Atualmente, observa-se uma tendência de associar o Transtorno de Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH) a pessoas que demonstram dificuldades em lidar com múltiplas tarefas simultaneamente.

No entanto, é importante distinguir entre características comuns como hiperatividade, desatenção e impulsividade, e o diagnóstico clínico. Embora muitos de nós possamos, em algum momento da vida, exibir tais traços, o TDAH é uma condição neurobiológica congênita que se manifesta durante a infância e, na maioria dos casos, persiste na vida adulta.

Resultados significativos

Diante desse cenário, a Musicoterapia surge como uma ferramenta complementar no tratamento do TDAH, auxiliando na atenuação de seus sintomas. Esse tratamento, quando realizado em conjunto com outros profissionais da saúde, como psicólogos e nutricionistas, pode trazer resultados significativos, integrando diversas abordagens para um melhor cuidado do paciente.

De acordo com estimativas da Associação Brasileira de Déficit de Atenção (ABDA), aproximadamente 2 milhões de brasileiros convivem com o TDAH. A entidade ressalta que a hereditariedade da condição é significativa, com uma taxa estimada de 76%. Isso significa que, em cerca de 60% dos casos, crianças diagnosticadas com TDAH possuem ao menos um dos pais com a mesma condição. Além disso, a ABDA destaca que a prevalência do TDAH entre adultos tem aumentado, especialmente entre as mulheres.

“Esse aumento pode estar relacionado a mudanças sociais e culturais, como o fato de que, no passado, esperava-se que as mulheres fossem mais calmas e organizadas”, explica a associação. Além disso, a pandemia de COVID-19 pode ter contribuído para o agravamento dos sintomas, pois o isolamento e as mudanças ambientais potencializaram a desatenção, a hiperatividade e a ansiedade em muitas pessoas.

Neurotransmissores e tratamento tradicional

O TDAH está intimamente relacionado com a atividade de neurotransmissores como dopamina e noradrenalina. Em pacientes com TDAH, há uma redução na disponibilidade dessas substâncias no cérebro, especialmente na região do córtex pré-frontal, o que prejudica funções executivas como planejamento, controle de impulsos e atenção. De forma contraintuitiva, o tratamento farmacológico geralmente envolve medicamentos estimulantes, que aumentam a produção desses neurotransmissores, ajudando a regular o comportamento e a atenção dos pacientes.

Contudo, além do tratamento medicamentoso, há diversas abordagens terapêuticas não farmacológicas que podem complementar os cuidados ao paciente, sendo a Musicoterapia uma delas. A música, por sua estrutura rítmica e melódica, tem o potencial de engajar, estimular e acalmar, criando um ambiente propício para trabalhar os sintomas característicos do TDAH.

Dentro da prática de Musicoterapia, existem diferentes formas de utilizar a música para captar a atenção de pacientes com TDAH e ajudá-los a lidar com a hiperatividade, desatenção e outros sintomas.

O TDAH é uma condição que afeta milhões de pessoas no Brasil e no mundo, e seu tratamento exige uma abordagem multidisciplinar. A Musicoterapia, quando inserida dentro desse contexto de cuidado, pode oferecer ferramentas poderosas para ajudar pacientes a lidarem com os sintomas do transtorno.

A música, com sua capacidade de organizar, relaxar e estimular, oferece um caminho único para promover o bem-estar e melhorar a qualidade de vida daqueles que convivem com o TDAH. Seja por meio da improvisação, do relaxamento ou do uso de ritmos ancestrais, a Musicoterapia tem muito a contribuir para o tratamento dessa condição neurobiológica.

E MAIS…

A seguir, apresentamos cinco sugestões de atividades que podem ser aplicadas:

Improvisação Musical: Embora muitos considerem a improvisação musical como algo totalmente espontâneo e desordenado, na realidade, ela segue certas estruturas, como ritmo, harmonia e acordes. Para um paciente com TDAH, essa atividade pode ser extremamente útil, pois permite que ele explore a criatividade dentro de limites pré-estabelecidos. Por exemplo, o musicoterapeuta pode tocar notas mais graves, enquanto o paciente é encorajado a improvisar notas agudas dentro da escala ou acorde proposto. Essa interação promove a concentração e pode canalizar a energia de maneira produtiva, trabalhando o hiperfoco de forma positiva.

Relaxamento com Sons da Natureza: O relaxamento pode ser uma estratégia eficaz para lidar com a hiperatividade. Sons calmos da natureza, como o canto de pássaros, o som de baleias ou até o barulho de cigarras, podem ser combinados com atividades criativas. Para crianças, uma sugestão é ouvir esses sons enquanto desenham os animais ou cenários que imaginam ao ouvi-los. Para adultos, a mesma técnica pode ser adaptada, mas com a sugestão de que façam desenhos livres, rabiscos ou expressões abstratas inspiradas pelos sons. Além disso, o uso de paisagens sonoras, como sons de florestas, rios ou mares, pode ser uma maneira eficaz de induzir um estado de relaxamento e melhorar o foco.

Musicograma: O musicograma é uma representação visual da música, como uma partitura animada que traduz a sequência e intensidade dos sons. Essa ferramenta pode ajudar pacientes com TDAH a focarem sua atenção na música, acompanhando visualmente o que está acontecendo no campo auditivo. Ao oferecer uma experiência visual e auditiva simultânea, o musicograma pode também reduzir a ansiedade e melhorar a capacidade de concentração.

Uso de Tambores: O som rítmico do tambor está profundamente enraizado na experiência humana. Considerado uma das formas mais primordiais de música, o ritmo do tambor nos remete às primeiras experiências sonoras do útero, como as batidas do coração da mãe. O paciente com TDAH pode ser estimulado tanto a ouvir quanto a tocar o tambor. A prática de batidas regulares e repetitivas pode ajudar a regular o ritmo interno do paciente, promovendo um senso de organização interna e ajudando a reduzir a hiperatividade. Além disso, o ritmo tem uma forte conexão com o sistema motor e a coordenação, áreas frequentemente desafiadoras para pessoas com TDAH.

Kokoleoko: O Kokoleoko é uma performance tradicional infantil de Gana, na África, que envolve canções e gestos rítmicos. Originalmente, essa prática era utilizada para acordar as pessoas ao som do canto do galo. Hoje, o Kokoleoko pode ser adaptado para o tratamento da hiperatividade, pois envolve movimentos corporais coordenados com música, promovendo o uso de todo o corpo em sincronia com a música. A combinação de ritmo, canto e gestos pode ser extremamente eficaz no tratamento do TDAH, especialmente para crianças, pois alia o movimento à música, estimulando tanto a concentração quanto o gasto de energia de forma lúdica.

AUTORES:

Renata Bastos é pesquisadora, psicóloga, professora e astróloga. Hoje atua na educação infantil municipal de São Paulo e se aprimora pelo estudo da Musicoterapia e Psicologia Antroposófica.
Gabriel Ribeiro Marques é arte-educador.  Atua como professor de Arte e Musicalização e é estudante de Musicoterapia pela FAMOSP.
Sirlene Souza é  Psicóloga clínica,especialista  em terapia cognitivo comportamental e saúde  mental, trabalhando com adolescentes e adultos. Hoje estudante de Musicoterapia pela FAMOSP
Otávio Hideki Chinen é psicólogo e psicanalista. O foco da clínica tem sido transtornos alimentares. Hoje estudante de musicoterapia pela FAMOSP.
Roger Marza é pai de um menino incrível que lhe ensina a ser uma pessoa melhor, companheiro de uma atriz e professora de teatro que é uma comédia. Mas também é jornalista free-lancer, saxofonista que faz música livre com sons da natureza e aluno de Pós-Graduação em Musicoterapia da FAMOSP.