Através da perspectiva logoterapêutica de Viktor Frankl e dos estudos de Valeska Zanello, discute-se como a lógica patriarcal influencia a vivência do vazio existencial, destacando a importância dos valores existenciais e da busca por sentidos na vida.

Esse artigo propõe uma reflexão crítica sobre a importância de valores existenciais e a busca por sentidos como formas de resistir às imposições sociais e alcançar uma vida mais autêntica e significativa.

A Logoterapia e a Prateleira do Amor

O presente artigo objetiva gerar reflexões, a partir da perspectiva logoterapêutica, considerando o vazio existencial na era das relações líquidas digitais, especificamente na vida de mulheres heterossexuais que estão sujeitas ao sistema das prateleiras do amor. Compreendendo que a lógica patriarcal pode colaborar para a vivência do fenômeno do vazio existencial, objetiva-se também destacar a relevância dos valores existenciais e da busca de sentidos de tantas mulheres, que podem – diante de inúmeras possibilidades – existir e sentir para além da busca por relacionamentos amorosos. Para isso, iremos nos aprofundar, principalmente, em conceitos da Logoterapia e em estudos recentes produzidos pela psicóloga e pesquisadora Valeska Zanello.

A Logoterapia e Análise Existencial (LAE) é uma abordagem que deriva das vertentes da Fenomenologia, Existencialismo e Humanismo, considerada a terceira escola de psicoterapia de Viena. Fundada por Viktor Frankl, a LAE tem como base a busca por sentidos existenciais, nomeada como Vontade de Sentido, que se caracteriza como a principal força motriz a guiar os sujeitos em suas trajetórias. Um fato histórico interessante e que deve ser ressaltado em relação à abordagem, é que Frankl foi prisioneiro nos campos de concentração do holocausto ao longo da Segunda Guerra Mundial. Sua teoria, no entanto, foi elaborada  antes mesmo dessa experiência de Frankl, e não durante ou depois, como muitos deduzem.

O conceito da “Prateleira do Amor”, por sua vez, foi cunhado por Valeska Zanello,  psicóloga pesquisadora na área de Saúde Mental e Gênero e professora no Departamento de Psicologia Clínica da Universidade de Brasília (UnB). Através dele, reflete-se sobre o que está por trás de algumas lógicas impostas pelo patriarcado, tal como a objetificação e mercantilização de corpos femininos na busca de relacionamentos afetivos. Assim, correlacionando a LAE com o conceito trazido por Zanello, buscamos compreender como a busca por valores existenciais podem colaborar com o rompimento do ciclo das prateleiras do amor.

Logoterapia e Análise Existencial: entre sentidos e o vir-a-ser

Para isso, é necessário elucidar a visão de Homem da LAE, que considera como ponto de partida a sua multiplicidade. Frankl traz o conceito de ontologia dimensional, que explica a tridimensionalidade do homem e sua complexidade: o corpo, a psique, e o espírito.

Eu definiria o homem como unidade apesar da multiplicidade! Conceber o ser humano em termos de estratos ou camadas biológicas, mentais e espirituais sugere que os modos somático, psíquico e noético de ser pudessem apresentar-se separadamente entre si. (FRANKL, 2008, p.32)

Assim, Frankl (2008) defende que apesar de ser possível observar o homem sob as três camadas, é fundamental que o terapeuta não cometa o erro de ignorar o básico: analisar o sujeito como um todo, uma unidade. Dessa maneira, o corpo físico do homem é considerado a dimensão mais popularmente conhecida, já que é através dos nossos corpos que movimentamos parte do nosso existir no dia-a-dia. Segundo Pereira (2015), o corpo do sujeito funciona como a porta de entrada do nosso fazer-ser. Diante disso, muito se discute também sobre como o homem, ao longo dos tempos, aprendeu sobre como desenvolver práticas para o cuidado do corpo e a prevenção de doenças somáticas do organismo humano. Entretanto, ainda hoje, muitos ignoram as práticas de cuidado e prevenção da saúde ampliada (indo além da visão biomédica).

A psique (ou a mente), por sua vez, seria a dimensão dos processos cognitivos e psicológicos do ser humano, ocupando a posição que interliga o corpo e o espírito, como se estivesse na posição central entre os dois extremos (Pereira, 2015). Por fim, chega-se à dimensão mais elevada – o espírito, Frankl (2008) aponta sobre a negligência da dimensão noética pelas áreas de conhecimento.

A ontologia dimensional está longe de resolver o problema mente-corpo. No entanto, ela explica porque tal questão não pode ser solucionada. Inevitavelmente, a unidade do ser humano – unidade essa, apesar da multiplicidade do corpo e da mente – não pode ser achada em suas faces psicológica, nem biológica, mas deve ser procurada em sua dimensão noológica, da qual o homem foi, de início, projetado. (FRANKL, 2008, p.35)

A priori, é importante ressaltar que o conceito de espírito aqui trazido não se refere às esferas relacionadas à religiosidade, mas sim a um campo que é preenchido e explorado por fenômenos existenciais vivenciados por cada sujeito. No mais, afirmar que o espírito é a dimensão mais elevada não o caracteriza como a dimensão mais importante dentre as três, visto que não há essa diferenciação diante da perspectiva logoterapêutica, uma vez que o sujeito é composto pela completude das três dimensões. Assim sendo, pode-se pensar no espírito como a dimensão responsável por abarcar os nossos sentidos existenciais, que são singulares a cada sujeito.

De acordo com Frankl (2008) o homem é capaz de guiar a sua própria existência em busca de sentidos que o realizem, através da Liberdade da Vontade – a possibilidade de poder escolher como agir frente a condicionantes biopsicossociais – e, também, da responsabilidade das consequências derivadas diante de suas próprias escolhas.

O homem é livre para responder a essas perguntas feitas pela vida. Mas essa liberdade não pode ser confundida com arbitrariedade, mas interpretada sob o prisma da responsabilidade. O ser humano é responsável por dar a resposta certa para as perguntas, encontrando o verdadeiro sentido de uma situação. Sentido é algo a ser encontrado e descoberto, não podendo ser criado ou inventado. (Frankl, 2008, p. 78)

Esses sentidos, no entanto, nem sempre são fáceis de serem encontrados. É preciso que o sujeito faça uma busca ativa por aquilo que alimenta a sua existência, e o caminho para isso se dá pela identificação dos valores existenciais. Quando o homem realiza uma busca diretamente para a felicidade, é possível que ele se frustre em meio ao caminho, uma vez que é através da realização de valores existenciais que podemos encontrar sentido e nos direcionar ao nosso vir-a-ser – que, de fato, atua como o caminho para a chegada à felicidade plena.

Assim como a felicidade, a autorrealização aparece como efeito, isto é, o efeito da realização de um sentido. Apenas quando o homem preenche um sentido lá fora, no mundo, é que ele realizará a si mesmo. Se ele decide por realizar a si mesmo, em vez de preencher um sentido, a autorrealização perde, imediatamente, sua razão de ser. (FRANKL, 2008, p. 50)

Os valores existenciais, então, podem ser divididos em três categorias: valores de experiência, valores de criação e valores de atitude. Os valores de experiência são voltados para tudo aquilo que podemos experimentar em dias comuns e também em dias extraordinários, ou seja, a qualquer coisa que podemos receber do mundo. As possibilidades são inúmeras, e irão variar de acordo com a subjetividade de cada sujeito.

 Já os valores de criação se baseiam nas diversas possibilidades que temos de criar – ou seja, doar ao mundo: artes como música, artesanato, pintura, dança, teatro, escrita etc. E, diante dessas possibilidades, podemos escolher em desenvolver essas criações como hobbies mas, também, como um trabalho. Mais uma vez, tudo pode variar de acordo com o contexto em que cada sujeito está inserido.

Por fim, mas não menos importante, chegamos aos valores de atitude: ações que tomamos diante de sofrimentos inevitáveis. Sob a perspectiva da LAE, entendemos que estamos diante de sofrimentos inevitáveis ao longo da nossa existência, conhecida como a tríade trágica: a dor, a culpa e a morte. Assim, “não há um único ser humano que possa dizer que jamais sofreu, que jamais falhou e que não morrerá” (Frankl, 2008, p. 90). Logo, com os valores de atitude bem estabelecidos e, também, com a nossa Vontade de Sentido, somos capazes de enxergar possibilidades de enfrentamento às dificuldades que, infelizmente, surgem ao longo da nossa trajetória. 

Quando o homem possui autoconhecimento suficiente para compreender como ele vivencia os três valores existenciais, é possível que sua consciência seja clarificada e os seus sentidos se tornem mais evidentes. No entanto, esse não é um caminho fácil de ser seguido, visto que a nossa existência no mundo é permeada por vários fatores externos que, às vezes, podem sugerir caminhos contrários ao de uma caminhada acompanhada de Sentidos.

Nesse caminho, Frankl traz o conceito do Vazio Existencial, que é um fenômeno presente na contemporaneidade. A sensação de um vazio existencial pode surgir em qualquer pessoa, independente das circunstâncias em que ela esteja inserida. No entanto, existem alguns fenômenos sociais que podem influenciar alguns sujeitos a chegarem a esse ponto. Ora, uma vez que estamos sempre direcionando a nossa existência – ou seja, o nosso fazer-ser no mundo – para algo ou alguém, é muito comum que busquemos a felicidade sob orientação de opiniões ou desejos de outros sujeitos. Assim, não é incomum encontrar pessoas que fazem o que os outros fazem (conformismo) ou o que os outros querem que elas façam (totalitarismo). Frankl (2008) destaca que a quebra de tradições entre gerações é um dos motivos que pode gerar o Vazio Existencial, e que os fenômenos do conformismo e totalitarismo são consequências desse vazio. 

Em nossa sociedade, a perda das tradições que orientavam a vida cotidiana das pessoas e a crescente ausência de valores claramente definidos têm contribuído para a expansão de um vazio existencial. Esse vazio é uma das maiores ameaças para a saúde mental na atualidade. (FRANKL, 2008, p.128).

No mais, essa busca por uma vida plena de sentido e consequentemente feliz pode ser, facilmente, interpretada de maneira supérflua ou errônea por muitos. No próprio campo da Psicologia, Freud defendia que a existência de um sujeito é voltada para a busca pelo prazer, enquanto Adler defendia a busca pelo poder. Frankl, então, chega ressignificando o que para muitos já era dado ou óbvio, nos fazendo questionar: o que nos move ao longo da nossa existência? O que, verdadeiramente, pode nos guiar para a busca por uma vida repleta de sentidos? A base de uma existência deveria ser somente a busca pelo poder ou prazer? 

Logo, Frankl (2008) argumenta sobre a importância dos sujeitos buscarem viver uma vida repleta de sentidos, que podem ser encontrados e vivenciados diariamente através dos valores existenciais, mesmo quando estamos diante de cenários difíceis impostos pela vida. É importante destacar que a Logoterapia não é uma abordagem que busca incentivar uma forma de existir romantizada e distante das realidades difíceis e dos contextos biopsicossociais de cada sujeito, uma vez que todos esses fatores são levados em consideração no processo psicoterapêutico de cada indivíduo.

É preciso deixar perfeitamente claro, no entanto, que o sofrimento não é de modo algum necessário para encontrar sentido. Insisto apenas que o sentido é possível mesmo a despeito do sofrimento – desde que, naturalmente, o sofrimento seja inevitável. Se ele fosse evitável, no entanto, a coisa significativa a fazer seria eliminar sua causa, fosse ela psicológica, biológica ou política. Sofrer desnecessariamente é ser masoquista, e não heroico. (FRANKL, 2019, p.138)

A Prateleira do Amor e as relações amorosas na era digital

O conceito da Prateleira do Amor, cunhado por Zanello (2022), funciona como uma metáfora capaz de nos explicar de forma lúdica sobre como as relações heteronormativas se desencadeiam diante de uma estrutura regida pelo patriarcado. Quando pensamos em uma prateleira de supermercado, sabemos que os produtos não são expostos de qualquer maneira. Existe toda uma lógica estratégica por trás da exposição de cada mercadoria em um comércio, a fim de que o consumidor seja influenciado a comprar o produto “do momento” – aqueles que são mais caros e desejados dentro do mercado. Seguindo essa lógica, Zanello (2022) evidencia que o patriarcado induz que mulheres heterossexuais se “exponham em prateleiras” em busca de viver um romance.

As mulheres seriam, então, como produtos a serem escolhidos para viver um relacionamento, e o comprador – e, por consequência, o avaliador de qualidade – seriam os homens. Assim, a prateleira é regida por sistemas machistas, racistas, etaristas, gordofóbicos, entre outras classificações preconceituosas, uma vez que quanto mais branca, jovem e magra a mulher for, mais pretendentes – ou consumidores – estarão dispostos a escolher se relacionar amorosamente com essa mulher.

Zanello (2022) destaca, no entanto, que nem mesmo as mulheres que mais se encaixam dentro dos padrões impostos estão livres do sofrimento psicossocial advindo do fenômeno das prateleiras do amor. Obviamente, existe um grau de sofrimento destoante se compararmos as mulheres que menos se encaixam às que são mais privilegiadas diante do sistema. Mas, o que Zanello (2022) observa é que, muitas mulheres são “escolhidas” quando novas e, após anos de casamento, os maridos acabam traindo-as ou trocando-as por outras mulheres mais novas e dentro dos padrões vigentes do momento. A prateleira do amor se mostra, então, como um sistema rígido que segue um ciclo difícil de ser quebrado, já que as próprias mulheres são socialmente educadas a se preocuparem mais em serem escolhidas do que em exercer o papel de escolha. Assim, “ser subjetivada na prateleira do amor torna as mulheres extremamente vulneráveis, visto que, se é necessário ‘ser escolhida’, nem sempre importa tanto quem as escolha. Isso empodera os homens” (Zanello, 2022, p. 43).

Compreendendo o funcionamento cíclico das prateleiras do amor, podemos nos questionar, também, sobre quais são as nossas motivações para buscar viver uma relação afetivo-amorosa. Zanello (2018, 2022) argumenta que “em nossa cultura, os homens aprendem a amar muitas coisas e as mulheres aprendem a amar os homens”. De fato, enquanto os homens são estimulados desde cedo a desenvolverem hobbies ou a aprenderem algum esporte, por exemplo, as mulheres são bombardeadas com brincadeiras que estimulam o cuidado ao lar e, principalmente, com desenhos que desencadeiam o desejo de viver uma linda história de amor verdadeiro (Zanello, 2022).

Ademais, é interessante observar que mesmo diante da transitoriedade dos contextos sociais em que estamos inseridos, a prateleira do amor continua a se encaixar perfeitamente como um sistema rígido que guia as estruturas sociais pela busca por relações amorosas heteronormativas. Na era digital e de fácil acesso a inúmeras informações, podemos observar como as pessoas buscam iniciar relacionamentos através de aplicativos como o Instagram e Tinder (aplicativo de relacionamento), redes sociais onde “mostra-se o que possui valor e capacidade de gerar interesse aos outros. Omite-se aquilo que é frágil, que não promove a imagem de maneira positiva” (Garcia, 2020, p. 31).

Sob uma busca enviesada por amores perfeitos e ideais – e também sob a tentativa de serem vistas como tal – é comum que mulheres sejam acometidas pelo sentimento do vazio existencial, uma vez que o foco está direcionado para a busca de uma conquista – o relacionamento. Logo, evidencia-se como a falta de vivência dos valores existenciais pode afetar a vida de mulheres que focam mais na busca por relacionamentos – e o status que um relacionamento pode proporcionar perante à sociedade – do que na busca por sentidos:

O ser humano corre o risco de passar a vida toda preso ao exterior, à fama, ao status, em busca de estar na mira dos holofotes e se esquece de priorizar os valores internos que nortearão o seu ser e agir no mundo, e que, inclusive, cooperam para o bem estar social. Em outras palavras, por estar preso às máscaras e ignorar as sombras, buscas e realidades inacessíveis, colocam-se metas inatingíveis e o indivíduo passa a vida toda em busca de um objetivo inalcançável – pois sequer compreende que os defeitos, erros e contratempos também fazem parte da vida.  (MOREIRA, 2020, p.36)

Cabe destacar, no mais, que encontrar sentidos existenciais através de relacionamentos afetivos-amorosos é sim uma possibilidade para mulheres. A reflexão proposta aqui é justamente a de buscar compreender que a trajetória dessas vidas não deveria ter foco – e em muitos casos, obsessão – em algo que é imposto, e não naturalmente desejado.

A renúncia, esse “esforço” que é exigido dessas mulheres só é possível se superarmos a idolatria, quando conseguirmos convencer essas mulheres de que felicidade no amor e a maternidade são uma possibilidade de dar um sentido para a vida, mas não a única possibilidade. (FRANKL, 2019,p.168)

Diante de toda a lógica das prateleiras do amor e da idolatria que cerca o objetivo de ser escolhida e viver um relacionamento amoroso, é provável que as mulheres inseridas nesse sistema acabem existencialmente frustradas, vivenciando o vazio existencial. Contextualizando esse fenômeno na contemporaneidade, acrescenta-se ainda o fator das relações construídas a partir do dinamismo das redes sociais, onde impera o imediatismo. De acordo com Bauman (2004), as relações na era digital estão cada vez mais líquidas. Devido à quantidade das inúmeras informações às quais somos expostos – e também expomos – em redes sociais, é comum que as pessoas desenvolvam um interesse por vários “perfis”, seguindo uma lógica de consumo instantânea (Souza, 2021). Percebe-se de forma integral, então, que na era digital e das relações líquidas, as mulheres que vinculam seus sentidos de vida somente ao desejo de vivenciar um relacionamento amoroso podem se frustrar, ainda mais, caso se insiram nas “prateleiras do amor digital”: a exibição de si mesma nas redes sociais como um produto a ser escolhido, sempre buscando agradar ao próximo, e não a si mesma. 

O conformismo e totalitarismo presentes na busca por relacionamentos

Diante do fenômeno existencial intitulado como Prateleira do Amor por Zanello (2022), percebe-se que, independentemente do contexto histórico em que as mulheres estejam vivenciando, o conformismo e o totalitarismo atuam como meios para adequação ao sistema das prateleiras. Isso ocorre porque, em primeira instância, somos seres sociais: em certos contextos permeados pelo vazio existencial, o sujeito pode adotar como resoluções possíveis para essa falta de sentido, a direção àquilo que os outros querem que a ele faça (totalitarismo) ou com aquilo que os outros fazem (conformismo) (Frankl, 2008).

Logo, uma vez que as mulheres são educadas e socializadas em face de uma lógica patriarcal, escolhas atravessadas pelo totalitarismo e o conformismo acabam sendo úteis como uma forma de “se encaixar” àquilo que é imposto pela sociedade heteronormativa: uma mulher só estará completamente realizada quando estiver vivenciando um relacionamento amoroso. No entanto, Frankl (2008) destaca que ambos os conceitos em questão – conformismo e totalitarismo – são consequências de um vazio existencial. Ao observar a vida como ela é, cotidianamente, podemos nos questionar: quantas mulheres estão em busca de viver um relacionamento por pressão familiar? Quantas estão em busca de construir uma “história de amor” apenas porque todo o seu ciclo de amigas já está vivenciando um relacionamento? Será que apenas um relacionamento amoroso é capaz de trazer sentido existencial para as mulheres? Quais são as outras possibilidades de encontrar sentidos de vida em meio à nossa existência?

Ademais, cabe também refletir sobre até que ponto um relacionamento amoroso ocupa a real posição de um sentido existencial na vida de mulheres heterossexuais, uma vez que muitos sujeitos buscam construir relações com base em posições de status, poder e prazer, indo na contramão da busca por Sentidos de Vida, que guiam a nossa existência através da realização de valores que, de fato, correspondam com a Vontade de Sentido e subjetividade de cada ser. É importante lembrarmos que, de acordo com Frankl (2008), a busca incessante e direcionada diretamente à felicidade – aqui especificamente, ao amor – acaba nos afastando daquilo que é almejado, sendo necessário buscar vivenciar valores existenciais para que, então, a felicidade surja como consequência.

Posto isso, buscando quebrar o rígido ciclo das prateleiras do amor, refletir sobre as inúmeras possibilidades de valores existenciais que podem colaborar para a vivência dos nossos sentidos de vida pode vir a ser um exercício interessante para mulheres heterossexuais. Assim, podemos entender caminhos possíveis para direcionar o nosso fazer-ser-no-mundo, indo além e superando o conformismo e totalitarismo, que tanto nos influencia.

Referências
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