O termo Psicologia Organizacional e do Trabalho, empregado desde a década de 1990, tem por objetivo contemplar a atual diversidade da área, de modo a propor a existência de dois grandes eixos de fenômenos que envolvem aspectos psicossociais: as organizações, enquanto ferramenta social formadora de coletivos humanos e o trabalho, enquanto atividade básica do ser humano reprodutora de sua própria existência e da sociedade (Bastos, 2003).
A globalização financeira e a mundialização da precarização social, juntamente com as inovações tecnológicas e as novas formas de gestão, causaram rápidas transformações no mundo do trabalho. No entanto, o pensamento tradicional das áreas da Medicina do Trabalho, da Saúde Ocupacional e da Psicologia dão pouca atenção para essas mudanças e para o aspecto do trabalho como mediador de integração social, seja pelo valor econômico, seja pelo valor cultural, com importância fundamental na constituição da subjetividade de todas as pessoas. Os aspectos sociais, econômicos e organizacionais, assim como os processos psicossociais em suas repercussões sobre a subjetividade do trabalhador, são minimizados ou ignorados (SELIGMANN-SILVA, 2010; BERNARDO, 2010; MAENO, 2010 e KATO, 2010).
Relação homem-trabalho
Para Codo, Sampaio e Hitomi (1993), a organização do trabalho exerce sobre o homem uma ação específica, cujo impacto é o aparelho psíquico. Em certas condições, emerge um sofrimento que pode ser atribuído ao choque entre uma história individual, portadora de projetos, de esperanças e de desejos e uma organização do trabalho que os ignora. Esse sofrimento, de natureza psíquica, começa quando o indivíduo, no trabalho, já não pode fazer nenhuma modificação na sua tarefa no sentido de torná-la mais conforme às suas necessidades fisiológicas e a seus desejos psicológicos, isto é, quando a relação homem-trabalho é bloqueada.
Como dito, o trabalho é então um importante constituinte da vida social e psíquica do sujeito, tendo grande influência em seu desenvolvimento, que pode ser satisfatório ou não. Assim, organizações do mundo todo têm dado cada vez mais importância ao bem-estar e qualidade de vida ocupacional e é grande o número de pesquisas acadêmicas com compromisso científico que tratam destes assuntos e de suas singularidades. Um dos principais desafios na área de Psicologia Organizacional e do Trabalho é compreender como interagem os múltiplos aspectos que integram a vida das pessoas, grupos e organizações em um mundo em constante transformação, de modo a propor formas de promover, preservar e restabelecer a qualidade de vida e o bem-estar (Zanelli & Bastos, 2004). Neste sentido, e também considerando o recente momento de crise sanitária causada pela pandemia de Covid-19 em que se encontra a população mundial, o psicólogo organizacional tem um importante papel no desenvolvimento e manutenção destes temas, que podem promover engajamento e ganhos na qualidade de vida no trabalho e pessoal e, em adição, empregados mais satisfeitos tendem a apresentar melhores resultados em seus desempenhos, gerando benefícios, aumento da produtividade e lucro para a organização.
Áreas de atuação
O psicólogo, no ambiente empresarial, pode atuar de forma generalista ou específica em vários subsetores que, geralmente, encontram-se subordinados a um departamento de recursos humanos, tais como: recrutamento e seleção (desenvolvendo e aplicando métodos de recrutar e selecionar, podendo aplicar e corrigir testes psicológicos – desde que o profissional tenha registro ativo no conselho profissional), benefícios (conduzindo estudos e pesquisas sobre benefícios que possam promover o bem estar e consequente envolvimento dos empregados, bem como administração destes benefícios), desenvolvimento humano e organizacional (trabalhando no alinhamento entre o crescimento do empregado e o desenvolvimento da organização), desenvolvimento de carreira (construindo e atuando em planos e estratégias de crescimento e trilhas de carreira), remuneração (promovendo e cuidando de estratégias de compensação direta ou indireta, fixa ou variável, salários e remuneração, que pode estar em conjunto com áreas de performance e desempenho), treinamento (construindo e gerindo trilhas de treinamento e universidades corporativas, a fim de prover ao empregado habilidades comportamentais ou técnicas para o exercício de suas funções), dentre outros, na linha temática de gestão de pessoas, dependendo da estruturação das atividades de cada empresa.
Considerando esta gama de possibilidades de atuação, é muito importante que a Psicologia, enquanto ciência aplicada ao meio empresarial, atue em modelos de parceria com outras áreas da organização. Também, faz-se necessária estreita interface com outras áreas do conhecimento, tais como Sociologia, Antropologia, Ciências Políticas, Educação, Economia e Administração (Bastos, 2003). Esta interface é muito importante, pois do psicólogo organizacional poderão ser exigidas habilidades para além da Psicologia, como análise de dados, conhecimento de idiomas, visão estratégica, criação e manutenção de planilhas e banco de dados, cálculos e outros, dependendo, obviamente, de seu nível de experiência e requisitos da posição que ocupar.
Desenvolvimento de carreira
A formação de um psicólogo organizacional acompanha o fluxo de seu próprio desenvolvimento de carreira, que começa a ser construído ao longo de sua formação acadêmica. Uma das principais portas de entrada no meio organizacional são as oportunidades de estágio e, embora seja grande o número de oportunidades e de profissionais ou estagiários que atuam em recrutamento e seleção, ao longo do tempo, os psicólogos abriram espaços, muito mais em função da sua competência pessoal do que a partir dos critérios legais e profissionais, já que, “a rigor a única atividade privativa do psicólogo do trabalho é a aplicação e avaliação de testes psicológicos” (Neri, s.n.d). Isto se explica também pelas grandes mudanças ocorridas ao longo do tempo na filosofia empresarial, onde o papel do setor de recursos humanos deixou de ser apenas operacional (admissões, demissões, folha de pagamento e atendimento a empregados) para tornar-se uma área cada vez mais estratégica e ampla, atuando no desenvolvimento de profissionais e organizações em diferentes aspectos.
Para profissionais formados que desejam atuar no ambiente organizacional e que ainda não tenham experiência, a dica é dedicar-se à formação complementar, munindo-se de conhecimento, buscando cursos que sejam relevantes para o setor organizacional de recursos humanos e também o desenvolvimento de idiomas, habilidade bastante requisitada principalmente em organizações multinacionais, para então apresentar diferenciais que não sejam somente a experiência de trabalho e se destacar em processos seletivos.
Destaque ao trabalho interdisciplinar
Como em todas as áreas profissionais, há desafios e questões que ainda precisam ser fomentadas, estudadas e melhor estruturadas, no que concerne à psicologia organizacional e do trabalho e à atuação do psicólogo nas organizações. Se faz necessário investir e cuidar do papel de destaque que a Psicologia conquistou ao longo dos anos, principalmente no que tange ao ambiente empresarial e industrial. O psicólogo organizacional precisa, cada vez mais, fazer conhecida sua atuação, resultados e contribuições, trabalhando interdisciplinarmente com outras áreas e investindo em seu posicionamento, a fim de que sua prática seja cada vez mais valorizada. Ainda, mesmo atuando em meio industrial, não podemos esquecer também que o trabalho do psicólogo deverá “ser pautado nos princípios da qualidade técnica e do rigor ético”, “promovendo saúde e qualidade de vida de cada sujeito e de todos os cidadãos e instituições”, conforme estabelecido no texto de juramento profissional, no artigo 3º da resolução nº 002/2006 do Conselho Federal de Psicologia. Portanto, cabe salientar que o fator humano e social nas organizações não pode ser desconsiderado em privilégio do fator econômico, e cabe ao psicólogo organizacional desenvolver meios de equilibrar ambos os aspectos.