Há 6 anos, participei de uma das primeiras formações em Professional mentoring que ocorria no Brasil. Naquele momento ainda era muito confusa a atuação da mentoria. Os benefícios que ela poderia trazer também não eram claros, em especial para as organizações. Entretanto, passados estes anos, ainda se faz necessários alguns esclarecimentos.
Segundo Erlich, “Mentoring (ou mentoria) é um processo que acontece em relacionamentos interpessoais. É uma parceria em que uma pessoa que tem determinados conhecimentos e experiências utiliza voluntariamente essa bagagem para estimular o desenvolvimento de outra pessoa. Esse desenvolvimento pode ocorrer em diversas dimensões: aumentando o domínio sobre uma determinada área de conhecimento, oferecendo suporte emocional para pensar e agir ou socializando a pessoa em um meio em que ela precisa atuar. Quem promove esse desenvolvimento é chamado de mentor. Quem recebe essa ajuda do mentor é chamado de mentorado.” (ERLICH, 2014b)
Processo Histórico
Percebemos, no decorrer da história da humanidade, que sempre houve pessoas que de forma dedicada e instrutiva, tinham a incumbência de desenvolver outra pessoa aproveitando sua própria experiência, sua biografia. Essas ações ficam evidenciadas, por exemplo, nas grandes escolas de Filosofia e Ciências de Atenas. Poderosos políticos e comandantes colocavam seus filhos para serem orientados pelos grandes pensadores de sua época: Platão e Aristóteles. Nos grandes centros romanos de luta, os pais ou senhores colocavam seus filhos ou servos para se tornarem grandes lutadores, sendo acompanhados pelos melhores. Nos mosteiros da Idade Média, os monges eram catequizados por outros monges que outrora haviam realizado grandes feitos e continuavam tendo sua opinião respeitada e levada a sério. Por fim, percebemos, no processo histórico das sociedades, que sempre houve pessoas mais experientes que ensinaram e conduziram os mais jovens a seguir caminhos que foram proveitosos e até mesmo os impediram de seguir certos caminhos que não gerariam resultados efetivos. Então, o processo de mentoring é muito mais antigo do que imaginamos, mas se reflete perfeitamente na pós-modernidade. Em nossos dias precisamos cada vez mais recuperar esta prática que foi revolucionária em todos os tempos.
Tipos de Mentoring
A mentoria pode acontecer dentro de diversos modelos que atendem características específicas. São elas:
Mentoring Informal: acontece de maneira espontânea, proporcionado por pessoas que têm o desejo nato de ajudar o outro a superar suas dificuldades, a se adaptar ou a investir no crescimento pessoal e profissional. Pense por exemplo em alguém que foi extremamente importante em sua vida, que ajudou você de uma maneira tão incrível que não haveria dinheiro que cobrisse essa ajuda, que se dedicou a fazer você uma pessoa melhor, um profissional melhor, que depositou expectativas em suas capacidades mesmo quando você estava descrente, que lhe apresentou alternativas cruciais para sua vida, que mesmo distante foram importantes para você.
Mentoring Formal: acontece de maneira planejada, estruturada. É aplicado em organizações (das mais variadas). A organização elege pessoas de referência que voluntariamente se disponibilizam a ajudar o outro no intuito de fazer com que este desenvolva habilidades e comportamentos que foram ou são essenciais para que o mentor tenha tido sucesso e atingir objetivos seus e da organização. Realiza-se uma triagem de candidatos e alinha-se o perfil do mentor com os dos colaboradores que precisam desta ferramenta de desenvolvimento. A intenção é, com a ajuda do mentor, o mentorado atingir o resultado que deseja. A diferença entre o resultado atual e um resultado desejado é chamada de meta. É necessário, no processo de mentoring formal, existirem metas claras e realistas a serem atingidas pelo mentorado. Para tanto sugiro adotar a seguinte orientação (baseada em FALCONI, 2011)
PLANEJADO: listar as metas propostas no plano de desenvolvimento do mentorado.
EXECUTADO: o mentorado relata o que foi feito em relação a cada meta listada. Nem sempre o executado sai como foi planejado
RESULTADO: apresentar uma evidencia indicando se a meta foi atingida ou não. Se a meta for atingida, ótimo! O mentor dá um feedback positivo e acalorado ao mentorado. Se não, é necessário fazer uma análise para saber por que a meta não foi alcançada.
PONTOS PROBLEMÁTICOS: é necessário listar o resultado da análise conduzida, mostrando as causas do não atingimento da meta. A partir daí se ajusta o plano de desenvolvimento do mentorado, para uma nova tentativa de alcançar a meta.
É importante criar um controle para mensurar o andamento do mentorado em relação às metas estabelecidas. Só se gerencia aquilo que é medido. Só se percebe a evolução do individuo quando se realiza uma comparação entre o que estava em evidência no passado e o que é apresentado na atualidade. Além de ser de extrema utilidade para o mentor e mentorado, é muito importante para o setor de gestão de pessoas ter esses dados para cada vez mais promover e incentivar a prática do mentoring na organização.
Diferenças entre coaching e mentoring
Erlich (2014a) sugere que a diferença entre mentoring e coaching seja observada com base nas funções de mentoring. A seguir, uma síntese da abordagem oferecida por ele.
Das funções de trabalho e carreira, no processo de coaching só teremos a Orientação. As demais não são encontradas. Aplicando uma porcentagem dividida de maneira igualitária as quatro funções teremos: 75% de ações exclusivamente usadas no mentoring e apenas 25% usadas no coaching (mas que também é usado no mentoring, como evidencia a tabela).
FUNÇÕES DE TRABALHO E CARREIRA | ||
MENTORING | COACHING | |
ORIENTAÇÃO | ok | ok |
PROTEÇÃO | ok | x |
EXPOSIÇÃO-E-VISIBILIDADE | ok | x |
PATROCÍNIO | ok | x |
Em relação à função Escuta-e-Aconselhamento, vemos presente no processo de coaching mais fortemente a escuta. No caso do aconselhamento, é muito remota a possibilidade de isso acontecer. Por esse motivo, dividimos os 25% que corresponde à função em dois. Logo, usando a mesma forma de contabilizar essa porcentagem, temos 37% de funções de mentoring que são usadas no coaching e 63% de funções exclusivamente usadas em mentoring.
FUNÇÕES SOCIOEMOCIONAIS | ||
MENTORING | COACHING | |
ACEITAÇÃO | ok | ok |
ESCUTA-E-ACONSELHAMENTO | ok | ok |
CONFIRMAÇÃO | ok | x |
ABERTURA PARA O RELACIONAMENTO | ok | x |
As distinções baseadas nas características do mentoring em comparação ao coaching são percebidas em várias situações e de várias maneiras. Por exemplo, o mentor não possui necessariamente uma formação em coaching, logo as ferramentas usadas por este em seus processos não são aplicadas no mentoring; o mentor é alguém interno, com vivencia na cultura da empresa, o coach é na esmagadora maioria das vezes um profissional externo; o mentor é voluntário, o mentor aconselha, no caso do coach aconselhamento é raro e por vezes não existe; a abertura para o relacionamento, proteção, patrocínio não existe no processo de coaching e muito menos um investimento pessoal o qual chamamos de patrocínio, e várias outras diferenças são encontradas. O importante é saber a atuação de cada ferramenta para esperar dele o retorno cabível e necessário.
Tanto o coaching como o mentoring são ferramentas poderosíssimas no desenvolvimento de pessoas. Cada uma, com suas particularidades teóricas e práticas e se usada de maneira coerente, será uma alavanca de desenvolvimento dos profissionais que desejam recebê-la e também de quem deseja aplicá-la.