É certo que a Covid-19 foi um dos maiores desafios para a medicina do século XXI. Em todo o mundo, milhares de profissionais da saúde tiveram suas vidas colocadas em risco, e um número assustador, apesar dos cuidados, não conseguiu escapar do contágio. Muitos tiveram que viver isolados da família, pais idosos, filhos pequenos e não foi insignificante a quantidade de óbitos entre os médicos e enfermeiros.
Entretanto, como toda epidemia, a Covid-19 trouxe também, a outras camadas profissionais, a obrigação de continuar sua missão. E os professores estão entre as categorias que mais foram desafiadas a superar seus próprios conhecimentos e limites. Tornaram a tecnologia disponível, sua maior aliada, buscando aprimorar seus conhecimentos para manter a qualidade do trabalho e prosseguir sem esmorecer. Mas, o que parecia apenas uma adaptação, a princípio momentânea, logo se mostrou ser tarefa bastante complexa, pois não se tratava apenas de tornar as salas presenciais em virtuais. Foi necessário aprender novas técnicas e replanejar pedagogicamente o ano letivo. Não foi – e ainda não é – uma tarefa simples essa de trocar o giz pelo celular ou a lousa pelo computador, se considerarmos a imensidão de nosso país e as condições socioeconômicas tão diferentes. Há uma série de aprendizados que o uso da tecnologia impõe e que, em geral, eram pouco utilizados, mesmo nas escolas das grandes capitais.
Diversos fatores
Todo esse novo cenário criou ansiedade, insegurança, preocupação, medo, novas cobranças. De um lado haviam muitos alunos, em geral de escolas públicas, com pouco ou nenhum acesso à tecnologia e à internet. Outros apresentaram dificuldades em seguir as aulas com a frequência necessária, pois tinham um número limitado de computadores na casa e as aulas aconteciam no mesmo horário para todos os irmãos.
De outro, haviam as crianças com dificuldades pessoais de acompanhar esse formato de aula remota e os professores tiveram que adaptar conteúdo e metodologia para que a maioria conseguisse seguir e acompanhar o aprendizado necessário.
É de esperar que um grande estresse tenha alcançado boa parte dos professores que, apesar de seus esforços, não conseguiram dar conta de tantas mudanças inesperadas. Ao longo da quarentena, as expectativas frustradas foram se acumulando e a ansiedade gerou sintomas de falta de ar, tristeza, insônia, entre outros, a esses profissionais.
Além da necessidade de prosseguir no trabalho, a nova adaptação ao formato de aula remota acarretou uma sobrecarga horária diante das telas, tanto para ensinar, como para aprender a lidar com a novidade: afinal, poucos profissionais tiveram oportunidade de ser preparados devidamente. Uma sensação de sobrecarga e de ineficiência tomou conta de muitos, trazendo uma reação complexa com componentes físicos, psicológicos, mentais e hormonais, frente a uma situação que demanda adaptação ou ameaça à estabilidade mental ou física da pessoa.
O tal novo normal
Agora, estamos mais uma vez, diante da insegurança e de uma angústia que toma conta das escolas e das famílias. O debate sobre a volta às aulas presencias, mesmo que com regras e normas do tal novo normal, gera novamente a certeza de que os professores não estão totalmente preparados para cuidar dos alunos e de toda a complexidade da situação. Afinal, as variáveis são muitas, desde voltar a planejar estratégias pedagógicas para dar continuidade ao trabalho com classes muito menos homogêneas que antes em termos pedagógicos, a procurar outros profissionais que garantam a instalação de protocolos de saúde com a presença de materiais necessários em quantidade suficiente. Afinal, subdividir o espaço físico, manter a higienização, a presença de toalhas, álcool, máscaras não é o todo dessa história. É muito importante considerar a movimentação dentro da escola, que como sabemos é grande, o fator da idade das crianças, que quanto menores, exigem mais atenção, além da enorme responsabilidade nos cuidados para evitar a própria contaminação e das crianças.
As aulas virtuais trouxeram sobrecarga de trabalho, mas gerou acomodações em torno da segurança contra o vírus e a volta ao presencial, ainda pode ser prematuro no sentido de avaliar a falta de protocolos que supram todas as situações que podem acontecer em uma escola.
O professorado teme que, neste momento em que estão pautados em meses de trabalho exaustivo, o retorno ainda venha testar novamente sua saúde mental, com excesso da carga de responsabilidade e pressão vindas das mantenedoras e das famílias, que também sofrem com os desafios do momento e formam um verdadeiro efeito cascata de emoções e sentimentos desgastantes. A não compreensão total do que vai ser daqui para frente, gera insegurança e estresse a todos os envolvidos.
Agravamento da situação
Ainda que prejuízos emocionais e de aprendizado venham se acumulando, muitos defendem que a situação pode piorar com o agravamento da probabilidade de contágio e a pressão emocional. Sem garantia de segurança para todos, não há por que abrir as escolas e correr vários riscos, entre eles o de voltar a fechar as portas como ocorre agora em alguns países europeus.
Por outro lado, mantenedores que sofreram perdas consideráveis neste ano, terão mais uma sobrecarga na adaptação ao ensino presencial, pelas exigências que este, nas atuais circunstâncias, requer.
Se pensarmos que estamos basicamente no final do ano letivo, não há como suprir eventuais perdas pedagógicas. E sobre o convívio entre pares, sabemos da importância no desenvolvimento, mas não podemos esquecer que na imensidão de nosso país, as experiências pessoais de cada criança e professor com a pandemia foram diferentes. Não apenas em relação às aulas escolares, mas às perdas materiais, os lutos vividos pelas famílias e toda a adaptação que as crianças também sofreram dentro de casa.
Casos de crianças que foram afetadas em sua saúde mental não são poucos. Não estar na rotina escolar, não foi nada fácil para elas, afinal o desenvolvimento também se dá com o convívio social e crianças e jovens perderam isso de uma hora para a outra.
Ao longo do processo, podemos dizer que já houve uma certa adaptação e bem realista, mas o cansaço, o estresse e a insegurança permanecem, mesmo no novo cenário que tenta se firmar.
Há saídas pedagógicas a serem postas em prática e todos sabemos que as escolas já foram fechadas e reabertas no passado, durante guerras e pandemias e que nenhuma geração se ressentiu academicamente disso de uma forma drástica. Temos experiencias profissionais riquíssimas e habilidades criativas que nos ajudarão a encontrar soluções.
É hora de debater propostas relevantes e reais na Educação
Pensar em retomar em 2021, daria mais tempo e recursos físicos às escolas e um período de férias em dezembro para que todos, crianças, professores e familiares, pudessem descansar a cabeça e realinhar propostas possíveis para o novo ano.
Não acredito em catástrofe cultural em um país onde a escolaridade é tão diversificada. Acredito, sim, que essa diversidade começa a incomodar alguns setores, pois terão que dar explicações sobre essa pandemia educacional brasileira que se instalou bem antes da Covid-19.