A dificuldade em lidar com emoções e sentimentos é comum a qualquer ser humano. Mas ela é reforçada quando a busca pela solução é um desafio ainda maior. Essa é justamente a queixa de uma população enorme de sujeitos surdos que se deparam com a barreira da comunicação causada pela carência de profissionais habilitados em  Língua Brasileira de Sinais, ou Libras – considerada o principal meio de comunicação entre sujeitos surdos, bem como entre surdos e ouvintes.

Minha experiência como psicóloga mostrou que a questão já tem início no próprio seio familiar. Há inúmeros relatos de que a comunicação com os familiares é quase sempre difícil já que, em sua maioria, pouco sabem sobre língua de sinais, fomentando a falta de compreensão em uma conversa, por mais simples que seja.

Apesar dos surdos terem direito à mediação de um intérprete, há um certo desconforto em conversar com o psicoterapeuta na presença de um mediador, razão pela qual a necessidade do profissional de Psicologia ter formação em Libras ser imprescindível.

Realizo há algum tempo o atendimento psicológico via internet com surdos, buscando oferecer orientação para situações pontuais e objetivas. Este atendimento não tem a pretensão de substituir a psicoterapia presencial e tradicional nos consultórios, mas é uma aliada importante nestes tempos de pandemia da Covid-19.

Quanto à inclusão social de surdos, de nada adianta aprofundarmos este assunto sem ações eficazes e eficientes tanto do poder público quanto da sociedade, em geral. Especialmente no que se refere à psicoterapia, já que são poucos os profissionais com formação em Libras.

Importante disciplina

É necessário que os psicólogos sejam habilitados no uso da Libras durante os atendimentos, conhecendo a cultura surda e estratégias efetivas para essa população para um atendimento de qualidade. Para isso, os profissionais devem se habilitar para suprir as necessidades que possam lhe ocorrer para atender o paciente surdo, levando em conta, inclusive, as divergências culturais.

Contudo, o aprendizado em Libras só se efetiva através da convivência com a comunidade surda, através de associações e grupos de surdos.

Reforço a necessidade de todos os cursos da área da saúde (medicina, psicologia, enfermagem, serviço social, dentre outros) terem a disciplina de Libras como obrigatória, bem como oficinas de conscientização sobre a cultura e a identidade dos sujeitos surdos, a fim de que possam oferecer  atendimento de qualidade ao paciente surdo, promovendo assim um avanço da acessibilidade dessa população na área da saúde.

Entende-se que muito ainda pode e deve ser feito para a promoção do sujeito surdo, e da família como um todo, reconhecendo e respeitando suas particularidades como merecem, não com a necessidade de “super protegê-los”, mas, sim, educá-los e prepará-los para uma vida adulta, saudável e autônoma.

Também verifica-se a escassez de trabalhos que envolvem as necessidades da comunidade surda, no âmbito da atenção psicológica, bem como aos desafios para a atuação do Psicólogo.

O cenário da falta de recursos para a essa população ressalta a importância das discussões sobre o atendimento psicológico para surdos em Libras nos órgãos de competência, universidades e clínicas que entendem a relevância de oferecer um serviço de qualidade a qualquer ser humano que busca atendimento. Nosso papel é abrir cada vez mais caminhos, para que a acessibilidade deixe de ser uma exceção e torne-se a regra.

E MAIS…

O direito a um atendimento de excelência

No Brasil, a Libras (Língua de Sinais Brasileira) é reconhecida como meio legal de comunicação da comunidade surda do país através da Lei 10.436/2002, regulamentada pelo Decreto 5.626/2005.

A Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Lei 13.146/2015) reforçou e garantiu outros direitos relacionados à acessibilidade linguística às pessoas surdas. Partindo deste reconhecimento, o profissional de saúde é convocado a prestar um atendimento de excelência à população, levando em consideração a necessidade do domínio da língua de sinais, evitando problemas de comunicação, sintonia e empatia com o cliente.

Referências
CAPOVILLA, Fernando César; RAPHAEL, Walkiria Duarte; MAURICIO, Aline Cristina. Novo Deit-Libras: Dicionário Enciclopédico Ilustrado Trilíngue da Língua de Sinais Brasileira (Libras) baseado em Linguística e Neurociências Cognitivas, volume 2. Editora EDUSP, 2013
STROBEL, K. As imagens do outro sobre a cultura surda. Florianópolis: Editora da UFSC, 2008a.
SKLIAR, Carlos. A surdez: Um olhar sobre as diferenças. Porto Alegre: Mediação 1998
FERREIRA-BRITO, L. Integração social & surdez. Rio de Janeiro, Babel, 1993. Fundamentos em fonoaudiologia, vol. 1: Linguagem. Rio de Janeiro.
GESSER, Audrei. LIBRAS? Que língua é essa? Crenças e preconceitos em torno da língua de sinais e da realidade surda. São Paulo: Parábola Editorial, 2009.
OSORIO, Luiz Carlos, VALLE, Maria Elizabeth do.  Terapia de famílias: novas tendências.  Porto Alegre: Artmed, 2002. 
TÓPOR, José Carlos Santos; HUTZ, Claudio S.. Psicologia Positiva e o Constructo da Resiliência: uma Revisão Bibliográfica [online]. Psicologado, (2019) [viewed date: 25 Jul 2020]. Available from https://psicologado.com.br/abordagens/psicologia-positiva/psicologia-positiva-e-o-constructo-da-resiliencia-uma-revisao-bibliografica