São 19 horas em ponto após um dia exaustivo de trabalho. Você está fechando seus arquivos, respondendo os últimos e-mails e limpando o que sobrou dos rascunhos que ficaram amontoados em cima da mesa quando, de repente, um aceno de cabeça e uma voz mansa, ligeiramente afetuosa, encenam o que parecia inevitável: “você me dá uma ajudinha?”.
O gestor, que deveria organizar a demanda de trabalho ao longo da semana e que não vê vantagem em pagar hora extra, está agonizando. Só resta você, o rei da savana, para lavrar rugidos, lançar dentadas indômitas e estabelecer um corre-corre selvático atrás da hiena que reluta em permanecer viva. Sim, você ficará até tarde: “E se reclamar, está demitido!”.
Por que mordidelas isto ocorre?
Para o doutor em psicologia e psicanalista da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), Pedro Luiz Ribeiro de Santi, impelir o colaborador a realizar demandas extras de trabalho, rotineiramente, após o horário tradicional do expediente estabelecido, denotam o que se chama de infantilismo psíquico.
Na visão do especialista, estes líderes, na maioria das vezes, não sabem adiar o prazer que poderão obter ao finalizar uma tarefa importante. Deste modo, movidos pelo imediatismo, pela impulsividade e pela ânsia de alcançar a gratificação desejada, custe o que custar, trocam os pés pelas mãos em uma errática necessidade de se sentirem preenchidos internamente.
Em outras palavras, pode-se afirmar que o aparelho mental destes gestores não fora preparado para lidar com a espera e, consequentemente, com uma possível falta. E, como filhotes pirracentos e à deriva, seus pensamentos insistem em retumbar, disfarçadamente, os grunhidos: “quero tudo e quero agora”, “nada é suficiente” e “preciso ter sempre mais”.
Assim, por permanecerem na falta ilusória que eles mesmo se impõem, acabam por se tornar carrascos dos subordinados e de si mesmos. Ora, nada melhor do que fingir que se está faminto de afeto para pressionar o funcionário a fazer o papel que dele se espera: “seja a mãe que nunca tive” ou “oriente-me, pois, o meu pai não foi capaz de fazê-lo quando precisei”.
Guardadas as devidas proporções, o colaborador, na teoria, não possui obrigação de amparar o gestor e vice-versa. E, como nem toda empresa está preparada para viver no plano real, em que todos são maduros e deixam suas mazelas e colapsos emocionais do lado de fora, algumas medidas simples podem ser utilizadas para ajudar Simba a ser um “leão de verdade”.
Linguagem simbólica
A primeira forma para lidar com este perfil de comandante consiste em utilizar a linguagem simbólica, repleta de explicações metafóricas direcionadoras. Em vez de dizer “estou cansado. Está na minha hora”, experimente a sentença “podemos finalizar esta demanda amanhã? Se passarmos do ponto hoje, podemos comprometer toda a produtividade do dia seguinte”.
E por que não o auxiliar a reduzir a ansiedade? Troque as afirmações “é para já”, “já estou terminando” e “finalizo em cinco minutos” por uma linguagem que denote equilíbrio. Ao utilizar a deliberação “realizarei esta demanda assim que for possível”, você estará imprimindo no psiquismo do outro a importância de investir na espera, trazendo-o para a realidade.
Resultados imediatos?
Quando o líder o pressionar por resultados fantasiosos os quais ele gostaria que fossem alcançados em tempo recorde, experimente nutri-lo com o banho de linguagem: “os números serão alcançados, porém, gradativamente e dentro do prazo”. Isto fará com que ele perceba que, para tudo na vida, existe um caminho concreto a ser percorrido.
Demandas simultâneas? A falta de foco retroalimenta o círculo vicioso composto pela tríade ansiedade-impulsividade-frustração. Quando suscitado a realizar tal engodo, experimente ordenar a bagunça emocional do líder: “Se pararmos esta atividade, não iremos concluir com sucesso nem uma coisa nem outra. Qual delas precisa ser finalizada com maior urgência?”.
Seara emocional aflorada
Manter a calma e não dar vazão à raiva que esta liderança provoca na seara emocional é essencial para evocar a razão frente às situações encontradas. Afinal, você pode não possuir a paciência do Timão e do Pumba.
Contudo, se assim quiser, poderá assessorar o seu superior a instaurar um mantra tão importante para a vida adulta: “Isto é viver, é aprender. Hakuna Matata!”.