Cachorros, gatos, passarinhos, aves, peixes, tartarugas, hamister, coelhos, porquinhos-da-índia… enfim, são tantas as opções de animais domésticos para as crianças, e eles querem “tudo”, querem transformar a casa em um “jardim zoológico”, não é mesmo?
Mas, é claro, só para a “diversão”: o brincar, passear (se não estiver chovendo, nem frio), sem muito (ou nenhum!) compromisso com banhos, higiene (limpar o cocô do cachorro??? nem pensar!!!), despesas com veterinários e vacinas, preocupar-se quando ficam doentes, como cuidar de fêmeas ‘prenhas’ ou parturientes e seus filhotes, e nem cogitam a ideia de que o animal pode morrer…
Animais aliviam o estresse
Pesquisadores são unânimes em afirmar que animais de estimação aliviam o estresse, são ótimas companhias, distraem e ajudam as crianças: bebês melhoram a coordenação motora ao acariciar os animais, além do treino do engatinhar e andar ao tentar caminhar (e até correr!) junto com o animal. A diversão proporcionada pelo animal fortalece inclusive o sistema imunológico, além de facilitar a liberação de neurotransmissores responsáveis pela sensação de prazer e bem-estar (dopamina, serotonina e endorfinas), com maior tendência a sorrir. Crianças mais velhas se beneficiam da companhia, das brincadeiras, e da afeição incondicional que o animal lhe proporciona. O bichinho está sempre por perto, mesmo quando a criança está triste ou mal-humorada. Além disso, por vezes a criança pode exercer a “autoridade” sobre o animal, “dando ordens” a ele para elaborar o mundo das obrigações e exigências que os adultos lhe proporcionam. Pode também assumir pequenas responsabilidades, com a alimentação, e respeito aos limites (ex.: não pode puxar o rabo do cachorro), se os pais permitirem esse espaço, justamente atribuindo-lhe tarefas nos cuidados com o animal para a criança realizar.
E também os animais são uma fonte de aprendizado acerca das frustrações, na medida em que o animal tem vontade própria, não precisa ceder às vontades da criança o tempo todo (nem sempre o cachorro obedece quando se fala: “Senta!”, ou o gato se aproxima quando se manda: “Vem aqui!”). Animais como cães e gatos, que interagem mais com as pessoas, se tornam ótimas companhias para crianças solitárias (filhos únicos, filho “temporão” em relação a irmãos muito mais velhos, ou em casos de separação ou morte dos pais – inclusive porque os animais são frequentemente fonte de apoio emocional para as crianças, diante das crises familiares). Também aprende a decifrar gestos, atitudes, expressões faciais e comunicação não-verbal, além da empatia (perceber se o animal está feliz ou sofrendo – ex.: cachorro abana o rabo quando está feliz, mas gato abana o rabo quando está nervoso), ajuda-a a compreender os fatos fundamentais da vida (nascimento, crescimento, reprodução, doença e morte), respeito pelo animal enquanto ser vivo, e consciência ecológica (não sujar as ruas com as fezes do animal, preservar o meio ambiente onde aquele animal vive – e, por extensão, toda a natureza onde vivem todos os animais).
Perigos na convivência
Em termos fisiológicos, quando a pessoa interage com o animal, falando com ele, acariciando-o ou manuseando-o, há diminuição da frequência cardíaca e pressão arterial, atingindo esta última. valores menores que os observados em pessoas na situação de repouso (VACCARI e ALMEIDA, 2007).
Mas, nem tudo é só “diversão”: é preciso atenção para alguns riscos e perigos que a convivência entre crianças e animais pode trazer:
- Contaminação de doenças transmissíveis: algumas bactérias e vírus, inclusive o da raiva, podem trazer sérias consequências às crianças;
- Ataques de animais: mordidas de cães e ratos, arranhados de gatos, bicadas de aves, podem ferir gravemente a criança (ou até matar, em casos daquelas raças de cachorros violentos e agressivos), ou atingi-la em regiões importantes do corpo (ex.: os olhos);
- Ou, ao contrário, a criança pode agredir o animal a ponto de feri-lo (ou matá-lo), e o animal pode fugir de casa ou atacar a criança para se defender;
- Muitos animais no mesmo espaço, ou animais diferentes podem competir pelo espaço, atacar-se mutuamente, e envolver a criança no ataque, como mais um “intruso”.
E a lista de preocupações (ou “incumbências”, como preferir chamar) é ainda mais extensa. Tem que se levar em conta todo o cuidado com a saúde do animal. Além de se preparar para ter sofás arranhados por gatos e chinelos roídos pelos cachorros. Isso sem falar de outras tantas artes que eles aprontam naturalmente.
Para se ter um bichinho de estimação, é preciso ainda analisar o espaço disponível na casa (ou apartamento) e quanto tempo por dia a família, principalmente a criança, pode oferecer ao animal. Porque animais solitários em espaços pequenos podem se estressar, ficar doentes, se mutilar (aves que arrancam as penas e bicam seu próprio corpo) ou passar longos períodos de privações (fome, sede, sem lugar para evacuar) e podem causar estragos na casa, para chamar a atenção dos donos e descarregar o estresse.
Preparo para imprevistos
Fugas de animais são frequentes, principalmente de cães e gatos, então também pode ser preciso esclarecer à criança caso isso aconteça, e prepará-la para a possibilidade do animal se perder, morrer (atropelado, p.ex.) ou retornar ferido ou mutilado (ex.: de um atropelamento, de ataques de outros animais ou de pessoas).
Atenção especial às fêmeas ‘prenhas’ (ex.: de gatos, cachorros), parturientes e filhotes recém-nascidos, que exigem cuidados especiais quanto à alimentação, repouso e estímulos ao desenvolvimento; pode ser uma importante fonte de aprendizado para a criança quanto às relações familiares, amamentação, etc.
A morte do animal também pode ser um momento útil de aprendizado, desde que os pais não ocultem essa informação (comprando outro parecido com aquele, para a criança “não perceber”) ou não mintam para ela (dizendo que o animal “fugiu”). A criança precisa ter um tempo para elaborar o luto e retomar sua vida.
Os efeitos terapêuticos dos animais
O animal tem efeitos terapêuticos incríveis: com crianças hospitalizadas, por exemplo, aumentam a sensação de prazer, aliviam as dores (distraindo a criança com brincadeiras, fazendo-a esquecer da dor) e alívio das tensões do ambiente hospitalar, descontraindo o ambiente (VACCARI e ALMEIDA, 2007, cit.).
Crianças vítimas de violência física ou psicológica costumam se tornar introspectivas, agressivas, dificultando o tratamento de recuperação convencional. Nesses casos, alguns profissionais utilizam a terapia com pequenos animais como co-terapeutas no tratamento das patologias físicas e psíquicas. Os animais que participam desse tipo de terapia são escolhidos por suas aptidões, e também recebem treinamento (Terapia Assistida com Animais – TAA, ou Zooterapia) (PORTO e CASSOL, 2007). Conforme afirmam as referidas autoras (p.71):
O tipo de terapia proposta, a Zooterapia, é indicado para crianças vítimas de maus-tratos, com atrasos no desenvolvimento neuropsicomotor, portadores de paralisia cerebral, acidentes vasculares cerebrais (AVC), deficiência visual e auditiva, síndrome de Down, deficiência mental, psicoses, autismo, depressão, estresse, distúrbios e dificuldades de aprendizado entre outros, pois consegue mexer com o psicológico da criança, trazendo melhoraras gradativamente.
Cabe mencionar ainda os benefícios trazidos pela implantação dessa terapia: melhora do sistema imunológico; estimulo à interação social; facilidade da comunicação e do vínculo com o terapeuta; melhora da autoconfiança; resgate da autoestima; melhora da capacidade motora, cognitiva e sensorial; facilitador na ressignificação de conceitos; facilitador no processo de aprendizagem, através da expressão de sentimentos e motivação.
Crianças com dificuldades de aprendizagem[1] tendem a apresentar baixa autoestima, aceitação e popularidade diante de seus pares. Baixas qualificações podem aumentar o sentimento de incapacidade, reforçando o pobre desempenho. Por isso, diversas propostas de intervenção são apresentadas para minimizar ou reverter os efeitos das dificuldades de aprendizagem, incluindo-se a equoterapia, regularizada pelo Parecer nº 06/97 do Conselho Federal de Medicina (PRESTES, WEISS e ARAÚJO, 2010). Os referidos autores mencionam a seguinte descrição dos efeitos psicológicos da equoterapia para crianças com deficiências, necessidades especiais ou dificuldades de aprendizagem (p.194):
O movimento tridimensional do passo do cavalo desencadeia respostas motoras que favorecem a regulação do tônus muscular, a flexibilidade, equilíbrio, aperfeiçoamento da coordenação motora e proporciona estímulos proprioceptivos e vestibulares. O praticante, como é designado o indivíduo que participa da equoterapia, assume uma postura diferente do seu cotidiano. Na maior parte de sua vida, ela enxerga as pessoas e os objetos em sua volta de baixo para cima. Ao montar num cavalo ela passa ver o mundo de outra forma, de outro ponto de vista. Este novo lugar lhe transmite uma sensação de capacidade, aumentando sua segurança e auto-estima (MARCELINO e MELO, 2006).
O praticante descobre ser capaz de conduzir um animal de grande porte, imponente, representando poder e possibilidade. Passa a governar um grande animal e sua vida, percebendo suas capacidades e atenuando a intensidade de suas limitações. A interação com o cavalo desde os primeiros contatos, o montar e os cuidados com a limpeza e alimentação desenvolvem novas formas de socialização, autoconfiança e autoestima. Nas atividades individuais ou em grupo, o praticante aprende a respeitar e cuidar do outro. Passa a perceber que é necessário trabalhar em conjunto, cooperando com o animal e com as pessoas em volta. Na equoterapia os benefícios são adquiridos por motivação, que impulsiona o indivíduo pelo desejo e prazer, conseguindo atrair a atenção, concentração e autocontrole, favorecendo a aprendizagem.
[1] Não apenas as dificuldades de aprendizagem, mas também deficiências físicas/mentais ou quaisquer perturbações no desenvolvimento motor ou cognitivo da criança, ainda que em fase pré-escolar.