“A educação deve possibilitar ao corpo e à alma toda a perfeição e a beleza que podem ter”.  Platão

Há tempos, nós professores 40+, constatamos a insuficiência em investir somente nas competências cognitivas na prática pedagógica.

O profissional educador que vivenciou a transição do “quadro e giz” para a era digital é testemunha da mudança comportamental na vivência escolar no que se refere ao modo de aprender, expressar emoções e socializar-se. 

Diante desta nova demanda, a [1]Base Nacional Comum Curricular – BNCC define as Competências Socioemocionais, presentes em todas as dez aprendizagens gerais as quais todos os alunos têm direito a adquirir.

Para tanto, tal inserção responde a uma necessidade crescente na escolarização de crianças e adolescentes, haja vista questões pertinentes ao tema, tais como: isolamento social, baixa tolerância a frustação, prática de bullying, dificuldade na formação de vínculo, diminuição da autoestima e da autoconfiança; tudo isso impacta diretamente no bom aproveitamento estudantil.

Para abordar o tema de forma didática, cito aqui o filme Divertida Mente 2, lançado este ano com recorde de bilheteria e, novamente, a Pixar cria uma animação que dialoga com todas as idades.  Dessa forma, sugiro a você leitor, que assista as duas edições Divertida Mente 1 e 2 a fim de obter maior compreensão e aproveitamento das propostas que se seguem.

Identidade: Quem sou eu?

A crise de identidade na animação Divertida Mente (no original Inside Out) é destacada na vida da protagonista Riley, uma menina de 11 anos, personagem que foi inspirada na vida da filha do Diretor Pete Docter, onde aborda no filme fatos de sua relação paterno filial. 

No princípio, ainda um bebê, cada emoção foi apresentada ilustrando a psiquê e a matriz do script de vida: nascemos com as emoções básicas: alegria, tristeza, raiva, medo e repulsa. E para quê? Esse complexo sistema biológico adaptativo é responsável pela manutenção da vida e preservação da nossa espécie.  É justamente, no centro de controle, dentro da cabeça da Riley que cada emoção é ilustrada e o diálogo entre elas denotam o funcionamento mental.

O reconhecimento da própria identidade é um dos pilares do pleno desenvolvimento da infância.

Para este propósito podemos aplicar o conceito das mudanças biológicas na adolescência tão bem ilustrado com as ilhas.

Na transição da infância para a adolescência, algumas ilhas começam a desabar, sendo que a primeira foi a “Ilha da Bobeira”: reservatório do humor inocente, espontaneidade, diversão, imaginação e criatividade.

Nesta cena, vale propor aos alunos uma boa conversa sobre antigos e novos gostos, formar grupos por afinidades elegendo as preferências da infância, após duplas e trios com as preferências atuais. No desfecho, deve-se salientar a noção de valorizarmos o passado e atualizar o presente.

Quanto a grande ilha da família, ela surge no Divertida Mente 2 diminuída, pois a adolescência é a fase de afastamento das figuras parentais de autoridade e busca de novos grupos sociais por afinidades e identificação.

No tocante a isto, a história da família também auxilia compreensão de si e formação da identidade.  Para tanto, criar um “Scrapbook” – livro confeccionado com técnicas artísticas de recortes e colagens expressando recordações felizes e preciosas, é uma excelente proposta que pode ser ampliada para além das aulas de Artes, envolvendo Língua Portuguesa, História, de acordo com o material produzido pelos alunos.

Vozes Na Cabeça: o constante diálogo interno

“Eu que me aguente comigo e com os comigos de mim.” (Fernando Pessoa)

Como afinar a orquestra que toca incessantemente em nossa mente?

Em primeiro lugar, reconhecendo-as!

Na continuidade do filme, a Riley já está com 13 anos vivenciando os desafios da adolescência, ponte que liga a infância a juventude adulta, regada a mudanças biológicas, psicológicas e sociais.

Educação emocional e a interação social

“Nada está perdido se está divertido.”
(Alegria – Divertidamente 2)

STEINER (1997), criou o termo “Educação Emocional” na década de 70, objetivando o desenvolvimento de habilidades emocionais e aptidões relacionais. O referido teórico afirma que, não basta reconhecer as próprias emoções e a dos outros, é necessário saber quando expressá-las,conte-las ou até mesmo adiá-las até um momento propício.

Neste sentido, podemos considerar que, a ação primordial para ser educado emocionalmente seja buscar o autoconhecimento.  Para tanto, promover atividades artísticas e literárias para expressão e autorreflexão; jogos cooperativos para suscitar valores e reconhecer limites, são formas pedagógicas que oportunizam cada indivíduo a compreensão de si em seu diálogo e funcionamento interno; como resultado, as aptidões relacionais serão ampliadas sistematicamente.

Vimos que, a referida produção cinematográfica elucida os modelos de amizade da Riley.  Na infância, a Meg era a sua melhor amiga com a qual criou inúmeras memórias felizes, enquanto ainda morava em Minnesota. Porém, em transição para a pré-adolescência, os interesses mudaram, e  Bree e Grace assumem esse papel no sociograma da protagonista, porque além de serem suas colegas de classe são também parceiras de equipe do time de Hóquei, acrescentando o status de garotas descoladas.  Então, podemos propor a turma que criem o seu próprio sociograma: colegas, parceiros para estudar, amigos para brincar, e uma outra lista de amigos onde sentimos afinidades tanto para brincar, quanto para estudar.  Assim, podemos ampliar a noção de diferenças, respeito mútuo, cooperação desenvolvendo competências sociemocionais.

Vale reforçar que, as premissas postuladas na BNCC referendando as Competências Socioemocionais, nascem da necessidade coletiva de desenvolver a inteligência intrapessoal (Ilustração: cenas que se referem ao centro de si) e interpessoal (Ilustração: cena em que a Tristeza e a Vergonha formam uma dupla produtiva  para solucionar o problema), porque a forma como lidamos com as emoções determinam a qualidade de nossas interações sociais.

Segundo Goleman, “Inteligência Emocional” é a capacidade de identificar os nossos próprios sentimentos e o dos outros, de nos motivarmos e gerirmos os impulsos dentro de nós.

Os cinco pilares da Inteligência Emocional são:

Conhecer as próprias emoções

Controlar as emoções

Ter automotivação

Ter empatia

Saber se relacionar interpessoalmente

Para Steiner, o indivíduo emocionalmente educado, consegue enfrentar situações difíceis, evitando discussões infrutíferas, impedindo que um mero embate gradue para agressões verbais ou até mesmo física.  Saber o que sente, pensar sobre o que sente e decidir a forma mais adequada para expressar-se é um ganho próprio das aptidões da inteligência emocional e relacional.

Em síntese, confirmamos que, “O desenvolvimento da identidade e da autonomia estão intimamente relacionados com os processos de socialização. Nas interações sociais se dá a ampliação dos laços afetivos que as crianças podem estabelecer com as outras crianças e com os adultos, contribuindo para que o reconhecimento do outro e a constatação das diferenças entre as pessoas sejam valorizadas e aproveitadas para o enriquecimento de si próprias.”  (RCNEI, 1998)

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular. Brasília, 2017.
Referencial curricular nacional para a educação infantil /. Ministério da Educação e do Desporto, Secretaria de Educação. Fundamental. — Brasília: MEC/SEF, 1998
GARDNER, Howard. Inteligências Múltiplas: a teoria na Prática. Porto Alegre: 2000.
GOLEMAN, Daniel. Inteligência Emocional: a teoria revolucionária que redefine o que é ser inteligente – 2. ed.Rio de Janeiro: Objetiva, 2012.
STEINER, Claude. Educação Emocional. Revista Brasileira de Análise Transacional, UNAT, Edição Especial, p.78 à p.98, setembro – 2019.