Consolidar uma empresa adquirindo clientes, aumentando seu faturamento e, ao mesmo tempo, dando conta da satisfação dos funcionários e demais parceiros certamente não é tarefa fácil. Para auxiliar empreendedores e profissionais, o empresário e palestrante paulista André Girotto, treinador de líderes, compartilha o conhecimento que acumula desde 2002 em seu livro intitulado “Framework da liderança 10X: a nova era da liderança”. Na obra, compartilha alguns dos segredos que impulsionam a motivação humana em método prático, objetivo e 100% aplicável.

Conforme o autor, embora o livro se baseie principalmente na experiência de líderes de grandes corporações, que representam a maior parte de seus clientes e de sua experiência, ele realmente foi escrito para melhorar a vida de todas as pessoas envolvidas no processo. “Meu objetivo é fornecer um contexto para uma vida significativa na qual o trabalho é parte fundamental, não apenas uma busca por recompensas financeiras”, ressalta. Inclusive um dos capítulos fala sobre a felicidade no trabalho.

André é graduado em educação física e, aos 18 anos, fundou a Sport Moving, uma academia que, em pouco tempo, se tornou uma rede de seis unidades e mais de 5 mil alunos. Com habilidades em liderança, aos 24 anos, tornou-se o treinador mais jovem certificado pela Dale Carnegie Training International. Aos 25, fundou a Netprofit Training, hoje uma das maiores empresas de formação de líderes no Brasil.

Por que você afirma que todo negócio gira em torno da felicidade?

Para muitos filósofos, o propósito da vida é ser feliz, e buscamos isso constantemente. Se algo me faz feliz, procuro mais daquilo; se algo não me deixa feliz, tento me afastar. Quando não podemos escolher, corremos o risco de viver uma vida infeliz. E eu pergunto: valeria a pena viver uma vida que não lhe faz feliz? Ter um trabalho que não lhe satisfaz? Conviver com pessoas que não lhe trazem alegria? Fazer coisas que não lhe dão prazer?

Imagine agora essa situação no trabalho, onde se passa normalmente oito, nove horas. Será que pessoas infelizes estariam realmente dispostas a fazerem o seu melhor? Dispostas a se engajarem verdadeiramente? Será que teríamos um ambiente propício para a criatividade, a inovação e a colaboração? Pois é. Pode parecer duro, impiedoso, mas milhares de pessoas vivem assim e não fazem a menor ideia de como mudar isso. Muitas já aceitaram, enquanto outras relutam em aceitar essa situação.

É possível mudar esse cenário? Como?

Sim, é possível mudar esse cenário na maioria das vezes. Embora também treinemos líderes para que gerem lucro e adotem práticas diversas que os levem a obter resultados exponenciais por meio da inovação, isso não é tudo. Existem outras responsabilidades que sua nova liderança deve assumir se quiser virar o jogo. Os líderes que buscam obter resultados acima do normal devem contribuir para a autoestima, o bem-estar e, se possível, para o aumento da felicidade relacionada a realizações, conquistas e crescimento de seu time.

Embora esses objetivos possam parecer ambiciosos demais e, por vezes, fora do âmbito das preocupações empresariais tradicionais, a forma como ganhamos a vida, nossos cargos e a maneira como recompensamos o trabalho desempenham um papel crucial em moldar nossos sentimentos e nosso estado de espírito. Eles podem torná-los empolgantes e gratificantes ou trazer ansiedade e medo. Portanto, é incumbência de um líder considerar essas questões caso queira obter resultados diferentes.

Fale sobre a felicidade como uma estratégia para performance.

O mercado e as empresas têm, cada vez mais, valorizado a questão da felicidade como estratégia de negócio. É claro que sempre haverá executivos obstinadamente ambiciosos, individualistas e preocupados apenas em chegar ao topo. Mas será que tal comportamento é realmente o tipo de liderança que desejamos em nossa vida e que queremos ser para os outros?

Recentemente, um grupo de gurus e pseudolíderes emergiu nas redes sociais, prometendo tornar nossas vidas mais prósperas, confortáveis e emocionantes, criando uma falsa sensação do que é felicidade. Não há como negar que esse cenário é atrativo, principalmente para uma legião desesperada e com problemas homéricos de autoestima – um mal que sempre assolou a humanidade, e existem oportunistas que sabem utilizar as fraquezas dos outros a seu favor e acabam enriquecendo às custas desse desespero. Esses oportunistas expõem “riquezas e luxos” nas redes sociais, criando uma ilusão de vida hollywoodiana.

Mas por que tudo isso? A razão é que ainda há uma confusão e uma relação complexa entre riqueza e felicidade, agravada por uma nova epidemia de falta de autoestima generalizada. Essa falta de autoestima é caracterizada por uma visão negativa de si mesmo, baixa autoconfiança e autovalorização, e seus motivos podem incluir insegurança, comparação constante com os outros e medo do fracasso, sendo também um fator de risco para depressão e ansiedade.

A baixa autoestima afeta os relacionamentos e o bem-estar emocional das pessoas, o que torna muito importante que aqueles que sofrem dessa condição busquem apoio no sentido de desenvolverem uma visão mais positiva de si mesmos. Relacionar felicidade à riqueza não é o caminho. Não estou dizendo que é ruim ter riqueza. Apenas enfatizo que é fundamental distinguir entre riqueza e felicidade, tendo cada uma seu lugar e significado na vida. Porém, apenas relacionar felicidade à riqueza, não é o caminho.

Há dados que comprovam isso?

Quando analisamos essa felicidade com base em fontes matemáticas comparativas, percebemos que, em países onde há muita desigualdade social, esse índice de felicidade é menor em comparação com países onde o padrão de vida é mais equilibrado, independentemente de serem ricos ou pobres. Ou seja, quanto mais desigual, menor a felicidade.

Em 2016, a agência britânica New Economics Foundation fez um estudo que calculava o grau de “felicidade” de 140 nações. Chamado de Happy Planet Index, o estudo trouxe resultados surpreendentes, pois muitos dos países mais bem classificados estão fora do grupo dos mais ricos do mundo em termos econômicos e também não representam grandes potências políticas.

De acordo com esse estudo, um dos líderes em termos de felicidade global é o Vietnã. Ao pensarmos nesse país, é difícil que a primeira coisa que venha à mente não seja a terrível guerra que o devastou entre as décadas de 1950 e 1970. No entanto, o Vietnã soube se recuperar – apesar das consequências e memórias da guerra – e hoje é um país alegre e cheio de atrativos, sendo classificado como o quinto país mais “feliz” do mundo.

Ao que então está relacionada a felicidade autêntica?

Felicidade autêntica está relacionada a outros fatores. Desde 2012, a Organização das Nações Unidas (ONU), juntamente com a Sustainable Development Solutions Network e o Gallup World Poll, publica anualmente o World Happiness Report (relatório anual de felicidade). A Finlândia tem sido a primeira colocada na lista desde 2018 como país mais feliz do mundo. Contudo, isso não se deve à sua economia, mas, sim, à confiança da população nos sistemas nacionais e ao equilíbrio entre vida profissional e pessoal. Com esses exemplos, quero destacar que a chamada “felicidade autêntica” está relacionada a muitos outros fatores além da posse de uma condição financeira confortável e estável. Então, se a sua única preocupação for obter lucro e ascensão social e você acredita que sua equipe e as pessoas à sua volta também busquem somente isso, tudo bem. Deixo claro apenas que esse não é o caminho exato para a felicidade.

Qual é o caminho para alcançá-la?

Líderes devem saber mais do que gerenciar pessoas e processos; precisam ser agentes de mudança, provocando transformação nas pessoas e nos ambientes onde estiverem. Isso vai muito além de processos gerenciais. Muitos filósofos, ao longo do tempo, afirmaram que a felicidade é o objetivo último da nossa existência. Em “Ética a Nicômaco”, Aristóteles a chamou de o “bem supremo” – embora desejemos outros bens, como dinheiro ou poder, porque acreditamos que eles nos farão felizes, queremos a felicidade pelo que ela é em si mesma.

No entanto, mesmo com séculos de debate, as questões sobre o que a felicidade realmente é, e se ela de fato existe, ainda não foram resolvidas. Talvez seja simplesmente o nome que damos a um estado inatingível, no qual nada mais resta a ser desejado. A um momento que vale por ele mesmo. Um momento que vale a pena ser vivido. Embora um estado de felicidade perfeita possa ser uma ilusão, todos reconhecemos que estamos relativamente mais satisfeitos, contentes e alegres em alguns momentos em comparação a outros.

A questão é: o que realmente nos leva à felicidade? Os pensadores do passado perceberam há muito tempo que não há um único caminho para ela. O que traz alegria a uma pessoa pode deixar outra indiferente. Também os psicólogos reuniram coragem para abordar esse antigo e desconcertante enigma, obtendo alguns resultados inesperados.

Por exemplo, contrariamente à sabedoria comum, dinheiro e bens materiais não parecem aumentar a felicidade acima de um limite mínimo. Em outras palavras, se você é muito pobre, ter mais dinheiro o torna mais feliz; se, por outro lado, você já está razoavelmente “bem”, dinheiro adicional não parece trazer nenhuma felicidade adicional.

Outros estudos revelam que pessoas que passam por tragédias, como ficar cegas ou paralisadas, sentem-se terríveis por alguns meses, mas recuperam seu nível usual de felicidade logo depois. O oposto é verdadeiro para aqueles que encontram riqueza inesperada: os vencedores da Mega-Sena são mais felizes por alguns meses, depois voltam ao seu estado anterior, ou até mesmo ficam abaixo dele.

Relacionamentos sólidos, como um casamento estável e amigos próximos, também estão correlacionados com a felicidade, assim como fazer parte de uma comunidade. Ter um temperamento extrovertido e otimista também ajuda.

Fale sobre a relação felicidade e potencialidade.

Todos nós nascemos com um conjunto de aptidões, a maioria das quais sequer temos consciência de possuir. Para alguns, o mais alto nível de felicidade é a capacidade de expressar toda a nossa potencialidade. É como se a evolução tivesse construído um dispositivo de segurança em nosso sistema nervoso que nos permite experimentar plena felicidade apenas quando estamos vivendo a 100% – quando estamos usando totalmente o equipamento físico e mental que nos foi dado.

Esse mecanismo garantiria que, depois que todas as nossas outras necessidades básicas fossem atendidas, buscaríamos usar o conjunto completo de nossos talentos, tornando assim possível não apenas entregar o desempenho esperado, mas também inovar e crescer além dos “limites” criados.

Nesse sentido, ter um emprego que você goste e no qual possa evoluir pode ser umas das coisas mais cruciais quando o assunto é felicidade. Além disso, passamos mais da metade da nossa vida útil trabalhando. Na verdade, se considerarmos o tempo diário de oito horas de sono, mais oito horas de trabalho e descontarmos do tempo restante o que gastamos com higiene pessoal, nos alimentando e no transporte, sobram apenas algumas poucas horas para ficarmos com a família e os amigos, ou para nos dedicarmos a outras formas de lazer, por exemplo. Portanto, pode-se dizer que o trabalho representaria mais de 70% do tempo útil disponível diariamente. Por isso, ele também é tão representativo na conta.

Como conectar felicidade ao trabalho sem perder de vista os resultados corporativos?

Pode parecer contraditório dizer que felicidade e trabalho têm alguma relação, já que, para a maioria das pessoas, o emprego é, na melhor das hipóteses, um “mal necessário” e, na pior, um fardo. No entanto, os dois estão inegavelmente ligados. Lembremos as primeiras negociações comerciais, em que as comunidades trocavam entre si o excedente de sua produção por algo que necessitavam. Pode-se dizer que esse tipo de negociação existia para melhorar a vida e subsistência das pessoas.

Embora essa ideia pareça um pouco esquecida entre tantas operações financeiras, o fato é que a produção e a troca de bens só fazem sentido se entendermos que elas melhorarão a qualidade da nossa vida. Essa lógica está por trás do desejo dos consumidores quando procuram por produtos e serviços: os clientes estão dispostos a pagar por eles quando acreditam que os tornarão felizes. Simples assim. Portanto, se uma empresa souber fazer seus clientes se sentirem mais contentes com seus produtos ou serviços, será mais bem-sucedida.

Acontece que só é possível prestar um bom serviço ou oferecer um bom produto se o ambiente de trabalho refletir esse bem-estar. Portanto, um negócio só continuará bem-sucedido se contribuir para a felicidade dos clientes internos, seus funcionários e colaboradores. Para tanto, é preciso que as pessoas tenham uma sensação de pertencimento, o que elevará a autoestima e até mesmo proporcionará uma sensação de autorrealização. E este será o papel de um bom líder. Estimular a participação e conexão das pessoas com o meio e permitir que a autoestima delas seja elevada é algo que pode ser feito com qualquer um. Não importa posição, função, formação, tamanho ou segmento da empresa.

O equilíbrio entre desafio e competências, alinhado a um propósito e um ambiente que proporcione segurança, autonomia e colaboração, cria aspectos vitais de conexão do ser humano com o meio. Essa conexão faz com que nosso potencial seja de certa forma liberado com mais intensidade. Com isso, passamos a ter um ambiente muito mais criativo, inovador e propício a mudanças e resultados acima do normal. Ao somar todos esses elementos, temos uma sensação de plenitude, de conexão presente, que alguns estudiosos chamam de fluxo (flow, em inglês). Proporcionar isso para as pessoas também é papel de um líder.