O suicídio é uma grande preocupação de saúde pública. Embora tenham sido realizados vários estudos sobre comportamento suicida que se concentraram nos papéis dos fatores psicossociais e socioculturais, esses fatores têm valor preditivo insuficiente para serem clinicamente úteis.

É fundamental considerar que o suicídio representa um problema de saúde pública global, com implicações profundas para a saúde mental e o bem-estar das pessoas. A compreensão da psicofisiologia do suicídio é essencial para desenvolver estratégias eficazes de prevenção e intervenção.

O suicídio, a décima principal causa de morte em todo o mundo, é um fenômeno complexo. Modelos que visam explicar a interação de variáveis ambientais, como fatores socioeconômicos, teor de lítio na água potável e altitude, são pouco desenvolvidos.

Psicofisiologia do Suicídio

O Setembro Amarelo é uma campanha nacional que visa aumentar a conscientização sobre o suicídio e promover a saúde mental, com foco na prevenção e no suporte a pessoas em risco.

O suicídio está entre as três principais causas de morte para indivíduos de 15 a 44 anos. Dados da Organização Mundial da Saúde (OMS) indicam que o suicídio causa cerca de um milhão de mortes por ano, representando 1,4% do total de óbitos. Essas estatísticas não contemplam as tentativas de suicídio, que ocorrem de 10 a 20 vezes mais frequentemente do que os suicídios consumados. (World Health Organization [WHO], 2014.

A psicofisiologia do suicídio investiga como fatores biológicos e psicológicos contribuem para o comportamento suicida. Diversos mecanismos estão envolvidos:

Fatores Biológicos

Pesquisas indicam que desequilíbrios neuroquímicos, como alterações nos níveis de serotonina e noradrenalina, estão associados a um maior risco de suicídio. A serotonina, neurotransmissor associado ao humor e ao comportamento impulsivo, desempenha um papel crítico na regulação emocional. Estudos mostram que indivíduos com baixos níveis de serotonina têm uma propensão maior a comportamentos suicidas.

Além disso, alterações estruturais e funcionais no cérebro, como alterações no córtex pré-frontal e nas regiões limbicas, têm sido observadas em pessoas que cometem suicídio. Essas áreas estão envolvidas na regulação emocional e no controle de impulsos. Seis fatores de risco têm sido identificados como os mais relevantes para o comportamento suicida: o aumento na prevalência de transtornos depressivos, o uso excessivo de substâncias psicoativas, alterações psicobiológicas como a antecipação da puberdade, o crescimento no número de estressores sociais, mudanças nas atitudes em relação aos comportamentos suicidas e o aumento nas taxas de tentativas de suicídio (Diekstra&Garnefski, 1995; Rogers, 2001; Weir, 2001).

Segundo Dwivedi&Pandey(2010) é interessante considerar que a pesquisa sobre a perspectiva biológica do suicídio ganhou força e parece oferecer uma abordagem promissora para identificar fatores de risco biológicos associados ao comportamento suicida. Estudos recentes demonstram que uma alteração na plasticidade sináptica e estrutural é fundamental para doenças afetivas e suicídio. Moléculas de transdução de sinal desempenham um papel importante nesses eventos plásticos.

A proteína quinase A (PKA) é uma enzima crucial na via de transdução de sinal da adenil ciclase e está envolvida na regulação da transcrição gênica, sobrevivência celular e plasticidade. discutiram de maneira crítica e abrangente o papel da PKA no comportamento suicida. Os referidos autores sugerem a interessante possibilidade de que a PKA e moléculas de sinalização relacionadas possam servir como importantes fatores neurobiológicos no suicídio e possam ser relevantes em intervenções terapêuticas específicas para esses transtornos.

Fatores Psicológicos

A psicopatologia, incluindo transtornos mentais como depressão, transtorno bipolar e esquizofrenia, é um forte preditor de comportamento suicida. Indivíduos com esses transtornos frequentemente apresentam sentimentos intensos relacinados com a perda da vida.

O suicídio é um grande problema de saúde pública e uma causa de mortalidade prematura. Com vistas à prevenção, uma grande quantidade de pesquisas tem sido dedicada aos determinantes do suicídio, focando principalmente nos fatores de risco individuais, especialmente a depressão. Além das causas intrínsecas ao indivíduo, o ambiente social também tem sido amplamente estudado, particularmente o isolamento social.

Além dos fatores neurobiológicos, os aspectos psicossociais desempenham um papel significativo na psicofisiologia do suicídio. A depressão é um dos principais fatores de risco para o suicídio, com características como sentimentos de desesperança, baixa autoestima e isolamento social. A interação entre a predisposição genética e o ambiente, como experiências adversas na infância e estressores sociais, contribui para o desenvolvimento de transtornos mentais que podem levar ao suicídio.

O modelo de estresse-diátese sugere que indivíduos com uma predisposição genética para transtornos mentais podem ser mais vulneráveis ao suicídio quando enfrentam estressores ambientais significativos. A presença de uma rede de apoio social pode moderar esse risco, demonstrando a importância de intervenções sociais e terapêuticas.

A sensação de não ter alternativas e o sentimento de que a situação não pode melhorar são cruciais para o desenvolvimento de pensamentos suicidas.Desesperança e desespero, que podem contribuir para o suicídio. A teoria interpessoal-psicológica do comportamento suicida (Joiner, 2009) propõe que uma pessoa só cometerá suicídio se tiver tanto o desejo de fazê-lo quanto a capacidade de concretizar esse desejo. Segundo a teoria, o desejo suicida surge da combinação de dois estados interpessoais: a percepção de ser um fardo e a sensação de não pertencer a nenhum grupo. Contudo, o desejo por si só não é suficiente para levar ao suicídio; é necessário um terceiro fator: a capacidade adquirida para o suicídio, que se desenvolve através da exposição repetida e da habituação a situações dolorosas e desafiadoras.

Conscientização e Prevenção

O Setembro Amarelo é uma campanha criada no Brasil em 2015 com o objetivo de sensibilizar a população sobre o suicídio e promover a prevenção. A campanha promove diversas iniciativas, como palestras, eventos e materiais educativos, visando reduzir o estigma associado ao suicídio e aumentar o acesso a recursos de apoio.

De acordo cm Chloé Motillon-Toudicet al (2022), apoiados por bases teóricas comprovadas, principalmente as desenvolvidas por E. Durkheim e T. Joiner, a grande maioria dos artigos incluídos endossa a ideia de uma relação causal entre isolamento social e suicídio e, inversamente, um efeito protetor do apoio social contra o suicídio.

Além disso, a associação entre suicídio e isolamento social está sujeita a variações relacionadas à idade, gênero, psicopatologia e circunstâncias específicas. A etiologia social do suicídio tem implicações para intervenções e pesquisas futuras.

Impacto da Campanha

Diversos estudos mostram que campanhas de conscientização podem ter um impacto positivo na redução das taxas de suicídio. Aumento na procura por serviços de saúde mental e maior disposição para buscar ajuda são alguns dos efeitos positivos associados ao Setembro Amarelo.

Segundo o relatório da Organização Mundial da Saúde, em 2014, 420 mil pessoas faleceram devido a conflitos armados, enquanto 850 mil morreram por suicídio. Esse cenário caracteriza o suicídio como um problema de saúde pública global significativo, sendo uma das dez principais causas de morte em todos os países e uma das três principais causas de morte entre jovens de 15 a 29 anos em todo o mundo (OMS, 2018).

Desafios e Limitações

Apesar dos avanços, a campanha enfrenta desafios, como a necessidade de garantir que a informação chegue a todos os segmentos da sociedade e a dificuldade em medir o impacto direto nas taxas de suicídio. Um dos primeiros passos para melhorar a prevenção e o tratamento dos STBs é estabelecer fatores de risco (ou seja, preditores longitudinais).

A persistência do estigma e a falta de recursos para serviços de saúde mental ainda são barreiras significativas. O suicídio resultante do bullying é um problema social e de saúde pública, portanto, é de fundamental importância que também profissionais da saúde como enfermeiros e enfermeiros de cuidados primários pediátricos tenham a responsabilidade de educar professores e pais para promover a detecção precoce e o desenvolvimento de planos de prevenção e ação mais eficazes.

No Brasil, o Setembro Amarelo é uma campanha de prevenção ao suicídio que começou em 2015. Iniciada pelo Centro de Valorização da Vida (CVV), pelo Conselho Federal de Medicina (CFM) e pela Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP), a campanha mantém o mês de setembro como período dedicado à conscientização. O objetivo é promover eventos que estimulem discussões sobre o suicídio e aumentem a visibilidade do tema, destacando a importância do diálogo sobre a questão. Durante o mês da campanha, é comum iluminar locais públicos com a cor amarela e promover palestras, eventos, programas de rádio e entrevistas para abordar o suicídio.  

De aacordo com Cruz et al (2023), a falta de iniciativa em ações multissetoriais pode explicar o fracasso do Setembro Amarelo  em alterar as mortes por suicídio; portanto, o desenvolvimento de novas linhas de ação focadas na capacitação de profissionais e na expansão da rede de cuidados poderia torná-lo um instrumento eficaz na redução da mortalidade por suicídio.

Portanto, além dos aspectos legais que exigem dos profissionais e da sociedade uma atenção especial ao suicídio, é essencial estabelecer conexões genuínas, demonstrar um real interesse pelo bem-estar do outro e ouvir de maneira aberta e sem julgamentos. Só dessa forma é possível assegurar um trabalho realmente eficaz.

A psicofisiologia do suicídio revela a complexa interação entre fatores biológicos e psicológicos que contribuem para o comportamento suicida. A campanha Setembro Amarelo desempenha um papel vital na conscientização e prevenção do suicídio, mas desafios persistem. A promoção contínua da saúde mental e o apoio a pessoas em risco são essenciais para reduzir os índices de suicídio e melhorar o bem-estar mental da população.

Referências
World Health Organization. (2014). Country reportsandchartsavailable. Recuperado de www.who.int/mental_health/prevention/suicide/country_reports/en/index.html – www.who.int/mental_health/prevention/suicide/country_reports/en/index.html
Diekstra, R. F. W., &Garnefski, W. (1995). Onthenature, magnitude andcasualityofsuicidalbehavioroninternational perspective. Suicide and Life-ThreateningBehavior, 25, 36-57.
Dwivedi, Y., &Pandey, G. N. (2011). Elucidatingbiologicalriskfactors in suicide: Role of protein kinase A. Progress in Neuro-Psychopharmacology&BiologicalPsychiatry, 35(4), 831-841. https://doi.org/10.1016/j.pnpbp.2010.08.025
Rogers, J. R. (2001). Theoreticalgrounding: ‘The missing link’ in suicide research. JournalofCounseling&Development, 79(1), 16-29.
Weir, E. (2001). Suicide: The hiddenepidemic. Canadian Medical AssociationJournal, 165(5), 634-636.
Ribeiro, J. D., &Joiner, T. E. (2009). The interpersonal-psychologicaltheoryofsuicidalbehavior: Current status and future directions. The Clinical Psychology Review, 29(4), 347-357.
ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE (OMS). Folha informativa sobre suicídio. Genebra: OMS, 2018.
Motillon-Toudic C, Walter M, Séguin M, Carrier J-D, Berrouiguet S, Lemey C. Social isolationand suicide risk: Literature review and perspectives. EurPsychiatry. 2022 Oct 11;65(1). doi: 10.1192/j.eurpsy.2022.2320.
Cruz, W. G. N., Jesuino, T. A., Moreno, H. F., Santos, L. G., & Almeida, A. G. (2023). ImpactAnalysisoftheBrazilian Suicide PreventionCampaign “YellowSeptember”: AnEcologicalStudy. Trends in PsychiatryandPsychotherapy. Advance online publication. https://doi.org/10.47626/2237-6089-2022-0564