A dieta tradicional do norte de Portugal e noroeste da Espanha, conhecida popularmente como a Dieta do Atlântico, vem chamando a atenção de profissionais da saúde. Isso porque as escolhas alimentares que engloba podem ser uma boa proposta para melhorar a saúde cardíaca e diminuir o risco de doenças que podem levar a óbito, como câncer e obesidade. Ao priorizar frutas, vegetais, legumes e peixes frescos, também traz inúmeros benefícios ao cérebro.
Estudo publicado na revista JAMA Network Open mostrou que a Dieta do Atlântico reduziu modestamente a incidência de síndrome metabólica, uma combinação de pressão arterial mais alta, açúcares no sangue e triglicerídeos. Isso diminuiria, a longo prazo, os riscos de doença cardíaca coronária, diabetes, acidente vascular cerebral e outras condições graves de saúde.
Nesta entrevista, o tema é aprofundado pela médica especialista em emagrecimento Lorena Lemes Balestra, que também aborda o estudo ‘Método 40P/30G/30C: nutrição ideal para uma melhor qualidade de vida’, publicado na revista Contribuciones a Las Ciencias Sociales (CLCS) e do qual é coautora com o médico e neurocientista Fabiano de Abreu Agrela Rodrigues.
Graduada em medicina pela Universidade de Ribeirão Preto (UNAERP), Lorena tem pós-graduação em endocrinologia pelo Instituto Superior de Medicina (ISMD), em nutrologia pela Associação Brasileira de Nutrologia (ABRAN) e em ciências da obesidade e sarcopenia pela Faculdade de Administração e Negócios de Sergipe (Fanese).
Como funciona a Dieta do Atlântico?
É baseada em alimentos cultivados ou encontrados localmente, mas seus benefícios podem ser aplicados a outras culturas. Muito parecida com a Dieta Mediterrânea, tem a maioria das calorias de cada refeição vindo de frutas, vegetais, grãos, sementes e azeite extravirgem. Por ser à base de plantas, a alimentação é rica em fibras, vitaminas e minerais.
Ainda inclui peixes frescos (ricos em ácidos graxos como ômega-3), batatas normalmente consumidas em sopas de vegetais, pão integral e consumo moderado de álcool. Esse tipo de dieta à base de vegetais e cereais ajuda a combater o diabetes e o ganho de peso. A carne vermelha é usada com muita moderação, geralmente apenas para dar sabor a pratos. Ovos, laticínios, porco e aves são consumidos em porções muito menores do que na dieta ocidental tradicional. Isso diminui os riscos de doenças cardiovasculares.
Fale sobre as interações sociais que essa dieta enfatiza.
A Dieta do Atlântico se concentra em comida caseira, com ênfase nas interações sociais entre amigos e familiares. Alimentação consciente e com socialização, preparada em família, com ingredientes frescos. Essa atenção aos alimentos, desligando a televisão e os celulares, concentrando-se no momento em família, mastigando lentamente, fazendo pausas entre as mordidas, ajuda a controlar melhor as porções. Isso faz com que as pessoas não comam além do necessário. A prática de exercícios como caminhada e ciclismo durante o dia também faz parte.
E o que é o Método 40P/30G/30C?
Trata-se de um plano alimentar criado pelo bioquímico norte-americano Barry Sears que se concentra na distribuição equilibrada dos três macronutrientes essenciais: proteínas, gorduras e carboidratos. A proporção numérica se refere à porcentagem que cada macronutriente deve fornecer na dieta diária: 40 representa a porcentagem proveniente de proteínas, 30 representa a porcentagem proveniente de gorduras boas e o outro 30 refere-se à porcentagem proveniente de carboidratos de qualidade. O objetivo dessa dieta é equilibrar o consumo de nutrientes, promovendo uma alimentação saudável e controlando a ingestão desses macronutrientes. Essa abordagem pode ajudar a controlar os níveis de açúcar no sangue, manter um peso saudável, aumentar a energia e promover a sensação de saciedade.
Que benefícios esse plano alimentar pode trazer?
Existem vários benefícios associados ao estilo alimentar que a dieta 40P/30G/30C pode entregar, entre eles:
Nutrição equilibrada: o indivíduo consome uma variedade de alimentos saudáveis, como cereais integrais, frutas, vegetais, carnes magras, peixes, laticínios com baixo teor de gordura e fontes saudáveis de gordura. Essa variedade proporciona uma ampla gama de nutrientes essenciais, como vitaminas, minerais, fibras e antioxidantes.
Manutenção e desenvolvimento muscular: a proporção adequada de proteínas é benéfica para a manutenção e o crescimento muscular. As proteínas são essenciais para a reparação e o crescimento dos tecidos musculares, além de desempenharem um papel importante no metabolismo e na função imunológica.
Níveis de glicose no sangue: o consumo de carboidratos complexos, que são digeridos e absorvidos de forma mais lenta, resulta em uma liberação gradual de glicose no sangue. Isso contribui para a manutenção dos níveis de glicose estáveis, evitando picos e quedas bruscas, o que é benéfico para pessoas com diabetes ou para aqueles que buscam controlar seus níveis de açúcar no sangue. É necessário sempre consumir primeiro proteína, legumes, vegetais e, por último, o carboidrato, que diminui a possibilidade de picos de insulina.
Saúde cardiovascular: a inclusão de gorduras saudáveis, como ácidos graxos ômega-3 presentes em peixes, nozes e sementes, promove a saúde cardiovascular. Os ácidos graxos ômega-3 possuem propriedades anti-inflamatórias e podem auxiliar na redução dos níveis de colesterol LDL (o “mau” colesterol), contribuindo para a melhoria da saúde do coração.
Gerenciamento de peso: é possível manter um equilíbrio adequado de macronutrientes, o que auxilia no controle do peso corporal. A proporção de carboidratos, proteínas e gorduras é planejada para fornecer energia sustentada e evitar flutuações nos níveis de glicose no sangue, promovendo a sensação de saciedade e reduzindo a necessidade de lanches frequentes.
Satisfação prolongada: incluir quantidades adequadas de proteínas, carboidratos de qualidade e gorduras boas auxilia no aumento da sensação de saciedade e prolonga a sensação de plenitude após as refeições. Isso auxilia na prevenção de excessos alimentares e na redução geral da ingestão calórica.
E que papel as proteínas representam na saúde do cérebro?
Por meio da ingestão adequada de proteínas, o organismo obtém os aminoácidos essenciais necessários para a síntese de neurotransmissores, que são substâncias químicas responsáveis pela comunicação entre as células cerebrais. Existem aminoácidos específicos presentes em alimentos ricos em proteínas que são fundamentais para a função cerebral. Por exemplo, o triptofano é um aminoácido precursor da serotonina, um neurotransmissor associado ao humor e à regulação do sono. A deficiência de triptofano pode afetar negativamente o humor, levando a sintomas de depressão e ansiedade.
Além disso, a nutrição adequada de proteínas é essencial para a manutenção e reparação dos tecidos cerebrais. As proteínas são necessárias para a formação de novas células cerebrais e a produção de enzimas e outros componentes essenciais para o funcionamento do sistema nervoso. Vários estudos científicos têm investigado a relação entre a nutrição de proteínas e a manutenção da função cerebral em diferentes fases da vida, desde o desenvolvimento cognitivo na infância até o envelhecimento saudável, incluindo memória e habilidades executivas.
No entanto, é importante ressaltar que uma alimentação equilibrada e variada é fundamental para obter todos os nutrientes necessários para o cérebro. Além das proteínas, a ingestão adequada de carboidratos, gorduras saudáveis, vitaminas, minerais e antioxidantes também desempenha um papel essencial na saúde cerebral.
Que benefícios os carboidratos trazem para o cérebro?
Os carboidratos são uma importante fonte de energia para o cérebro. Quando consumidos, eles são quebrados em glicose, que é o principal combustível utilizado pelo cérebro para funcionar adequadamente. A glicose é transportada para as células cerebrais e utilizada na produção de energia.
O consumo adequado de carboidratos é essencial para o bom funcionamento do cérebro. Eles fornecem a energia necessária para a realização de tarefas cognitivas, como pensar, aprender e se concentrar. A falta de carboidratos na dieta pode levar à fadiga mental, dificuldade de concentração e comprometimento cognitivo.
Além disso, os carboidratos desempenham um papel na regulação do humor. Eles estimulam a produção de serotonina, um neurotransmissor associado ao bem-estar e à sensação de felicidade. Dietas muito baixas em carboidratos podem afetar negativamente o humor e levar a alterações no equilíbrio emocional.
No entanto, é importante destacar que nem todos os carboidratos são iguais. Carboidratos complexos, como grãos integrais, frutas e legumes, são digeridos mais lentamente, liberando glicose de forma gradual e proporcionando uma energia mais estável ao cérebro. Por outro lado, o consumo excessivo de carboidratos simples, como açúcares refinados e alimentos processados, pode levar a picos rápidos de glicose no sangue, seguidos por quedas bruscas, afetando a estabilidade do humor e a função cognitiva.
E quais os benefícios que as gorduras boas trazem ao cérebro?
O cérebro se beneficia significativamente das gorduras benéficas, que também são conhecidas como ácidos graxos ômega-3 e ômega-6. Essas gorduras são cruciais para o bom funcionamento cerebral, mas nosso organismo não consegue produzi-las, sendo necessário obtê-las por meio da alimentação.
Os ácidos graxos ômega-3 desempenham um papel fundamental no desenvolvimento e funcionamento do cérebro. Encontrados em peixes gordurosos como salmão, sardinha e atum, bem como em sementes de linhaça e nozes, eles são componentes importantes das membranas celulares cerebrais e facilitam a comunicação entre as células nervosas. Estudos têm apontado que os ômega-3 podem melhorar a memória, o foco e a saúde cognitiva em geral.
Os ácidos graxos ômega-6, encontrados em óleos vegetais, sementes e nozes, também são essenciais para o cérebro. Eles têm um papel importante na formação da mielina, uma substância que reveste os axônios das células nervosas, permitindo uma transmissão eficiente dos impulsos elétricos. Além disso, os ômega-6 ajudam a regular a inflamação no cérebro, o que é relevante para várias doenças neurológicas.
É crucial notar que o equilíbrio entre os ácidos graxos ômega-3 e ômega-6 é fundamental. Um desequilíbrio com uma proporção elevada de ômega-6 em relação ao ômega-3 pode ter efeitos negativos na saúde cerebral. Portanto, é recomendado consumir uma variedade de alimentos ricos em ácidos graxos ômega-3 e ômega-6, mantendo um equilíbrio saudável.
A dieta 40P/30G/30C tem alguma restrição?
Embora a dieta 40P/30G/30C tenha seus benefícios, também existem alguns aspectos que podem ser considerados como possíveis malefícios ou desafios ao segui-la:
Restrição de carboidratos: a limitação da quantidade de carboidratos consumidos pode ser difícil para pessoas mais ativas ou com necessidades energéticas específicas. Restringir demais os carboidratos pode levar a baixa energia, cansaço, tonturas e dificuldade de concentração em algumas pessoas.
Deficiências nutricionais: dependendo das escolhas alimentares e da variedade de alimentos consumidos, pode haver um risco de não obter nutrientes importantes, como fibras, vitaminas e minerais suficientes, além de reduzir o consumo de alimentos ricos em carboidratos, como pães e massas. Focar apenas na proporção de macronutrientes pode levar a uma menor variedade de alimentos e, consequentemente, a uma ingestão reduzida de nutrientes essenciais, a menos que se tome cuidado para manter uma dieta balanceada e variada.
Essa dieta pode ser uma estratégia alimentar útil, mas é importante lembrar que a nutrição é apenas um aspecto de um estilo de vida saudável. Além da alimentação, a prática regular de atividade física, o gerenciamento do estresse, o sono adequado e outros hábitos saudáveis são fundamentais para promover uma boa saúde geral.
Também é fundamental buscar orientação de um profissional de saúde, como um nutricionista, antes de iniciar qualquer dieta. Ele pode avaliar as necessidades individuais de cada pessoa, fornecer orientações personalizadas e garantir que o paciente siga uma dieta equilibrada e saudável.