Quando se fala de filme de terror, é comum pensar em clássicos como “Pânico”, “A hora do pesadelo”, “Chuck” e outros. Mas quando pensamos em filmes de terror e psicologia, é normal relacionarmos a filmes de suspense psicológico, como “A ilha do medo” ou “Corra!”. Mas hoje iremos analisar o filme “Sexta-feira 13” sob a ótica da psicologia.
Ao falarmos de Sexta-feira 13, automaticamente lembramos de Jason, o assassino em série da franquia. Porém, o primeiro filme, lançado em 1980, tem como assassina Pamela Voorhees, a mãe de Jason. Mas o que aconteceu para a mãe do famoso assassino cometer esses crimes? Será que isso influenciou Jason a começar seus violentos assassinatos?
Para fins de contextualização, Pamela Voorhees é profundamente afetada pela morte de seu filho, Jason, que se afoga enquanto está no acampamento Crystal Lake (palco dos horrores acompanhados no filme). O trauma de perder um filho pode levar a uma série de reações psicológicas, incluindo raiva intensa, negação e um desejo de vingança. No entanto, a reação de Pamela pode ser vista como patológica, pois, em vez de passar pelo processo normal de luto, ela canaliza sua dor e frustração em comportamento agressivo e homicida, sendo um tipo de resposta extrema ao luto que reflete uma incapacidade de processar e aceitar a perda de forma saudável.
Fases
Pamela exemplifica o conceito de luto patológico, em que o luto não é resolvido de maneira saudável. Em vez de aceitar a perda de Jason e encontrar formas adaptativas de lidar com a dor, ela se apega a essa perda e a transforma em vingança. A psicologia do luto identifica várias fases, como negação, raiva, barganha, depressão e aceitação. Pamela parece permanecer presa na fase da raiva, sem passar para a aceitação.
Embora não seja diagnosticado nos filmes, a personagem apresenta sintomas que podem ser relacionados ao transtorno de estresse pós-traumático (TEPT), demonstrando hipervigilância e uma resposta extrema ao estresse, direcionando sua raiva e dor para um comportamento violento. O TEPT pode resultar em reações desproporcionais a eventos que são associados com o trauma original.
Quando Pamela aparece em tela, se revelando como assassina, observamos uma frase curiosa e repetida por ela, “mata ela, mãe”, como se estivesse sendo influenciada por uma força externa. Na psicologia, podemos compreender essa fala como uma quebra com a realidade, com respostas extremas ao trauma e luto causado pela morte de seu filho, que se afogou no lago Crystal Lake em 1957, quando tinha 11 anos. Desde então, Pamela vive em um luto, sem aceitar o acontecimento. O fato de o local voltar a abrir um acampamento pode ter servido de gatilho para que a mesma revivesse esse luto de forma extrema, canalizado na vingança.
Intensidade
Por sua intensidade, o luto pode ser associado a diversos sentimentos, como angústia, tristeza ou saudade, mas, na realidade, trata-se de um estado emocional que desperta esses sentimentos. O processo pode desencadear diversas respostas emocionais (culpa, raiva, ansiedade), cognitivas (descrença, confusão) e comportamentais (agitação, choro), que, algumas vezes, precisam ser tratadas com acompanhamento médico.
Quando já não é mais possível negar o fato da perda, inicia-se um estado de raiva, que pode se tornar patológica quando chega a um nível crônico. No caso do filme analisado, os acontecimentos levaram Pamela a reviver o luto alimentando um conjunto de emoções que são expressas de maneira irracional. Dependendo da sua personalidade, de suas experiências de vida e da capacidade de gerir emoções, a pessoa em luto pode sucumbir aos sentimentos ruins no meio do caminho ou chegar ao estágio de aceitação com naturalidade, o que não foi o caso da nossa personagem.
É possível que a pessoa em luto expresse a sua raiva por meio de atitudes autodestrutivas, como beber exageradamente, brigar com desconhecidos e destruir propriedade alheia. No caso de Pamela, a raiva foi expressa por meio da violência, ficando encalhada nessa fase e colapsando emocionalmente devido à perda.
Terapia
Como precisa administrar muitas emoções ao mesmo tempo, a pessoa enlutada pode se sentir sobrecarregada, podendo levar anos para ser capaz de processar a perda. Nesse caso, é indicada a terapia. O psicólogo tem o papel de ajudar o indivíduo enlutado a navegar pelas fases do luto. Ele o orienta a fazer uso de suas capacidades internas para, enfim, chegar ao ponto da aceitação da perda. A partir de então, o paciente consegue traçar novos planos e objetivos para a sua vida.
Sendo assim, a terapia é uma ferramenta eficaz para aliviar a vivência do luto. Entre as abordagens para esses casos, poderíamos pensar na terapia de aceitação e compromisso (ACT), em que a pessoa trabalha a aceitação de sua situação, se alinhe com seus valores e consiga viver uma vida mais significativa apesar do luto e da tristeza. Porém, em casos extremos, como o de “Sexta-feira 13”, poderíamos usar a terapia comportamental dialética (DBT), que ajuda pacientes com transtornos severos a lidarem com os seus sintomas e sua desregulação emocional. O objetivo da DBT é que o indivíduo aprenda a regular sua emotividade e seus impulsos e a confiar e validar as suas próprias experiências.
O luto é um processo doloroso e lento que pode ser caracterizado por tristeza profunda, afastamento de atividades e perda de interesse no mundo externo. A psicoterapia pode ajudar o paciente a superar a perda de uma pessoa querida, a readaptar-se à vida normal e a voltar a sentir vontade de realizar atividades gratificantes. Quer saber mais sobre como trabalhar o luto e usar a DBT em casos de trauma? Confira estes livros da Sinopsys (e aproveite que eles têm o primeiro capítulo disponível gratuito no site): Tratando trauma com a terapia comportamental dialética: protocolo de exposição prolongada em DBT e Educação para a morte: quebrando paradigmas.