Existem professores de vários tipos. E quando falamos sobre tipos, nos referimos à tipos de personalidade. É um importante aspecto, que diferencia o professor que é emocionalmente afastado de seus alunos daquele que procura aproximar-se em uma atitude dialogal e empática. Daquele professor que estabelece uma relação próxima e sensível às necessidades de seus alunos. Que o escuta.

A escuta sensível é um processo psicológico postulado por René Barbier, que visa suspender o julgamento inerente à escuta do que o aluno diz – em outros termos, tenta evitar o pré-conceito –, em uma tentativa de compreensão empática do que o aluno quer. No dizer do autor, é uma proposição interpretativa para tentar inferir o que o aluno quer significar em sua fala ou em sua atitude. Tal proposição interpretativa depende da experiência e da personalidade de quem escuta, procurando “escutar-ver” a outra pessoa, ou seja, imaginá-la para além das aparências, o que pressupõe um entendimento o mais preciso possível do sentimento, pensamento, desejo e intenção do outro.

O professor precisa, para agir em termos de escuta sensível, de uma sensibilidade emocional, que engloba a capacidade do professor de aprender sobre como seus alunos aprendem, como eles se sentem em relação a si e à sua vida, o que implica em ser sensível ao que acontece consigo próprio, com seus alunos e com todo o contexto da ação pedagógica – o que é comumente referido como razão sensível.

O processo da Razão Sensível

A razão sensível engloba características de sensibilidade emocional do professor que o torna capaz de encontrar as mais perfeitas condições possíveis para a aprendizagem, em que é capaz de conviver pacificamente com as diferenças. Ao mesmo tempo, indica capacidade de ter senso de humor onde outros só veem problemas, de ser alegre apesar das dificuldades, de saber se autocriticar, de rir diante dos próprios erros e fracassos.

Que fique claro que isso não é uma forma de mascarar as profundas questões pessoais e profissionais que envolvem a vida do professor. Nem sempre se está bem emocionalmente, nem sempre se está feliz ou mesmo nem sempre se está saudável. Porém, isso não impede a muitos de conseguir equacionar seus problemas pessoais e profissionais em seu trabalho docente.

A personalidade do professor influencia na aprendizagem

Voltando ao início deste artigo, existem professores de vários tipos. Na medida em que somos professores, os alunos que têm contato conosco possuem uma visão a nosso respeito, da mesma forma que tínhamos – ou temos – por nossos professores. Em grande parte, esta avaliação subjetiva dos alunos é devida à personalidade do professor.

A personalidade pode ser definida como “uma formação psicológica que define nossa relação com tudo o que nos cerca, e que se torna evidente através do nosso comportamento. A personalidade é algo tão único, que é uma característica que, ao mesmo tempo, é estável e mutável, proporcionando-nos assim uma característica estável pela qual somos conhecidos, e ao mesmo tempo, que muda conforme as experiências que temos. Assim, a personalidade pode ir mudando segundo os fatores ambientais que rodeiam o indivíduo, com a consequente adaptação, mas sempre mantendo um conjunto estável de atitudes e comportamentos.

A personalidade do professor influencia diretamente o que ocorre na sala de aula porque determina, em parte, a dinâmica que acontece dentro da sala de aula. Para que seja consciente disso, entretanto, e possa agir nesse sentido, é necessário que este professor faça uma reflexão sobre até que ponto isto está sendo benéfico ou não para a aprendizagem dos alunos, para o processo ensino-aprendizagem. Mas, às vezes, alguns tipos de personalidades têm dificuldades de escuta, de ouvir o aluno, seus anseios, suas ideias.

Traços de personalidade, capital psicológico e dinâmica de sala de aula

Bozgeyikli, em um estudo que aplicou uma teoria de componentes de personalidade amplamente usada em estudos científicos, chamada de “Teoria dos Cinco Fatores” (mais conhecida como Big Five), combinada com uma Escala de Capital Psicológico Organizacional, identificou algumas características interessantes. Ele postulou que os traços de personalidade considerados positivos (extroversão, socialização, conscienciosidade e abertura a experiências) foram identificados nos professores mais bem-sucedidos e populares nas escolas, em especial por serem associados com os componentes do capital psicológico otimismo, esperança, resiliência e autoeficácia. Além disso, normalmente obtém melhores resultados acadêmicos com seus alunos.

Por outro lado, aqueles com maior grau de neuroticismo (um traço de personalidade considerado negativo, associado a uma pessoa emocionalmente instável, ansiosa, hostil e vulnerável, com pouca empatia) possuem estes componentes de capital psicológico em menor grau. São aqueles professores que possuem maior dificuldade no trato com os alunos, que tendem a manter distância e pouco se envolvem emocionalmente. Estes normalmente têm maior dificuldade de mudanças de paradigma (um modelo ou padrão aceitos como necessários e suficientes para explicar qual a melhor forma de fazer alguma coisa, como ministrar aula, por exemplo).

Professores com alto grau de neuroticismo normalmente tendem a ter as outras características em menor grau, como serem abertos a experiências, por exemplo, e se colocam em paralisia paradigmática, em que se convencem que a forma que utilizam de ministrar aulas é a melhor e suficiente, o que inibe qualquer tentativa de mudança. Sendo propensos a ter resistência a mudanças, evitam adotar novos métodos, ou alterar alguns procedimentos em sala de aula[i], mesmo que esta mudança seja necessária para melhor rendimento acadêmico.

E MAIS…

Usando a sensibilidade emocional em sala de aula

Trabalhar a competência socioemocional dos alunos, incluindo-se neste espectro, em que aspectos como habilidades sociais, consciência, regulação e autonomia emocionais, e competências para a vida também sejam consideradas como elementos essenciais para a aprendizagem, pode ser essencial para ter uma sala de aula empática e de escuta, através, entre outros, do autocontrole das emoções e da prática diretiva dos impulsos emocionais, direcionando positivamente seus impulsos. A seguir são colocadas algumas sugestões:

  1. Use a escuta uma poderosa ferramenta para melhorar a aprendizagem.
  2. Use o bom humor, faça-se reconhecer como ser humano, permita a livre expressão e envolva-se com seus alunos.
  3. Use ao máximo suas características de personalidade positivas na interação com os alunos.
  4. Entenda seus limites e procure superá-los. Escolher fazer parte do fracasso ou do sucesso é uma decisão sua.
  5. Identifique se não está em paralisia paradigmática, se permita sempre melhorar. Se você pode mudar e melhorar, seus alunos também acreditarão que podem, pois se espelharão em suas atitudes e comportamentos. Otimismo e positividade são as palavras-chave.
  6. Ensine seus alunos a se educarem emocionalmente. Trabalhe as competências socioemocionais em sala de aula.
Referências bibliográficas
BARBIER, R. L’écoute sensible dans la formation des professionnels de la santé. Conférence à l’École Supérieure des Sciences de la Santé du G.D.F. (Brésil). Université de Brasilia, 2002.
CORTELLA, M.S. Educação, Escola e Docência: novos tempos, novas atitudes. São Paulo: Cortez, 2014.
CODEA, André. Professores, personalidades e o Big Five: teoria dos cinco fatores. Revista Escola Particular, nº 261, dezembro de 2019, p. 29.
WEINTEN, W.; DUNN, D.S.; HAMMER, E.Y. Psychology Applied to Modern Life: Adjustment in the 21st Century. 12.ed. USA, Boston: Cengage Learning, 2016.
BOZGEYIKLI, Hasan. Big Five Personality Traits as The Predictor of Teachers’ Organizational Psychological Capital. Journal of Education and Practice, vol.8, nº.18, 2017.
KUHN, T.S. A estrutura das revoluções científicas. 5.ed. São Paulo: Perspectiva, 2000.
FUNDAÇÃO GETÚLIO VARGAS – São Paulo. Tecnologia e um novo cenário educacional. Revista EI! – Ensino Inovativo. FGV-SP: Centro de Desenvolvimento do Ensino e da Aprendizagem (CEDEA), volume especial, 2015.
GULLÉN, J.C. Op. Cit., 2017.