Em meio à pandemia gerada pelo coronavírus, estamos vivendo em isolamento forçado e sob várias restrições de contatos pessoais e sociais. Nossa vida mudou. Muitos dos nossos hábitos estão suspensos pela impossibilidade de realizá-los, ficamos limitados e perdidos dentro do que é seguro fazer. A ameaça invisível pode estar em qualquer toque corporal, em qualquer superfície e em todos os lugares. Estas situações têm desencadeado alguns transtornos psicoemocionais e orgânicos.

A Psicossomática correlaciona emoções e sentimentos existentes, acumulados e não resolvidos, com patologias orgânicas correspondentes a essa energia psíquica. Isto é, por meio de observações e estudos que incluem desde os filósofos a.C., até as pesquisas médicas e psicológicas atuais, demonstram a existência do que chamamos Correlação Psicossomática, que estabelece e padroniza a relação entre o adoecer específico de um órgão, função ou sistema orgânico com a existência de específicas emoções e sentimentos que afetam estes órgão correspondente. Exemplo: o medo constante e não assumido gera problemas nos rins da pessoa.

Dupla restrição

Em meio à insegurança vivenciada pela pandemia, alguns transtornos psicossociais estão sendo identificados de forma mais frequente na população, gerando outras dificuldades que esses transtornos causam. Com isso, a pessoa sofre duplamente, a restrição pelo coronavírus e sua própria restrição, causada pela característica do transtorno desenvolvido.

Isto ocorre no Transtorno Obsessivo Compulsivo (TOC), caracterizado pela pessoa apresentar pensamentos recorrentes, intensos e excessivos (obsessão) e comportamentos repetitivos sequenciais, mesmo que tenha acabado de executá-lo (compulsão). Nessa situação atual que vivemos devido a Covid-19, onde se orienta a higienização de tudo, com álcool gel ou mesmo com água e sabão, passamos a realizar rituais que não fazem parte do nosso dia-a-dia. Embalagens, pacotes, frutas, legumes e outros são cuidadosamente lavados antes de serem armazenados. O hábito de lavar as mãos dezenas de vezes ao dia passou a ser recomendado. Esta condição de prevenção ampliou as pessoas com TOC e agravou quem já possuía o transtorno, ao ponto de passarem o dia lavando várias vezes os mesmos produtos, pois tem a impressão, ou certeza, que não lavaram bem. Não conseguem fazer mais nada durante o dia, só ficam neste ritual. Essa pandemia desenvolveu alguns excessos neste sentido, configurando o TOC. Se a pessoa não consegue realizar a compulsão, entra em ansiedade e angústia, apresenta tremores, enxaqueca, falta de ar e não consegue fazer mais nada, só pensando (obsessão) que não conseguiu realizar a tarefa desejada perfeitamente.

Este transtorno é muito amplo no sentido de atuação obsessiva compulsiva, o espectro vai de compras a comida, de exercícios físicos a jogos de azar, de uso de computador a ter que usar determinada cor de roupa.  Michael Douglas, por exemplo, assumiu ser compulsivo sexual, grande motivo do seu divórcio, pois tinha várias amantes para suprir sua compulsão.

Danos à saúde evidentes

A pandemia trouxe à tona a análise profunda de outra síndrome que gera grande desconforto: o transtorno hipocondríaco. O medo da finitude e a tentativa fantasiosa de controlar a vida/morte estão na base deste transtorno. Ele traz a característica da pessoa desenvolver um certo pânico pela doença, principalmente em períodos de ameaça (real ou não). Crises ocorrem na maioria das vezes sem nenhum dado de realidade ameaçadora. Ela é perigosa, pois a pessoa se automedica com o objetivo de não desenvolver doenças. Não há indicação médica dos medicamentos usados, querem tomar o máximo de remédios possíveis para se sentirem protegidos. A quantidade de medicação ingerida em um dia pode chegar a dezenas de cápsulas. Geralmente, a pessoa toma doses maiores que as indicadas nas bulas. Tendem a estudar muito bem essas bulas e tornam-se peritos em indicar remédios para as pessoas. Vão passear na farmácia para ver as novidades medicamentosas e compram para experimentar.

No cenário da Psicossomática, os danos à saúde são evidentes, pois sobrecarregam o fígado e os rins. Provocam patologias no estômago, intestino e coração. O sistema endócrino passa a apresentar alterações, já que o uso de medicamentos desnecessários desregula o funcionamento adequado de todo o organismo.

Um exemplo clássico deste transtorno foi Elvis Presley, cuja morte foi atribuída à intoxicação medicamentosa devido ao transtorno hipocondríaco. Foi encontrado em seu armário de medicamentos uma tabela de que hora tomar cada um deles. Eram mais de 40 tipos de remédios.

A Psicossomática entende o indivíduo como um todo, portanto as doenças físicas possuem uma relação com nossos aspectos psicossociais e com tudo que vivemos, imaginamos, interpretamos e associamos. Com nossas conquistas e frustrações, medos e ousadias. Com nossos afetos e desafetos, enfim, com tudo que somos.

E MAIS…

Entre o perigo imaginário e o desconforto real

Em relação a sofrimento que se pode desenvolver, nada chega perto do que o transtorno de pânico pode gerar, pois a crise ocorre de forma abrupta, intensa e surge à sensação de pavor, como se estivesse ocorrendo fisicamente algo letal. A impressão é morte eminente, com taquicardia, tremores, sufocamento, sudorese e a “certeza” que está acontecendo um AVC, infarto cardíaco ou até mesmo ficando louco. É tão intenso que a pessoa pode desmaiar e apresentar náuseas ou vômitos. A paralisação, como um estado de torpor é frequente, como também sentir todo corpo “formigando” e perder o controle dos movimentos. No pânico, os transtornos físicos (somatizações) são mais intensos e evidentes.

Na realidade, o perigo é imaginário, mas o desconforto é grande, gerando desespero.