Para entender a proposta da Terapia Focada na Compaixão, fomos ouvir a Mestre e Doutora em Psicologia Clínica, a Dra. Maria Amélia Penido, professora da PUC-Rio.

1- Como identificamos hábitos que são prejudiciais a nós e começamos a praticar uma atitude de autocompaixão?

Maria Amélia – A Terapia Focada na Compaixão (TFC), proposta por Paul Gilbert, é uma terapia que integra conceitos do Budismo, da Psicologia Evolucionista e das Neurociências para compreensão do sofrimento humano. A vergonha e autocriticismo são fatores que podem contribuir para manter problemas mentais. Vários estudos mostram que autocriticismo e vergonha aparecem como aspectos centrais em transtornos psicológicos, como ansiedade, depressão, trauma, transtornos de personalidade, psicose e transtornos alimentares.

Desenvolver compaixão é um fator que aparece associado à diminuição do sentimento de exclusão e diminuição do autocriticismo e vergonha. O hábito de adotar uma atitude muita autocritica com nós mesmos está associado a pior saúde mental. A autocompaixão pode ser vista como uma estratégia de regulação emocional extremamente útil, em que os sentimentos e pensamentos negativos não são evitados, mas sim encarados com uma consciência clara, cuidadosa, compreensiva e com um sentido de partilha comum da experiência de ser humano.

2- Qual o principal objetivo da Terapia da Compaixão? Ela é indicada para casos de ansiedade e depressão, que cresceram muito com o isolamento social?

Maria Amélia – A Terapia Focada na Compaixão tem por objetivo ajudar as pessoas a acessar e estimular suas motivações, emoções e competências afiliativas, que podem ser parte da experiência do self compassivo. Isso inclui intervenções como o uso da respiração, postura, expressões faciais, tons de voz e outros exercícios. Procura desenvolver no trabalho terapêutico uma série de exercícios de cultivo da compaixão pelo treino atencional e prática de mindfulness, mentalização, cultivo da autoidentidade compassiva, uso de imagens mentais e escrita compassivas, e o ato de realizar comportamentos compassivos regularmente. Sim, a TFC tem aplicabilidade em casos de depressão e ansiedade. A ideia é fortalecer um sistema interno de aconchego e acolhimento como forma de lidar com as emoções e desenvolver aceitação e autocompaixão em vez de autocrítica exagerada.

3- Qual a diferença entre autocrítica severa e autocorreção compassiva?

A autocrítica refere-se a uma forma de autojulgamento e autoavaliação negativos, que podem ser direcionados a diversos aspectos do self, como a aparência física, as emoções, os comportamentos, os pensamentos, a personalidade e os atributos intelectuais. Ao contrário da autocrítica, considera-se que a autocompaixão é uma resposta alternativa mais adaptativa à falha percebida.

Na autocritica severa, funcionamos como nosso inimigo, nos agredimos e punimos diante de falhas, remoendo e cultivando sentimentos de raiva, arrependimento, culpa. Já na autocorreção compassiva procuramos compreender que é possível aprender com os erros, que faz parte da natureza humana errar e sofrer, é parte natural da vida.

4- Vivemos em uma cultura no ocidente que ensinou os indivíduos por sistemas de punição e reforçamento. O entendimento da autocompaixão nos ajuda a mudar algumas crenças?

O contexto em que vivemos, nossa cultura influencia nosso modo de pensar, sentir e se comportar. Vivemos, hoje, em um mundo que predominantemente propaga valores ligados à individualidade e busca de sucesso. Muitas vezes o ter é considerado mais importante que o ser. A competitividade é mais estimulada que a cooperação. Aparentar o tempo todo estar bem e dando conta de tudo – conhecida como a cultura de produtividade e bem-estar – muitas vezes contribui para padrões elevados de autocobrança e sentimentos de vergonha e humilhação diante de erros. Uma sociedade que pune o erro, associando-o à vergonha e humilhação, sufoca o potencial criativo do ser humano.

Somos resultados de nossas aprendizagens e os erros e acertos são partes fundamentais de quem somos. Desenvolver comportamentos pro-sociais de empatia, cooperação, compaixão e autocompaixão pode nos ajudar a flexibilizar valores, resgatando nossa humanidade comum e construindo uma sociedade mais solidária.

5- Poderia citar exercícios simples que podemos fazer no dia a dia baseados na Teoria focada na Compaixão?
Gosto de duas práticas de meditação, descritas na literatura, com o foco em desenvolver afeto positivo, como a meditação compassiva e a meditação focada na bondade e amor, também chamada de treino em afeto positivo. Amor, bondade e compaixão são vistos como atributos de uma postura não julgadora. Sem eles, julgamentos negativos podem interferir em manter uma mente com atenção plena. Na meditação compassiva, o foco da atenção é direcionado a aumentar a consciência sobre o sofrimento de todos os seres vivos e no desejo em aliviar esse sofrimento. Esse tipo de meditação também pode incluir a autocompaixão, direcionando o foco de atenção para o self, buscando estar aberto ao próprio sofrimento, experimentando sentimentos de calor, cuidado e compreensão direcionados ao eu. Na meditação focada no amor e bondade, o foco é desenvolver o sentimento de amor e compaixão pelo bem-estar do próximo. Essas meditações ajudam a mudar a visão básica sobre o self na relação com outros e aumentar empatia e compaixão.

E MAIS…

Workshop on-line

Se você tem interesse em conhecer mais sobre os conceitos e a prática da Terapia Focada na Compaixão, basta se inscrever no workhop on-line, que será oferecido pela Dra. Maria Amélia Penido em parceria com a FOCO (Instituto Carioca de TCC) através do website: www.focotcc.com.br. O evento acontecerá no próximo dia 21 de novembro, entre 9h e 16h30.