“Os homens não são perturbados pelas coisas em si, mas pela interpretação que fazem das coisas”. A frase do filósofo grego Epiteto resume essa terapia.
O psicólogo norte-americano Albert Ellis atuou inicialmente como psicanalista e preocupado com efetividade, percebeu que o “insight” cognitivo não era suficiente para a mudança. Ele percebeu que o terapeuta poderia acelerar esse processo através de uma postura ativa e diretiva, efetiva no tratamento de seus clientes, com resultados duradouros que pudessem não só reduzir a perturbação, mas prevenir novas no futuro.
Embasamento filosófico
Ellis, desde a infância, foi um ávido consumidor de filosofia. É por isso que a TREC tem um grande embasamento na filosofia, principalmente do:
Estoicismo – Epiteto, no século I d.C, cunhou a célebre frase: “Os homens não são perturbados pelas coisas em si, mas pela interpretação que fazem das coisas”, cujo resgate por Albert Ellis deu origem ao movimento que hoje conhecemos como Terapia Cognitivo-Comportamental, reconhecendo o elemento cognitivo como mediador entre a adversidade e as reações emocionais e comportamentais. Do estoicismo moderno, a TREC utiliza a ideia do triângulo da felicidade e seus três aspectos fundamentais para a construção da felicidade: (a) assumir responsabilidade; (b) viver com excelência; (c) focar no que está sob seu controle.
Construtivismo – é um paradigma que privilegia uma concepção ativa de conhecimento. A mente constrói ativamente conhecimento e não é um sistema passivo que reúne seus conteúdos do ambiente externo.
O modelo ABC
É a forma que a TREC conceitualiza os problemas apresentados pelos consultantes. De acordo com este modelo psicopedagógico:
– O A representa um acontecimento ativador (ou adversidade), que é a situação observável somada à sua percepção.
– O B é o sistema de crenças do cliente que consiste em duas partes: crenças racionais e irracionais.
– O C representa as consequências emocionais, comportamentais e cognitivas que a pessoa tem sobre o A, mas mediada por B.
Na TREC, o foco da terapia está em mudar as consequências disfuncionais influenciadas por um sistema de crenças irracionais.
Quando os clientes acreditam que o evento é diretamente responsável por suas perturbações emocionais, eles estão ignorando ou, mais provavelmente, desconhecendo a presença e o impacto de suas crenças nas suas emoções e comportamentos.
Se eles estão se perturbando, provavelmente também podem recusar-se a perturbar-se diante de um mesmo evento adverso – a maneira como pensamos influencia se vamos sofrer ou não. Por isso, é muito importante saber diferenciar as crenças racionais das irracionais:
Crenças irracionais
As crenças irracionais, para a TREC, são a raiz da perturbação. A rigidez cognitiva em forma de obrigações, exigências, deveres absolutos e necessidades se apresentam três focos: eu, os outros e a vida.
As crenças rígidas, em sua maioria, tendem a se basear em nossos desejos. A força do desejo não faz com que ele se transforme numa demanda (“Eu realmente quero muito vencê-lo no jogo” nunca se tornará por si só uma exigência “Devo vencê-lo no jogo”). As crenças não se distinguem em irracionais ou racionais por sua intensidade, mas pela característica de rigidez ou flexibilidade.
A sustentação de crenças rígidas representa nossa exigência de fazer certos eventos acontecerem magicamente. Se, de fato, nossas crenças rígidas tivessem esse efeito, então seria sensato mantê-las. Infelizmente, o simples fato de sustentar uma crença rígida não influencia a realidade; apenas influencia nossas respostas disfuncionais à realidade, pois a pessoa fica perturbada com a perspectiva de frustração.
Crenças racionais
São, em essência, flexíveis, é por isso são consideradas o cerne da saúde psicológica. Esta se baseia no fato humano básico de que formamos preferências sobre as coisas, temos desejo, vontade.
A preferência faz com que aceitemos que eventos não desejáveis podem acontecer e nos preparamos de forma efetiva e razoável para evitá-los, aumentando as chances de sucesso por não termos, por exemplo, reações comportamentais disfuncionais típicas de emoções negativas não saudáveis, como ansiedade e depressão, por exemplo.
As crenças racionais (flexíveis) têm dois componentes:
⦁ preferência declarada: afirmamos nossas preferências sobre o que queremos ou não que aconteça.
⦁ Negação da preferência: reconhecemos que não temos que obter o que queremos e aceitamos isso como uma possibilidade.
Ao manter uma crença racional flexível, fica evidente o que eu desejo, porém, não exijo que certos eventos aconteçam. Em vez disso, é uma visão realista, uma vez que ambos os componentes que compreendem uma crença flexível são consistentes com a realidade – em geral, podemos provar que temos um desejo e provar que não precisamos ter nosso desejo satisfeito.
Aspectos diferenciais
A seguir, veremos diferenciais e características que a distinguem de outras abordagens TCC.
Valor único do ser humano – Mesmo que fizesse sentido valorar cada ser humano, seriam diversas as variáveis que influenciariam uma possível equação. Na prática, sabemos que essa busca é ilógica e para resolver este dilema, o caminho é aceitar que todos os humanos têm o mesmo valor pelo simples fato de serem humanos. E esta tem sido uma boa solução. Parece-lhe simples? Talvez. Porém é de uma profundidade clínica tamanha – não é preciso o ser humano se considerar valioso para ser feliz. Atribuir valor condicional aos humanos é uma escolha e, portanto, somos aconselhados a escolher uma filosofia de valor incondicional, em vez de uma filosofia de condicional.
Reconhece a imperfeição humana – Reconhece a falibilidade e a não perfeição humana e vê crenças de perfeccionismo como demandas de si, do outro e do mundo para que tudo saia 100% perfeito, o que é ilógico e irreal.
Estimula a construção da própria felicidade – Busca ajudar o cliente a ser responsável pela construção de sua própria felicidade, reconhecendo que cada pessoa é capaz de mudar a si mesma e construir uma vida razoavelmente feliz é um direito de todos.
Distingue emoções saudáveis das não saudáveis de forma qualitativa – A TREC é a única TCC que acredita que o que diferencia uma emoção não saudável da saudável não é a diminuição da sua intensidade, inclusive postula que pode haver emoção negativa saudável de alta intensidade. Diante de uma adversidade, seria ilógico e não natural sentirmos emoções positivas ou neutras, mas sim, sentir emoções negativas saudáveis, que nos levariam a adotar comportamentos de enfrentamento e resolução de problemas.
Reconhece a legitimidade do desejo pessoal (preferência) – Uma característica básica dos seres humanos é o desejo e, como tal, é legítimo, portanto validado. A TREC entende que o problema não é o desejo em si, e sim, a perturbação acontece quando exigimos que esse desejo se torne uma realidade.
Impacto na qualidade de vida
A TREC é uma abordagem terapêutica cuja proposta vai além de ajudar o paciente a se sentir melhor – o objetivo é ajudar o paciente a ficar melhor. Acredita que é possível desenvolver habilidades cognitivas, emotivas e comportamentais saudáveis para lidar com as adversidades da vida, reforçando a ideia de filosofia de vida preferencial, ou seja, valido meu próprio desejo, mas reconheço que as coisas não têm que ser da forma como exijo.
A abordagem explora o sistema de crenças que mantemos
Sabendo que o passado não pode ser mudado, o foco da terapia passa a ser o sistema de crenças que mantemos no presente referente aos eventos do passado.
Um fato não se pode negar: a obra e trabalho clínico de Albert Ellis definiram um novo olhar para a prática clínica em Psicoterapia sendo a primeira das terapias cognitivo-comportamentais. É interessante notar que, apesar de a TREC ser uma terapia de segunda onda, desde sua origem contempla elementos das chamadas terapias contextuais, ou de terceira onda, que pressupõem aceitação incondicional e reconhecimento da funcionalidade das emoções. Além disso, hoje é possível afirmar que a TREC é uma Psicoterapia efetiva e baseada em evidências.
Referências:
Ellis, A. (1996). The Humanism of Rational Emotive Behavior Therapy and Other Cognitive Behavior Therapies. The Journal of Humanistic Education and Development, 35(2), 69–88. doi:10.1002/j.2164-4683.1996.tb00356.x
Ellis, A. & MacLaren, Cath, (2005). Rational Emotive Behavior Therapy: A Therapist’s Guide, 2nd Edition (The Practical Therapist). New York : Impact Publishers.
Ellis, A. (2010). All Out! – An Autobiography (Psychology). New York : Prometheus Book.
Dryden, W. (2013). Dealing with Emotional Problems Using Rational-Emotive Cognitive Behaviour Therapy : A Practitioner’s Guide (English Edition) 1ª Edição. Abington : Routledge.
Dryden, W. (2014). Rational Emotive Behaviour Therapy: Distinctive Features (CBT Distinctive Features). Abington : Routledge.
Ruggiero, G. M., Ammendola, E., Caselli, G., & Sassaroli, S. (2014). REBT in Italy: Dissemination and Integration with Constructivism and Metacognition. Journal of Rational-Emotive & Cognitive-Behavior Therapy, 32(3), 183–197. doi:10.1007/s10942-013-0177-9