O tema é polêmico, porém bastante atual em função das facilidades (e armadilhas) da vida moderna: a importância de providências para redução do sobrepeso decorrente das condições alimentares inadequadas, e agravadas nesta pandemia com o isolamento social e a inatividade física.
Segundo Magdaleno Jr. et al. (2009), a obesidade é uma doença crônica, de prevalência crescente, que, pelos riscos associados, vem sendo considerada como um dos principais problemas de saúde pública da sociedade moderna.
A obesidade é o acúmulo de gordura nos órgãos e tecidos, sendo considerado um fenômeno multifatorial que envolve componentes genéticos, comportamentais, psicológicos, sociais, metabólicos e endócrinos (Björntorp, 2003, apud de Oliveira; Linardi; de Azevedo, 2004).
Estatísticas alarmantes
No Brasil, entre 2003 e 2019, a proporção de obesos na população com 20 anos ou mais de idade do país mais que dobrou, passando de 12,2% para 26,8%. No período, a obesidade feminina passou de 14,5% para 30,2% e se manteve acima da masculina, que subiu de 9,6% para 22,8%. Por sua vez, excesso de peso atingia 60,3% da população de 18 anos ou mais de idade, o que corresponde a 96 milhões de pessoas, sendo 62,6% das mulheres e 57,5% dos homens. O excesso de peso também ocorria em 19,4% dos adolescentes de 15 a 17 anos de idade, o que corresponde a um total estimado em 1,8 milhão de pessoas, sendo 22,9% de moças e 16% dos rapazes. A obesidade atingia 6,7% dos adolescentes: 8% no sexo feminino e 5,4 % no sexo masculino. (Campos; Agência Brasil, 2020).
A maneira mais objetiva para classificar a obesidade é o Índice de Massa Corpórea (IMC). A faixa de peso de IMC considerada normal varia de 19 a 24,9 Kg/m2; pessoas com IMC de 25 a 30 são consideradas acima do peso (sobrepeso); aquelas entre 30 e 40 já são classificadas como obesas; por fim, pessoas com IMC acima de 40 são portadoras de obesidade mórbida (de Oliveira; Linardi; de Azevedo, 2004).
Indicação cirúrgica
Devido aos elevados riscos à saúde correlacionados à obesidade mórbida (cardiovasculares, ósseos, articulatórios), a necessidade de redução do peso se torna uma exigência, porém nem sempre o paciente consegue fazer isso por conta própria, somente com dieta e medicação. Na maioria dos casos, existe a necessidade de intervenção cirúrgica, que de Oliveira, Linardi e de Azevedo (2004) elencam didaticamente em: 1) limitam a capacidade gástrica (as chamadas cirurgias restritivas); 2) interferem na digestão (os procedimentos mal-absortivos); e 3) uma combinação de ambos as técnicas.
A indicação para a cirurgia bariátrica deve ser feita sob acompanhamento de equipe multidisciplinar, conforme Resolução CFM nº 2.131/2015 (cirurgião com formação específica, endocrinologista, psiquiatra, nutrólogo, nutricionista e psicólogo), sob critérios específicos determinados por aquela Resolução. Existem critérios abrangentes e excludentes, que podem ser melhor comentados em próximos artigos.
Aspectos psicológicos
Sob aspecto psicológico, pessoas obesas apresentam maiores níveis de sintomas depressivos, ansiosos, alimentares e de transtornos de personalidade. Porém, a presença de psicopatologia não é necessária para o aparecimento da obesidade (de Oliveira; Linardi; de Azevedo, 2004). Flores (2014), em artigo de revisão, elenca os fatores psicossociais merecedores de atenção mais citados nas publicações:
- compreensão do paciente quanto à operação e as mudanças de estilo de vida necessárias;
- expectativas quando aos resultados;
- habilidade de aderir às recomendações operatórias;
- comportamento alimentar (histórico de peso, dietas, exercício físico);
- comorbidades psiquiátricas (atuais e prévias); motivos para realizar o procedimento cirúrgico;
- suporte social;
- uso de substâncias;
- status socioeconômico;
- satisfação conjugal;
- funcionamento cognitivo;
- autoestima;
- histórico de trauma/abuso;
- qualidade de vida;
- ideação suicida.
Como critérios de inaptidão, a referida autora (Flores, 2014) elenca os seguintes:
- falta de compreensão quanto aos riscos, benefícios e resultados do procedimento cirúrgico;
- resistência em aderir às recomendações pós-operatórias;
- retardo mental severo;
- múltiplas tentativas de suicídio ou tentativa de suicídio recente;
- sintomas ativos de transtorno obsessivo-compulsivo e de transtorno bipolar;
- estressores de vida severos;
- uso de nicotina.
Condições emocionais
A Avaliação Psicológica consiste em uma série de procedimentos: coleta de informações médicas, entrevista com o(a) paciente e familiares, testes padronizados e validados pelo Sistema SATEPSI-CFP, e instrumentos como questionários ou protocolos que sejam admitidos pelo CFP, e entrevista devolutiva com redação de laudo à equipe para a tomada de decisões e providências cabíveis. O psicólogo poderá realizar avaliações com acerca do comportamento alimentar, especialmente no que concerne o transtorno da compulsão alimentar periódica e a síndrome do comer noturno também são realizadas, mas com menor frequência e com grande variabilidade de recursos utilizados para tal finalidade.
Muitos pacientes perguntam “Por que preciso fazer uma avaliação psicológica para fazer a cirurgia bariátrica?”, a resposta é: para avaliar as condições emocionais, familiares, sociais, que estejam por trás do comportamento de ‘comer’, e que possam interferir no sucesso ou fracasso da intervenção terapêutica. A avaliação psicológica também é considerada como oportunidade única de realizar a psicoeducação do paciente sobre as mudanças implicadas à cirurgia bariátrica. Por fim, o psicólogo também precisa oferecer apoio psicológico e preparar o candidato para as mudanças comportamentais exigidas na fase pós-operatória.
O perigo da compulsão alimentar
A compulsão alimentar (binge eating)deve ser observada com muita atenção pela equipe, uma vez que a possibilidade de remissão ainda é polêmica entre os pesquisadores e não é consenso na literatura (Flores, 2014). De qualquer forma, a Avaliação Psicológica deve investigar aspectos emocionais, psiquiátricos e cognitivos que podem influenciar o resultado da operação. O objetivo da Avaliação Psicológica é avaliar o ajustamento psicológico do paciente e de seu preparo para o procedimento, sendo considerada ferramenta imprescindível de coleta de informações.