A psicoterapia envolve um processo ativo de descobertas, de construção de significados, de conhecimento sobre seus esquemas emocionais, de tendências e padrões comportamentais. O tratamento busca elaborar o nível de consciência, para que os pacientes possam adquirir liberdade emocional, gerenciamento de suas emoções e, consequentemente, ações mais funcionais que os levem ao bem-estar. A psicoterapia infantil anseia o mesmo, mas inclui especificidades. A infância e adolescência são períodos únicos do desenvolvimento que fazem com que essa clínica seja desafiadora, única, complexa, dinâmica e encantadora ao mesmo tempo. 

Aliança terapêutica

É imprescindível analisar as formas de vinculação estabelecidas entre pais-criança, ajudar os pais e cuidadores a reconhecer e atender as necessidades emocionais dos filhos, identificar quais e como os esquemas parentais são ativados diante o comportamento do filho, compreender a dinâmica do funcionamento familiar, explicitar crenças transgeracionais que podem entremear na psicoterapia individual. Identificar se há congruência entre a demanda da criança e a demanda dos pais, assim como se as expectativas sobre o tratamento são realistas. O trabalho com os pais e a criança requer escuta empática, postura mais flexível, reflexiva, acolhedora e não julgadora, que estabeleça uma relação de confiança, uma base segura. Isso requer também habilidade e atenção contínua, com os múltiplos espaços transferenciais que podem ser criados, e esse é um grande desafio da psicoterapia infantil: criar uma boa aliança terapêutica com pais e pacientes e, ao mesmo tempo, manter os limiares éticos.

Outro ponto importante quando se trata desse público, é que os responsáveis devem fazer parte do processo. A despeito de conflitos conjugais ou batalhas judiciais, o foco central é sempre o paciente: criança ou adolescente. Em caso de pais que disputam a guarda do filho na justiça, é necessário atenção para que o próprio terapeuta não negligencie nenhuma das partes. É como num quebra-cabeça com muitos encaixes, onde cada peça é indispensável para compor o cenário.

Formação específica

O terapeuta infantil deve possuir uma formação específica que embase e norteie sua prática. Precisa delimitar e contextualizar a demanda, com um olhar atento sobre as inter-relações familiares. Levar em consideração aspectos histórico-sócio-culturais que possam ter implicação e significância na problemática apresentada. Ajudar a criança e o adolescente a identificar e refletir sobre suas emoções, validando também a capacidade dos mesmos em fazer escolhas e buscar alternativas mais adaptativas para seus problemas. Orientar os pais de forma reflexiva e ativa, auxiliando-os a manejar de forma mais funcional as questões dos filhos, tendo mais clareza de suas próprias questões, e solicitar a participação de todas as figuras representativas para criança.

O bom vínculo terapêutico é potencialmente transformador e necessário. A partir da construção de uma relação de confiança e segurança, a criança pode expressar livremente seus sentimentos, organizar e dar novos significados para as suas experiências. Tão importante também é o tom de voz acolhedor e a postura ativa.

Essas são algumas, dentre outras, peculiaridades da psicoterapia com crianças e adolescentes, que englobam o enorme desafio dessa prática clínica.

E MAIS…

Um processo próprio e dinâmico

Podemos considerar que o primeiro modelo de psicoterapia infantil surgiu em 1909, quando Freud orientava o pai do pequeno Hans, de 5 anos, sobre como trabalhar a fobia do filho.  De lá para cá, muito conhecimento sobre o universo infantil e adolescente foi produzido e diversas abordagens surgiram embasando a clínica com crianças e adolescentes.

Os avanços são relevantes na dinâmica terapeuta-paciente. Atualmente, crianças e adolescentes são vistos como sujeitos pertencentes a um mundo próprio de sua faixa etária. É essencial embarcar nesse universo. No caso do atendimento de crianças, o jogo e o brincar são importantes formas de expressão emocional, cognitiva, comportamental e relacional. Os adolescentes, em pleno processo de transformação característico da fase, se expressam verbalmente, apressadamente, em escolhas explícitas por satisfação de seus desejos. É fundamental compreender o processo dinâmico e próprio dessa clientela. Dentro dessa bagagem, não podemos esquecer dos mais diversos aspectos histórico-sócio-culturais na qual aquele sujeito se apresenta imerso e que devem fazer parte da compreensão e do cuidadoso manejo clínico por parte do terapeuta.