Especialista no tratamento das dificuldades do relacionamento amoroso, o psicólogo Thiago Almeida, com doutorado em Psicologia pelo Departamento de Psicologia da Aprendizagem do Desenvolvimento da Personalidade do Instituto de Psicologia da USP, investigou o que homens e mulheres pensam sobre o amor no estudo “O conceito de amor: um estudo exploratório com uma amostra brasileira”. Ele entrevistou 600 voluntários (390 mulheres e 209 homens), com média de idade de 23,82 anos.

A partir de sua pesquisa, Almeida descobriu que homens são mais propensos a relacionar amor com sexo, enquanto as mulheres associam mais frequentemente o amor a romance. “Este apontamento coaduna com um grande aporte teórico que indica que, em termos de interesse sexual, os homens parecem estar mais interessados nos aspectos sexuais e associam o estímulo amor, mais frequentemente do que as mulheres, a elementos eróticos ou genitais”, pontua.

O estudo ainda concluiu que as mulheres são mais propensas a pensar no amor associado ao comprometimento emocional, à experiência de ser desejada pelo parceiro e aos componentes de segurança que este possa lhe transmitir. Além disso, quando o assunto é família, as mulheres parecem se importar mais com esse aspecto.

Contrariando o senso comum

Outra constatação foi a de que os homens são mais românticos e mais dependentes dos relacionamentos amorosos que estabelecem com suas parceiras. Além disso, homens também seriam mais propensos do que as mulheres a acreditar na noção de amor à primeira vista.

Outros estudos reforçam a ideia de que a mulher tem maior poder de observação, sendo capaz de detectar sinais, de entender linguagem não-verbal. Isso acontece porque elas têm o centro de fala quatro vezes maior que os homens, por isso falam mais e gostam de esticar o papo. Além disso, elas têm o hipocampo, uma parte do encéfalo responsável pelas memórias, maior que o homem, por isso, ficam recorrendo constantemente e revisitando fatos do passado que, aparentemente, para o homem tem pouca importância.  “Daí ela ser tão encantada quando os homens proferem cortejos verbais para elas”, atesta Almeida. Outra diferença entre os sexos é que o homem é preponderantemente estimulado por fatores visuais, como o corpo e forma da mulher, por exemplo.

Conexão pelas redes sociais

Em sua pesquisa, o psicólogo observa que nos dias atuais é muito comum a participação da rede internet no cotidiano, sobretudo no que diz respeito aos relacionamentos amorosos. “A rede social que antes dependia da presença e proximidade física para se manter, hoje surge mediada por ferramentas que potencializam o poder de conexão entre as pessoas. Facebook, Twitter e Instagram, somente para citarmos alguns, são termos frequentemente presentes quando se estudam as dinâmicas da comunicação na contemporaneidade”, afirma.

A sociedade experimenta hoje um movimento de vanguarda que revoluciona as novas formas estabelecer relações afetivas, como o chamado poliamor – na qual os indivíduos têm o direito de ter mais que um relacionamento amoroso com o consentimento de ambas as partes. “Então, essa modalidade de relacionamento abre campo para que homens e mulheres passem a vivenciar uma maior liberdade no que diz respeito à monogamia, tão pregada em nossa cultura ocidental contemporânea. Essa prática seria uma recusa à monogamia como princípio fundamental e defende a necessidade de formar parcerias simultâneas, o que possibilita aos seus adeptos diferentes experiências e vários amores de forma profunda e duradoura”, diz. O poliamor seria explicado a partir da nossa capacidade de sentirmos afeto e atração sexual por várias pessoas. Aqueles que permitem que esta capacidade seja expressa por meio dos seus comportamentos acabam desenvolvendo relacionamentos com vários parceiros. Outros termos já foram usados para descrever este tipo de relacionamento, como “relacionamento aberto”, “amizade colorida”, “amizade com benefícios”, “amizade com privilégios”.

O poliamor

No poliamor, não existe idealização do parceiro. Um poliamorista não aceita a ideia de que o parceiro possa completá-la de todas as maneiras e nem mesmo alimenta a ilusão de que os envolvidos vão se transformar numa só pessoa.  Por isso, não exige exclusividade nas relações. “O poliamor pressupõe honestidade, ou seja, os poliamoristas argumentam que não se trata de procurar obsessivamente novas relações pelo fato de ter essa possibilidade sempre em aberto, mas de viver naturalmente tendo essa liberdade em mente”, completa. Em um dos seus estudos: “Ciúme romântico e infidelidade amorosa entre paulistanos: incidências e relações”, outro ponto estudado pelo pesquisador é a relação do amor com o ciúme. Para o senso comum e, sobretudo, para a cultura brasileira, percebe-se a manutenção de um ambiente favorável comportamento ciumento. Isto é, os parceiros consideram impelidos a demonstrar ciúme como prova de amor. Assim, o ciúme é visto como uma maneira de fazer com que seu parceiro se sinta valorizado. “O amor e o ciúme começam a se relacionar, na medida em que o ciúme visará manter o indivíduo amado junto a si”, conclui.

Amor e egoísmo

Almeida ainda investigou a oposição entre amor e egoísmo. O egoísmo pode ser definido como: “amor exagerado aos próprios interesses a despeito dos de outrem e exclusivismo que leva uma pessoa a se tomar como referência a tudo” (segundo definição do Dicionário Aurélio)  e o amor pode ser compreendido como “forte afeição por outra pessoa, nascida de laços de consanguinidade ou de relações sociais e afeição baseada em admiração, benevolência ou interesses comuns; forte amizade” (também retirado do Dicionário Aurélio). Daí se conclui que o amor, em si, não é egoísta.

“No entanto, nem todo o relacionamento afetivossexual que estabelecemos pode ser considerado amoroso, no sentido de regido pelo amor. Ele pode ser regido por outras situações, como necessidades pragmáticas, o famoso ‘toma lá, dou cá’, como o caso de ‘sugar babies’, somente para citarmos alguns exemplos disso”, destaca. Segundo ele, precisamos reconhecer que existem pessoas que não nos amam como merecemos, elas estão conosco em busca de benefícios, para satisfazer seus desejos e preencher seus vazios. Os egoístas emocionais são pessoas que não querem e tampouco entendem a linguagem do amor, não te amam, porém, adoram os benefícios que a relação com você proporciona a elas.

O psicólogo Erich Fromm foi um dos primeiros autores a falar a respeito do egoísmo nos relacionamentos. De acordo com o autor de “O medo à liberdade” e “A arte de amar”, há quem conceba as relações como um cenário claramente orientado a tomar e receber puramente. São homens e mulheres incapazes de enxergar nada além da sua prioritária esfera pessoal. Tal qual um buraco negro que engole tudo, a sua volta e não devolve nada, pessoas egoístas nada tem a nos oferecer, exceto carências e decepções.

Nesse sentido, o egoísta aliena o outro e nele somente enxerga um meio de alcançar seu objetivo pessoal. Para os psicólogos, o egoísmo é um defeito de caráter que precisa ser trabalhado, pois a pessoa com a personalidade egoísta carece de amor-próprio, resultando em pessoas frustradas e tão cheias de necessidades que instrumentalizam as relações para obterem o que necessitam delas, exigindo dos outros aquilo que elas mesmas não têm. No livro “ “Amor, ciúme e infidelidade: como estas questões afetam a sua vida?”, diz o pesquisador: “Amar dignifica qualquer atitude humana. A vida é extremamente curta e não deve ser, de modo algum, desperdiçada correndo atrás de pessoas erradas que não merecem ser amadas”.

E MAIS…

Muitas mudanças ao longo da história

O psicólogo explica que o amor foi concebido de diferentes maneiras ao longo da história. Nas civilizações antigas, como no Egito do ano 1000 a.C, o amor era visto como uma doença que deveria ser erradicada. “Em civilizações como o Egito o amor era retratado como um esmagamento do eu e, portanto, semelhante a uma espécie de doença que deveria ser erradicada. O incesto para os egípcios era normal por ter como referência sua religião. O deus Osíris casou-se com a deusa Isis, sua irmã. A união resultou no nascimento de Hórus que, no futuro, se casaria com a deusa Hathor [em algumas traduções, Hator], deusa que personifica os princípios do amor, da beleza, da maternidade e dos prazeres”, observa Almeida.

Já na cultura da Antiguidade clássica, os homens gregos geralmente não nutriam amor pelas mulheres, ou seja, elas eram consideradas, muitas vezes, um meio para reprodução. “Ainda assim, o amor era uma temática muito importante em sua filosofia. Os gregos ideavam o amor como uma força harmonizadora e o compreendiam como o fundamento do amor sexual”, pontua. O pesquisador cita o exemplo do filósofo Platão, que contribuiu com as noções que convivemos atualmente, de amor platônico (no sentido de idealizado, no mundo das ideias) e que para amarmos alguém, “precisamos ser almas gêmeas” de outra pessoa, que remete ao mito do Andrógino.

Ele lembra que a sociedade contemporânea sofreu profundas transformações a partir do movimento feminista, que se apoiou no uso de contraceptivos e defendeu a presença da mulher no mercado de trabalho, resultando no empoderamento feminino.