A música, com seus sons, silêncios e ruídos, apresenta-se como um instrumento capaz de transformar frequências distorcidas e desarmônicas em uma ordem original, da perfeita sincronia com o som universal. Nesse sentido, a música surge como uma força poderosa, capaz de alterar a percepção, a sensação e a cognição, trazendo equilíbrio e gerando uma melhor qualidade de vida.

É difícil estabelecer, com precisão, as origens da música. Gostamos de pensar que se o universo é constituído por vibrações, e que vibração é som. Em outras palavras, somos todos feitos de matéria sonora e vivemos num mundo de som. Nessa perspectiva, o som sempre existiu e encerra em si características holísticas, da ordem do supranatural e, por isso, exerce tanto poder e fascínio. 

Sensações e emoções

Podemos dizer que a música é tida como expressão e comunicação de sentidos, sensações e emoções, tanto em níveis individuais quanto coletivos pelo princípio da ressonância.  Ela reflete não só uma época como também as sociedades e as culturas que existem nesta época, ao mesmo tempo em que é refletora de um tempo e das sociedades e culturas que existem neste tempo.

Precisamos nos ater também ao fato de que se somos, todos e tudo, vibrações sonoras. Elas precisam ser captadas por nossos ouvidos e transmitidas ao nosso cérebro. O estudo da estrutura e do funcionamento do cérebro evoluiu muito nos últimos anos. Hoje, já sabemos que cada região cerebral contribui de forma específica para o funcionamento do sistema funcional como um todo. Com isso, torna-se cada vez mais possível identificar as partes específicas do cérebro usadas para diferentes aspectos do pensamento, da emoção e do comportamento. A relevância desses estudos em relação à música reside na descoberta de que o nosso cérebro se constitui numa verdadeira caixa de ressonância; todo ele é musical. 

O hemisfério esquerdo estaria envolvido em aspectos do processo musical que requerem julgamentos sobre duração, ordem temporal, sequência e ritmo. Já o hemisfério direito estaria envolvido em julgamentos sobre memória tonal, timbre, reconhecimento de melodias e intensidade. Considerando que os dois hemisférios se comunicam através do tálamo, o centro das nossas emoções, podemos afirmar que todo o nosso cérebro faz música e sente a música.  Desta forma, o cérebro, enquanto sede de nossa cognição e de nossas emoções, é essencialmente criativo e capaz de promover intensas transformações. 

Potencial curador

Vivemos em um mundo acelerado, compulsivo, estressado e, muitas vezes, somos envolvidos por esse movimento. Este é um reflexo da nossa época! A busca pela melhor performance parece, muitas vezes, como a busca pelo elixir da vida, sem que ao menos as substâncias base estejam sendo utilizadas. Uma loucura desenfreada transforma pessoas em produtos, trabalhadores em workaholics, todos insanos e adoecidos. Eis que a música surge com seu potencial curador! 

Assim é que a cura pelo som tem sido uma modalidade terapêutica crescente nos dias atuais, assim como o foi nos primórdios. Tornou-se inegável a premissa de que o som afeta nosso corpo, nossa mente, nossa psique e nosso espírito. 

A música afeta a nossa mente porque estimula neurotransmissores capazes de promover a sensação de paz. Ela interfere em nosso corpo, promovendo a liberação de hormônios como a endorfina, relacionada à sensação de prazer e bem-estar, o que reduz a tensão muscular. Sabemos que o ritmo cadenciado pode alterar a frequência cardíaca e a respiração. Além disso, a música estimula a psique, pois ativa memórias afetivas acolhedoras, com potencial de nos acalmar profundamente, tal como a lira de Davi. Também pode liberar sentimentos reprimidos para serem acolhidos e transformados. E auxilia na interação social, afinal, quem não se contagia com uma boa cantoria? Por fim, permite que nosso espírito seja induzindo a estados alterados de consciência.

Por isso, busca-se cantos curativos, pelo som dos sinos e tigelas tibetanas, pelos sons em frequência 432 htz. Por isso, o encanto por terapias expressivas, como a musicoterapia e a arteterapia. 

Entretanto, cabe-nos informar que os poderes da música também estão em seu lado sombrio e podem contribuir para o adoecimento de uma pessoa e, mesmo, de um planeta. Daí, a atenção plena ao que ouvimos para não entrarmos em ressonância com frequências distorcidas que, no lugar de promover saúde, nos adoecem e nos afastam do som primordial que é perfeito!

E MAIS…

A ligação dos eventos musicais com as civilizações antigas

As mitologias ao redor do mundo possuem figuras de deuses e semideuses aos quais se atribui habilidade musical. Nas lendas gregas, Tirteo leva um exército à ação ao som da flauta. Árion foi resgatado pelos delfins, seduzidos pela música de sua lira. Talvez o mais famoso dos deuses músicos seja Orfeu que, com sua música, submetia os animais selvagens, detinha o curso das ondas e fazia dançar as árvores e rochas.

É certo que as funções da música foram se modificando ao longo do tempo. Na Antiguidade, a música servia para as manifestações de sentido religioso, sendo também utilizada em celebrações e nos diversos rituais. A Bíblia relata que os muros de Jericó caíram quando os sacerdotes tocaram as suas trombetas e que Davi fazia adormecer o rei Saul ao som de sua lira.