A série ‘Feliz Natal e tal’, disponível no streaming Netflix, acompanha o final de ano da família Quinn, com foco em Don Quinn, o patriarca rigoroso e controlador que tenta garantir que as festividades de Natal em sua casa ocorram conforme as suas expectativas e tradições familiares. O roteiro explora a dinâmica disfuncional da família durante as celebrações, abordando temas como as tensões familiares, diferentes expectativas de comportamento e as frustrações comuns que surgem nas interações familiares.

Mas o que chama atenção são as exigências de Don e a maneira como seus filhos (e demais parentes) reagem a ele e suas expectativas, me fazendo refletir que a série abre portas para analisarmos as dinâmicas familiares por meio do condicionamento operante e da modelagem, conceitos presentes na teoria de Skinner. Através desses conceitos, podemos entender como os personagens, especialmente dentro do contexto familiar imposto por Don, ajustam seus comportamentos ao longo da série.

Consequências

O condicionamento operante se baseia na ideia de que comportamentos são moldados por consequências que seguem essas ações. Por meio do reforço (positivo ou negativo) e da punição, as pessoas ajustam seus comportamentos para alcançar resultados desejáveis ou evitar consequências negativas.

Na série, podemos ver essa teoria com Don, a figura de autoridade, e suas reações às ações de seus filhos e cônjuges servindo como reforços ou punições. Ele tem uma forma de controle que influencia como o restante da família age. Por exemplo, Joy e Todd (nora e genro de Don), ao interagirem com o sogro, frequentemente ajustam seus comportamentos para evitar conflitos ou buscar aprovação.

Quando Don mostra aprovação ou valida o comportamento de seus filhos ou cônjuges, pode ser internalizado como um reforço positivo, que encoraja os membros da família a se comportarem de forma que ele espera. Ao mesmo tempo, quando Don expressa desaprovação (nunca de uma maneira sutil), isso funciona como uma punição para o comportamento não desejado, levando os membros da família a modificarem suas atitudes para evitar novas punições emocionais.

Esse processo de ajuste comportamental é um reflexo do condicionamento operante, pois os membros da família aprendem a modificar suas ações com base nas consequências (aprovação ou desaprovação) que recebem de Don. Por exemplo, se Don reprova um comportamento de Matt, ele irá ajustá-lo para evitar novas críticas, criando um ciclo de “aprendizagem” no qual as ações que agradam a Don se tornam mais frequentes devido ao reforço, enquanto as ações que causam desaprovação se tornam menos comuns.

Busca por aceitação

Isso não acontece apenas com Matt, pois a busca por aceitação é vista em todos os membros da família, bem como a conformação de que Don está sempre correto ou de que essa dinâmica é normal, como podemos ver na interação entre Kayla e Sean. Após debaterem se irão contar a Don que Sean Jr é ateu, Joy fala “ninguém deveria ter medo do próprio pai” e o marido responde “Kayla falando com o peixe parece menos doida que você agora”.

A frase de Joy pode ser interpretada como uma crítica à dinâmica de poder e controle emocional exercida por Don sobre os membros da família. Também pode ser interpretada à luz da modelagem de comportamento de Skinner. Don, como figura central, exerce um controle significativo sobre as interações familiares e modela o comportamento de seus filhos e cônjuges.

Quando Joy expressa que ninguém deveria temer seu próprio pai, ela está chamando atenção para a maneira como Don tem moldado os comportamentos familiares por meio do medo e da dominação emocional. Esse controle pode ser reforçado por suas respostas de punição emocional ou aprovação condicionada, e a modelagem de comportamento sugere que os membros da família ajustam suas reações e atitudes para agradar a Don por medo de suas respostas negativas.

Modelagem

A modelagem é um processo gradual em que um comportamento é aprendido através de inúmeros reforços de aproximações do comportamento desejado. Isso pode ser claramente visto nas interações entre Don e os membros da sua família, especialmente quando Matt, por ser novo na família, tenta se adaptar aos padrões rígidos do patriarca.

Matt, que inicialmente não sabe como se comportar de maneira considerada aceitável por Don, começa a mudar seus comportamentos aos poucos, tentando se alinhar às expectativas de seu sogro para ser aceito e aprovado; isso é um exemplo de modelagem de comportamento.

Esse processo também pode ser observado com Joy e Todd, que, embora mais familiarizados com as expectativas de Don, ainda ajustam seu comportamento para se encaixar na situação, como Todd fingir que gosta de futebol ou Joy deixar Emmy levar a culpa pelos cigarros encontrados. Ambos passam por um ajuste gradual em sua maneira de interagir com Don, após entrar na família, em busca de aprovação e para evitar a desaprovação que pode surgir se quebrarem alguma das tradições ou expectativas que Don tenta impor.

Reforços

O condicionamento operante – e a dinâmica da família – se baseia em reforços (positivos ou negativos), mas vamos dar uma olhadinha no que eles são? O reforço positivo ocorre quando um comportamento é seguido por uma recompensa ou aprovação, aumentando a probabilidade de que esse comportamento se repita no futuro. Como quando Matt, o namorado de Emmy, tenta agradar a Don e se comporta de acordo com as expectativas familiares (como tentar entender as tradições ou ajudar nas preparações do Natal). Don pode reagir positivamente, mostrando aprovação ou oferecendo palavras de encorajamento. Esse tipo de aprovação é um reforço positivo, pois encoraja Matt a continuar se comportando dessa forma para obter mais aceitação e aprovação de Don.

Seguindo a mesma lógica, o reforço negativo ocorre quando um comportamento é seguido pela remoção de uma situação desagradável ou aversiva, o que aumenta a probabilidade de o comportamento ocorrer novamente. Em várias situações, os membros da família tentam evitar a desaprovação de Don, que é uma fonte de tensão emocional.

Um exemplo de reforço negativo pode ser visto quando Emmy decide fazer a entrevista que seu pai arranjou para evitar que ele fique mais crítico. Quando ela se adapta ao que Don espera, ele deixa de fazer comentários negativos ou demonstra desaprovação em relação a ela. A ausência de críticas ou tensão é uma forma de reforço negativo, incentivando Emmy a continuar a se comportar de acordo com as expectativas de Don para evitar o desconforto emocional que ele pode gerar com suas críticas.

Esses dois tipos de reforço moldam a forma como os personagens reagem nas interações familiares e ajudam a manter a dinâmica dentro das expectativas de Don e da família. Interessou-se por essa temática? Recomendo a leitura dos seguintes livros da Sinopsys Editora: Temas em ciências cognitivas e representação mental (Ederaldo José Lopes) e Valores nas terapias comportamentais: relação terapêutica, ética e política (Alexandre Dittrich, Jan Luiz Leonardi e Jocelaine Martins da Silveira).