Ei, estudante! Você já pensou em como nasce um vilão? O que aconteceu na vida dele? Acredito que não há filme melhor para exemplificar esse pensamento do que ‘Malévola’, interpretada pela atriz Angelina Jolie. Para quem não conhece, é a icônica vilã do clássico ‘A bela adormecida’, da Disney, que ganhou um filme próprio para contar sua história. Durante 1 hora e 40 minutos, o público acompanha a trajetória da fada mais poderosa, protetora de Moors.
Mesmo sabendo que seu reino era cobiçado pelos humanos, Malévola constrói uma amizade com Stefan, um humano com muitas ambições para tão pouca idade. Embora sejam de mundos diferentes, se apaixonam. Geralmente as histórias terminam assim, com beijos de amor verdadeiro e finais felizes, mas isso é só um dos aspectos que tornam a história tão diferente de outros clássicos da Disney, pois esse é só o começo.
Em uma guerra entre o mundo dos humanos e o mundo das fadas, o rei Henry (do mundo dos humanos) fica ferido após enfrentar Malévola e inicia uma “caça às fadas”, oferecendo a coroa real a quem a matasse.
Stefan, que havia sido um menino ambicioso, se torna um homem que busca riqueza e poder. Tentado pela oferta, se reaproxima da fada e, sob pretexto de amizade e ajuda, faz Malévola adormecer com um sonífero. Sem conseguir fazer o que o rei pedia, Stefan decide cortar as asas da fada, mentindo ao rei que havia acabado com a “ameaça” e garantindo sua coroa.
Motivada por vingança e com o objetivo de proteger seu reino, Malévola cruelmente coloca uma maldição na filha recém-nascida do rei dos humanos (que, na ocasião, era Stefan), Aurora. Malévola, no entanto, se vê cativada pela pequena princesa, com sua bondade e alegria, o que a leva a se arrepender da maldição, bem como a buscar maneiras de anulá-la.
Borderline
Mas qual a ligação dessa personagem com a psicologia? Em especial, com a terapia comportamental dialética, mais conhecida como DBT?
A DBT, foi desenvolvida no final dos anos 1980 por Marsha Linehan para trabalhar com pacientes cronicamente suicidas e para tratamento do transtorno da personalidade borderline. Posteriormente, a abordagem passou a ser adaptada e utilizada em pacientes com transtornos mais “leves”, por ser uma terapia integrativa mais guiada por princípios do que protocolos, enfatizando o processo de diálogo aberto, sendo flexível e adaptável às necessidades de cada paciente.
A DBT tem como meta ajudar pessoas a construírem vidas valiosas, que se justifiquem viver, buscando o equilíbrio entre mudança – aceitação – dialética. Por isso, essa é a abordagem relacionada à personagem Malévola, já que sempre se teve em mente a ideia de que as estratégias de mudança poderiam ter resultados desde que fossem toleradas pelos indivíduos – bem como Malévola tolerou Aurora, que foi a responsável por sua grande mudança – e acrescentando, aos poucos, intervenções de aceitação, compaixão e regulação emocional que tornavam mais fácil o foco da terapia à mudança.
Dialética
A dialética é um dos pilares da DBT, que traz contribuições como a compreensão da realidade e que essa é um produto da influência do indivíduo (biológico e afetivo) e do meio social (família, cultura, ambiente). Podemos compreender Malévola como um indivíduo resultante das situações que lhe ocorreram e do ambiente em que se encontra.
Outro pressuposto da abordagem é que a essa realidade é composta por opostos que existem ao mesmo tempo e levam a tensões (tese e antítese), que resultam em novas possibilidades (síntese) e mudanças.
Malévola foi escolhida, pois temos uma visão clara desses opostos coexistindo nela, entre sua bondade e maldade, vilã e fada-madrinha, e é compreensível que sua transformação esteja na síntese desses opostos.
Mudança
A DBT tem como um dos focos a mudança. No caso dessa personagem, teríamos a mudança de padrões de comportamento desadaptativos, reconectando-a com seus valores, trazendo a sensação de bem-estar, a mudança teria que ocorrer nos comportamentos de ameaça e vingança, em que, por meio da dialética, reconheceria a intenção e função deles.
Na terapia, a DBT ajudaria a personagem na aceitação de sua realidade, pois, tristemente, Malévola perdeu suas asas e foi traída, sendo uma realidade de difícil aceitação que a leva a comportamentos desadaptativos como forma de alívio ou evitação da experiência emocional causada.
Para a mudança ocorrer, precisaria ser trabalhada a aceitação de sua situação, se conectando ao sofrimento e realidade, mas voltando aos seus valores, além de trabalhar com a desregulação e vulnerabilidade emocional experenciada pela personagem ao perder suas asas para alguém que confiava, bem como as emoções secundárias como a raiva.
Apesar de sentir uma tristeza avassaladora, foi a raiva que deu significado à experiência, levando nossa personagem a ser vingativa, buscando ferir aquele que a feriu. Aqui podemos ver como o ambiente influencia. Nesse caso, os fatores externos que afetaram emocionalmente Malévola, em que contexto e trauma resultaram em uma vilã.