ESTUDO DE CASO

Sou Karla Chaves Rodrigues, tenho 46 anos, sou casada e tenho um filho de 9 anos. Neste mês de prevenção ao câncer de mama conhecido como Outubro Rosa, quero contar um pouco da minha história e espero que possa contribuir para incentivar as mulheres a fazerem o autoexame e, em caso de dúvida, procurar seu médico de confiança o mais rápido possível.

Sempre tive mamas muito densas e não tenho histórico de câncer de mama na minha família. No final de 2020, decidi parar com a pílula e coloquei um DIU de cobre. Poucos meses depois, descobri que eu já estava na pré-menopausa, mas ainda estava tendo ciclo menstrual. Havia feito o meu último exame de apalpação das mamas em fevereiro de 2021 mas, em junho eu comecei a sentir minha mama direita um pouco mais densa do que o normal, sem nenhum nódulo palpável mas, devidos às alterações hormonais que eu estava tendo, achei que era algo relacionado à pré-menopausa.

Perder o chão

Até final de agosto, essa “densidade” da mama começou a ser mais evidente na região superior da mama, mas sem sensação de nódulo à apalpação. Por não ter nenhum  caso de câncer de mama na família, isso era a última coisa que passava pela minha cabeça e cheguei até pensar que estava com leite ou algum líquido empedrado nas glândulas mamárias (depois comecei a reparar que muitas mulheres tiveram essa mesma impressão). Como não doía, decidi esperar para conversar com a ginecologista na próxima sessão de controle, que seria em setembro. Mas no dia 19 de setembro, ao tomar banho, foi a primeira vez que eu vi algo mais abaulado ao olhar de cima para baixo e notei que já estava com uma forma nodular ao apalpar. Fiquei desesperada, não me conformava de não ter percebido isso antes, pois já era grande.

No dia 5 de outubro, recebi o diagnóstico de Câncer de Mama Triplo Negativo invasivo de quase 3cm de diâmetro e grau de malignidade G3 (altamente agressivo e de crescimento rápido). Foi quando a minha ficha caiu de verdade e pude saber o que significava “perder o chão”. Pensar em não poder ver meu filho crescendo e se tornando um adulto me agoniava. Não poder pensar num futuro, em fazer planos e envelhecer ao lado do meu esposo também era horrível. Milhões de coisas passando pela cabeça, enquanto a ginecologista passava as informações, marcava uma consulta com o centro de tratamento de câncer de mama e me dava um papel que me dava o direito do convênio pagar boa parte de uma peruca.

Três dias depois passei com a oncologista que, ao fazer o ultrassom da minha axila, descobriu que já havia metástase em um linfonodo. O que já era ruim ficou pior! Chorei de desespero e ela deixou bem claro que, mesmo para eles e com os exames, estava muito difícil localizar e entender os limites do nódulo da mama. Por isso que eu näo conseguia sentir com clareza o que era quando eu palpava, porque ele estava difícil de saber até onde ele ia, era bem atípico. A médica deixou bem claro que, se não houvesse metástase em outros órgãos, o tratamento seria em direção à cura. Caso contrário, seria um tratamento paliativo.

O impacto do diagnóstico

Saí de lá como se tivessem me dado uma sentença de morte. No caminho até minha casa, eu chorava, meu corpo tremia e minhas mãos estavam geladas. Conversava com Deus pedindo ajuda para que eu tivesse força para enfrentar o que vinha pela frente. Meu esposo me deixou em casa com muito pesar e foi buscar nosso filho na escola. Fiquei sozinha soltando o grito e as lágrimas, e conversando com Deus. Em momento algum eu me revoltei contra Ele, só pedi sua ajuda, tanto para mim quanto para a minha família. De repente, senti uma paz tão grande que parei de chorar e voltei a ficar serena. Era Deus me dizendo que: “Fique tranquila, eu estou com voce”. Foi inacreditável! Meu esposo chegou e se surpreendeu ao me ver bem, nem parecia a mesma pessoa de alguns minutos atrás. Fui tomada de uma força tão grande que consegui, naquele mesmo dia, fazer chamadas por vídeos para a nossa família e contar tudo o que estava acontecendo, sem derrubar uma lágrima e olha que eu sou chorona…

Lá se foram mais uma semana e meia de tortura à espera dos resultados….. que deram negativos e o plano de tratamento ficou baseado em quimioterapias, cirurgia e radioterapia.

Um dia antes de iniciar a quimioterapia, cortei o cabelo bem curto. Tive enjoo e muito cansaço na primeira quimioterapia. Decidi passar máquina zero no cabelo e, o apoio que recebi do meu esposo e meu filho ajudou que isso não fosse dramático. Admito que quando vi os “toquinhos” de cabelo caindo em grande quantidade, fiquei abalada. Não pela estética, mas por dó pelo meu corpo estar sendo bombardeado por substâncias que, embora fossem me salvar, prejudicariam o seu funcionamento. O efeito colateral que mais me incomodou foi a mucosite, que ocorre em todas as mucosas, causando sangramento nasal, secura dos olhos, boca e vagina. Eu sentia uma queimação horrível desde a garganta até o estômago, apareceram feridas na boca e mal conseguia me alimentar. A quimio também causa uma menopausa química, trazendo todos os efeitos que a falta dos hormônios femininos faz: interrompe o ciclo menstrual, traz secura vaginal, perda de libido, entre outros. É muito difícil lidar com tantas mudanças ao mesmo tempo. A minha grande sorte é ter um homem ao meu lado que me apoia, me protege e cuida de mim, se importando muito mais com o meu bem estar e desejando a minha cura.  

Apesar disso tudo, a fase mais dramática aconteceu na segunda fase do tratamento, com a vulnerabilidade da minha imunidade, fazendo com que ele se prolongasse para além do previsto. Em fevereiro, cinco meses depois do início do tratamento, tive uma ótima notícia: o câncer havia reduzido para 4 milímetros! Até a médica se surpreendeu com o resultado. Mas os efeitos me derrubavam mais a cada dia: eu sentia um cansaço imenso, emagreci 7 quilos, tive dores no corpo, comecei a apresentar uma alergia na pele que não me deixava dormir e me deixou muito estressada e uma angústia danada por ter que adiar tantas sessões de quimio. Meu físico e o meu psicológico já estavam esgotados mas, finalmente, a quimioterapia chegou ao fim no dia 14 de abril. Fiquei feliz também por ter acabado antes do aniversário do meu filho (20/4) pois, devido à pandemia, ele não pôde comemorar com seus amigos por 2 anos e, finalmente, nesse ano foi possível.

Resultado do tratamento

Apesar de tudo o que sofri, a quimioterapia teve um excelente resultado (aparentemente, já näo havia mais tumor no seio, o que foi confirmado após a biópsia realizada na cirurgia) e pude remover somente o quadrante superior da mama direita e, junto com o linfonodo atingido, foram retirados mais 4 para análise. Minha recuperação pós cirúrgica foi excelente, mas, no exame histológico, apareceram ainda algumas células tumorais em torno daquele linfonodo atingido e não dava pra saber até onde isso se estendia, embora os outros linfonodos estivessem livres. Tive que decidir entre remover todos os linfonodos e ter sequelas, sem saber se realmente essa remocäo era mesmo necessária ou näo (poderia ser um tiro de canhão numa formiga) ou fazer as 25 sessöes radioterapias diárias e mais a quimioterapia oral (Capecitabina), sendo que esta seria para eliminar qualquer célula maligna que estivesse no meu corpo. Optei pela quimio oral porque achei mais sensato, já que, mesmo removendo os linfonodos, eu não teria como saber se haviam células malignas circulando no meu corpo e me pouparia de ter sequelas indesejadas.

Iniciei a quimio oral em julho e a radioterapia uma semana depois. Pouco antes de terminar a radioterapia, estava sentindo muitas dores de cabeça e, como o meu tipo de câncer, quando dá metástase, tende a atingir cérebro e pulmões, tive que fazer uma ressonância de cabeça e, felizmente, está tudo em ordem. Terminei a radioterapia em agosto e minha pele sofreu muito pouco, só no final apresentei disfagia (dificuldade de engolir). Estou finalizando o 4° ciclo de quimio, de um total de 8 ciclos. Tomo a medicação por 14 dias e tenho pausa de 1 semana a cada ciclo. A previsão é de que eu termine a quimio oral em dezembro.

Prevenção importante

Faça o autoexame todos os meses. Verifique se há auteracäo de densidade da mama, presença de nódulos, alterações na forma da mama ou mamilo, liberacäo de líquido do mamilo sem apertar, enrugamento da pele (tipo casca de laranja), vermelhidäo no mamilo/mama e coceira frequente, inchaço e nódulos na axila, dor constante na mama, mamilo ou axila. Tudo isso são os sintomas mais comuns e que podem facilmente serem observados por nós mesmas durante o banho, deitada na cama ou na frente do espelho. Quanto mais você se acostumar a fazer a apalpação das mamas/mamilos/axilas e observar, mais fácil será para notar qualquer diferença em pouco tempo.

Se encontrar alguma alteração, não fique pensando ou tentando arrumar uma explicação para o seu achado. Ex: “deve ser leite empedrado”, “deve ser devido aos hormônios”, “não pode ser câncer, já que näo há ninguém na minha família que teve”, “se eu tivesse alguma coisa, minha médica teria notado no meu último exame” – essas foram as coisas que eu acreditei e, infelizmente, não fui procurar esclarecer com a minha médica e acabei perdendo a chance de, possivelmente, não deixar o câncer atingir meu linfonodo axilar.

E MAIS…

Observações que podem fazer toda a diferença

* Ao notar qualquer alteração, procure seu médico de confiança.

* Não tenha medo de fazer exames e encontrar alguma anormalidade. Lembre-se: “Quem procura acha e quem acha cura!”

* Quanto mais cedo o câncer é descoberto, menor a chance de metástase, melhor o prognóstico e maior a chance de cura. Portanto, não perca tempo!

* Existem fatores de pré-disposição para o câncer de mama, como genética, fatores hormonais, por exemplo. Mas é possível prevenir e aumentar as chances de cura e de recidiva através de um estilo de vida saudável:

  • Alimentacäo saudável (aumentam em 22% as chances de cura, enquanto a má alimentacäo aumenta o risco de mortalidade em 46%), pobre em gorduras, sal, açúcar, farinha branca, pouca carne vermelha e alimentos industrializados/ ultraprocessados, por exemplo;
  • Evitar o consumo de bebidas alcoólicas (aumentam em 21% o risco de recidivas);
  • Atividade física (cardio e de resistência muscular);
  • Cuidar da mente: controlar pensamentos, fazer exercícios de respiração, ter um propósito de vida, hobbies e um bom relacionamento familiar.