A síndrome de Down ou trissomia do cromossomo 21 caracteriza-se pela presença de três cromossomos 21 em todas ou na maioria das células de uma pessoa. A alteração faz com que o bebê nasça com 47 cromossomos presentes no núcleo das suas células em vez de 46.

Indivíduos com essa condição genética apresentam características físicas semelhantes, como rosto arredondado, olhos amendoados, deficiência intelectual que varia de pessoa para pessoa e cardiopatia congênita. A primeira descrição da síndrome foi feita em 1866 pelo médico pediatra inglês John Langdon Down, de quem se originou o nome. Ele trabalhava no Hospital John Hopkins, em Londres.

Pilares

Conscientização, respeito e inclusão são considerados os pilares para a convivência saudável de pessoas com síndrome de Down em uma sociedade. Nesse sentido, foi criado o Dia Internacional da Síndrome de Down, celebrado em 21 de março, cuja finalidade é promover um debate público sobre essa condição genética para conscientizar familiares e cidadãos em geral sobre a importância de incluir e respeitar todas as pessoas.

A Down Syndrome International, organização dedicada à defesa dos direitos das pessoas com síndrome de Down, escolheu para a campanha deste ano o tema Improve our support systems, ou seja, Melhore nossos sistemas de apoio. No Brasil, a Federação Brasileira das Associações de Síndrome de Down (FBASD) adaptou essa mensagem para refletir melhor a realidade e as necessidades locais: Suporte para quem precisa. Todos juntos apoiando a inclusão! Seja rede de apoio!

Debate

Nesta entrevista, o tema é aprofundado pela educadora Mirella Guedes Lima de Castro, doutoranda em ensino de ciências, mestre em educação na linha de educação especial e processos inclusivos. É coautora do livro Estudos e pesquisas sobre síndromes: relatos de casos, organizado por Rogério Drago (Wak Editora).

A obra tem a intenção de promover uma discussão sobre os conhecimentos, as experiências e o trabalho pedagógico desenvolvido com sujeitos sociais que apresentam síndromes peculiares e que estão inseridos nas salas comuns da escola regular, em processo de inclusão, tendo seus direitos reconhecidos.

Quais são os aspectos genéticos envolvidos na síndrome de Down?

A síndrome de Down é uma condição genética causada por uma alteração no cromossomo 21. Em vez de ter duas cópias desse cromossomo, como ocorre normalmente, a pessoa com síndrome de Down apresenta três cópias do cromossomo 21, totalizando 47 cromossomos em vez dos 46 habituais. Isso acontece devido a uma falha na divisão celular chamada não disjunção cromossômica, que pode ocorrer durante a formação do óvulo ou do espermatozoide.

A síndrome pode se manifestar em três formas principais, cada uma com características cromossômicas específicas. A trissomia 21 livre (ou simples) é a mais comum, representando cerca de 95% dos casos. Nessa forma, todas as células do organismo do indivíduo possuem três cópias do cromossomo 21, resultando de uma alteração aleatória na divisão celular, sem influência hereditária dos pais.

Já a translocação robertsoniana ocorre em aproximadamente 3% a 4% dos casos e se caracteriza pela presença de um fragmento extra do cromossomo 21, que se liga a outro cromossomo, geralmente 14 ou 15. Diferentemente da trissomia simples, essa forma pode ser herdada caso um dos pais seja portador de uma translocação equilibrada, o que aumenta o risco de recorrência na família.

Por fim, o mosaicismo é a forma mais rara, ocorrendo entre 1% e 2% dos casos. Nessa variação, algumas células do organismo possuem três cópias do cromossomo 21, enquanto outras mantêm a contagem normal de dois cromossomos. Essa alteração surge após a fecundação, nesse caso, a manifestação das características pode variar conforme a quantidade de células afetadas.

Há algum tipo de predisposição para o nascimento de bebês com a síndrome?

Alguns fatores podem aumentar a probabilidade de uma gestação resultar no nascimento de um bebê com síndrome de Down. De acordo com dados do Estudo Colaborativo Latino-Americano de Malformações (ECLAMC), cerca de 40% dos bebês nascidos com a síndrome são filhos de mães com idades entre 40 e 44 anos, embora mulheres nessa faixa etária representam apenas 2% do total de nascimentos.

Esse dado evidencia um dos principais fatores de predisposição para a trissomia 21: a idade materna avançada. Com o avanço da idade, os ovócitos tornam-se mais suscetíveis a alterações no processo de divisão celular, aumentando o risco de não disjunção cromossômica. Para ilustrar essa relação, uma mulher de 20 anos tem uma probabilidade de 1 em 1.500 de ter um filho com síndrome de Down, enquanto esse risco sobe para 1 em 100 aos 40 anos e pode atingir 1 em 30 após os 45 anos.

No entanto, é importante destacar que a ocorrência da síndrome não está exclusivamente associada à idade materna. Estudos indicam que mutações genéticas que influenciam o mecanismo de separação cromossômica durante a meiose também podem desempenhar um papel na formação da trissomia 21, independentemente da idade da mãe.

Além disso, há casos em que a síndrome de Down está relacionada a uma translocação cromossômica, condição em que um dos pais é portador de uma reorganização estrutural dos cromossomos. Nessas situações, o risco de recorrência é consideravelmente maior, variando entre 10% e 15% se a mãe for portadora da translocação e entre 2% e 5% se o pai for o portador.

Diante dessas variáveis, é essencial que as famílias tenham acesso ao aconselhamento genético tanto para obter esclarecimentos sobre os fatores envolvidos quanto para planejar o suporte necessário ao desenvolvimento da criança. Um diagnóstico preciso não apenas permite estimar os riscos, mas também direciona as melhores abordagens para acompanhamento clínico, estimulação precoce e inclusão social, garantindo melhor qualidade de vida desde a primeira infância.

Como a acessibilidade e as adaptações para a pessoa com deficiência (PcD) podem suprir as necessidades específicas de quem tem síndrome de Down e garantir sua plena participação na sociedade?

A acessibilidade e as adaptações para pessoas com deficiência (PcD) desempenham um papel essencial na promoção da inclusão e no fortalecimento da autonomia de indivíduos com síndrome de Down, assegurando sua participação plena na sociedade. Essa condição genética pode estar associada a diferentes características, como comprometimentos cognitivos leves a moderados, dificuldades na comunicação, hipotonia muscular e desafios na coordenação motora. Diante dessas particularidades, a implementação de estratégias acessíveis em diversas áreas é fundamental para proporcionar um ambiente mais inclusivo e estimulante.

O que a acessibilidade envolve no contexto educacional?

No contexto educacional, a acessibilidade envolve a adoção de metodologias pedagógicas adaptadas, o uso de materiais didáticos acessíveis e a oferta de suporte especializado. Recursos visuais, atividades práticas e tecnologias assistivas, como softwares de aprendizagem interativa, desempenham um papel crucial na facilitação da compreensão dos conteúdos e na ampliação das possibilidades de desenvolvimento acadêmico. Além disso, estratégias de ensino que respeitam o ritmo individual dos alunos são essenciais para favorecer sua autonomia e participação ativa no ambiente escolar, promovendo um aprendizado significativo e igualitário.

E no mercado de trabalho?

No mercado de trabalho, a inclusão se fortalece por meio da flexibilização de tarefas, da oferta de treinamentos adaptados e da criação de ambientes acessíveis tanto no aspecto físico quanto social. Programas específicos de empregabilidade para pessoas com deficiência e a adequação das funções às habilidades do profissional com síndrome de Down ampliam suas oportunidades de inserção no mundo do trabalho. Além disso, o acompanhamento por mentores e colegas sensibilizados contribui significativamente para a construção de um ambiente corporativo mais acolhedor, produtivo e diverso.

Como a acessibilidade se manifesta no cotidiano?

No cotidiano, a acessibilidade se manifesta em múltiplas dimensões, desde a infraestrutura urbana adequada até a comunicação inclusiva e o estímulo à vida autônoma. Elementos como sinalização clara, linguagem simplificada e capacitação de profissionais para um atendimento acessível são essenciais para garantir que pessoas com síndrome de Down possam usufruir plenamente de serviços essenciais, espaços de lazer e atividades culturais.

Além disso, iniciativas que incentivam a independência, como moradias assistidas e programas de desenvolvimento de habilidades sociais, são fundamentais para ampliar sua participação ativa na sociedade. Mais do que a eliminação de barreiras físicas, a acessibilidade representa uma transformação estrutural e atitudinal que visa assegurar igualdade de oportunidades. Quando a sociedade adota medidas concretas para atender às necessidades específicas das pessoas com síndrome de Down, não apenas garantimos seus direitos, mas também promovemos um ambiente social mais inclusivo, diverso e enriquecedor para todos.

Cite exemplos de estímulos e/ou atividades para o desenvolvimento de pessoas com síndrome de Down nos contextos familiar, clínico e escolar e para quais faixas etárias são destinados.

O desenvolvimento de indivíduos com síndrome de Down pode ser aprimorado por meio de estímulos adequados em diferentes contextos, respeitando suas particularidades e fases da vida. No ambiente familiar, atividades como brincadeiras sensoriais, leitura de histórias ilustradas, organização da rotina e incentivo à autonomia em tarefas cotidianas contribuem para a socialização e o desenvolvimento motor e cognitivo desde a infância até a vida adulta.

No contexto clínico, terapias especializadas desempenham um papel fundamental, incluindo fisioterapia para fortalecimento muscular, fonoaudiologia para aprimoramento da comunicação e terapia ocupacional para estimular habilidades funcionais. A escola, por sua vez, deve adotar práticas pedagógicas inclusivas, utilizando recursos visuais, tecnologias assistivas e metodologias adaptadas para garantir a aprendizagem efetiva e a participação social do estudante.

Além disso, a preparação para a vida adulta exige ações voltadas à independência, como capacitação profissional e atividades que promovam o senso de responsabilidade e a autonomia. A implementação de estratégias coerentes com as necessidades individuais permite que a pessoa com síndrome de Down desenvolva suas potencialidades, favorecendo sua inserção social e qualidade de vida.

E de que forma é possível contribuir para que os pais ou outros responsáveis por pessoas com síndrome de Down tenham saúde emocional para superarem os obstáculos que precisam enfrentar?

A saúde emocional dos pais/responsáveis por pessoas com síndrome de Down é essencial para o bem-estar familiar e a qualidade do suporte oferecido. O acesso a uma rede de apoio, incluindo grupos de acolhimento e associações especializadas, ajuda a reduzir o isolamento e fortalece a resiliência por meio do compartilhamento de experiências. O acompanhamento psicológico também é fundamental para lidar com desafios emocionais, como o impacto do diagnóstico e a preocupações com o futuro. Dentro da família, a distribuição de responsabilidades e o fortalecimento dos laços ajudam a evitar a sobrecarga.

Além disso, o acesso a informações de qualidade sobre direitos e possibilidades de desenvolvimento proporciona mais segurança na tomada de decisões. O incentivo ao autocuidado é igualmente essencial, pois pais/responsáveis precisam encontrar tempo para descanso e lazer, garantindo um ambiente mais equilibrado. Dessa forma, a combinação de suporte social, acompanhamento profissional, fortalecimento familiar e autocuidado permite que esses cuidadores enfrentem desafios com mais equilíbrio e bem-estar.