem levar ao desenvolvimento de transtornos como o TEPT, caracterizado por sintomas como reexperiência traumática, comportamentos de evitação e hiperexcitabilidade psíquica.

Estudos identificam vários fatores de risco para o desenvolvimento do TEPT, como: histórico de exposição a eventos traumáticos, abuso sexual, trauma físico e experiências subjetivas de medo. Há também uma relação entre o processamento dos dados, a fragmentação da memória e os subsequentes sintomas. Existiriam diferentes consequências quando se dá sentido à situação traumática (inserindo-a num contexto) e quando o processamento sensorial é pobremente organizado, fora de uma lógica, levando assim à maior propensão de o indivíduo desenvolver o transtorno. Avaliações catastróficas acerca do ferimento e o futuro são preditores do TEPT – pensamentos negativos relacionados ao trauma quando envoltos em sensação de incapacidade, descrença em relação aos outros, a si mesmo; e a crença de que o mundo é ameaçador predispõem o indivíduo ao desenvolvimento e manutenção da doença.

O TEPT no DSM

O TEPT foi introduzido como categoria diagnóstica pela primeira vez na década de 80 no DSM III (1980). No DSM V (2015), a sintomatologia do TEPT está organizada nos seguintes grupos: exposição a um evento de forma direta ou indireta; sintomas intrusivos com reexperiência traumática, onde o trauma continua no indivíduo como se tivesse sido algo recente e não fazendo parte do seu passado, também podendo ocorrer sobre a forma de pesadelo, alucinações, despersonalização e desrealização; evitação de estímulos associados, esquiva e distanciamento emocional, levando o sujeito a evitar qualquer estímulo que desencadeie as lembranças da vivência traumática; alterações negativas na cognição e humor, ou seja, um predomínio de emoções negativas como medo, culpa e raiva; e excitabilidade psíquica que são os sintomas que representam um estado de hiperexcitabilidade do sistema nervoso central e autonômico reflexos de uma excitação fisiológica extrema em resposta a uma variedade ampla de estímulos. Várias reações acompanham o humor ansioso, como taquicardia, respiração curta ou suspirosa, constrição precordial, “formigamentos”, parestesias, sudorese, extremidades frias ou também cefaléias, tonturas, sensação de “oco na cabeça”, “peso no estômago”; além da insônia, da irritabilidade e da hipervigilância.

Uma jornada gradativa

O Transtorno de Estresse Agudo (TEA) , que ocorre no mês inicial após a exposição ao evento traumático – seria um dos elementos preditores do TEPT. Para se caracterizar o TEA, o paciente deve apresentar ao menos três sintomas dissociativos durante a ocorrência traumática ou logo após: consciência reduzida, amnésia dissociativa, desrealização, despersonalização e entorpecimento.  Cada pessoa em situação de TEPT necessita de uma atenção cuidadosa, pois suas reações têm a ver com a sua história, sua capacidade de lidar com sentimentos e emoções, o impacto que a experiência teve em sua vida e a qualidade de suas experiências a partir do trauma.

Uma das teorias que fundamenta a maioria dos modelos cognitivos de TEPT é a de que a emoção extrema que é sentida durante o trauma levaria a uma desorganizada representação mnêmica do fato; além disso, estudos comprovam que pessoas com TEPT costumam distorcer a memória traumática potencializando desta forma o caráter catastrófico do ocorrido. O esmaecimento de uma lembrança depende de alguns fatores. Um deles é o tipo de reação que se teve. Entende-se por “reação” toda a classe de reflexos voluntários e involuntários, onde os afetos serão descarregados. Porém, quando a reação é reprimida, o afeto tende a ficar vinculado à lembrança. De acordo com as teorias cognitivas, as memórias intrusivas referentes a um trauma têm sua origem na forma como a informação é processada durante o evento. 

A dissociação

A dissociação, caracterizada por um processamento superficial do trauma durante e após o evento traumático – contribuiria para o desenvolvimento e manutenção do transtorno. Para muitos pacientes, a tendência à dissociação seria um padrão, uma habilidade para segregar certos pensamentos e emoções. Seria a dissociação, a última defesa do cérebro. A ênfase dada aos sintomas dissociativos se dá justamente ao fato de que reações que minimizam a memória traumática dificultam o processamento e a consequente elaboração do evento, levando a uma maior demora na recuperação. 

E MAIS…

Mulheres apresentam sintomas mais severos de TEPT

De acordo com alguns estudos, as mulheres apresentam sintomas mais severos de TEPT do que os homens. A razão disso não é clara. O que os autores sugerem é que nas mulheres há um maior índice de abuso sexual tanto na infância como na vida adulta e que este fato as deixaria mais vulneráveis ao TEPT.

Estudos com pessoas que sofreram acidentes automobilísticos mostram que estas, assim como as que passaram por outros tipos de eventos traumáticos, teriam os mesmos fatores de vulnerabilidade ao TEPT, tais como: trauma anterior, dissociação peritraumática e, após o trauma, a falta de suporte social.