A Era Digital emerge uma questão sensível e, ao mesmo tempo, crucial: até que ponto os pais ou responsáveis legais têm o dever , e o direito, de monitorar a atividade online de seus filhos?

A resposta demanda um exame estreito das normas legais e dos princípios que regem o poder familiar, os direitos da personalidade e a proteção da criança e do adolescente.

É importante levantar os deveres legais dos pais no monitoramento da atividade online dos filhos.

O poder familiar, conforme disposto nos artigos 1.630 e seguintes do Código Civil brasileiro, compreende um conjunto de deveres e direitos conferidos aos pais no tocante à pessoa e aos bens dos filhos menores.

Trata-se de uma função eminentemente protetiva, cujo núcleo se assenta na ideia de dever e não de privilégio. Entre esses deveres, destacam-se o de guarda, sustento e educação, todos com um viés profundamente voltado à formação moral, psíquica e intelectual da criança e do adolescente.

Manipulação psicológica dos algoritmos

A Constituição Federal de 1988, por sua vez, reforça esse papel ao estabelecer, no artigo 227, que é dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, os direitos à vida, à saúde, à dignidade, à convivência familiar e comunitária, além da proteção contra toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

Nesse contexto, o acesso irrestrito à internet , embora traga inegáveis benefícios pedagógicos e sociais , expõe os menores a riscos concretos e recorrentes, como o cyberbullying, o aliciamento por criminosos (inclusive de cunho sexual), jogos de desafios perigosos, acesso a conteúdos inapropriados e, não raramente, à manipulação psicológica por meio de algoritmos e inteligência artificial.

O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) estabelece, em seu art. 17, o direito ao respeito e à dignidade da criança, compreendendo a inviolabilidade da integridade física, psíquica e moral , o que inclui, por certo, sua exposição ao ambiente virtual.

Assim, emerge o dever legal dos pais de exercer vigilância responsável sobre a atividade digital dos filhos, o que não se confunde com invasão de privacidade ou abuso de autoridade.

Finalidade educativa e zelo preventivo

A jurisprudência brasileira tem reconhecido que o direito à privacidade, ainda que garantido aos menores, deve ser ponderado à luz da proteção integral prevista na Constituição e no ECA. Isso significa que a supervisão dos pais é não apenas lícita, como esperada, quando exercida com proporcionalidade, finalidade educativa e zelo preventivo.

O monitoramento parental pode envolver desde o diálogo frequente sobre os riscos da internet até o uso de ferramentas tecnológicas que permitam acompanhar os conteúdos acessados, o tempo de uso e as interações nas redes sociais. Importa lembrar que o próprio Marco Civil da Internet (Lei nº 12.965/2014), embora resguarde a privacidade dos usuários, não veda o controle exercido por pais ou responsáveis sobre os dados e comunicações de menores, desde que respeitados os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.

A omissão nesse dever, por outro lado, pode configurar negligência parental, com possíveis repercussões cíveis e até mesmo penais, dependendo do grau de exposição e dos danos causados à criança ou adolescente.

Além disso, em casos de violência online contra o menor, a ausência de supervisão pode ser interpretada como fator que contribuiu para a perpetração do ato lesivo.

Dessa forma, não há dúvidas de que a parentalidade na Era Digital exige um reposicionamento ativo dos pais quanto à sua função de educadores e protetores.

Exercício legítimo do poder familiar

O dever legal de monitorar a atividade online dos filhos não deve ser compreendido como uma violação de suas liberdades individuais, mas sim como um exercício legítimo do poder familiar voltado à preservação de sua integridade física, psíquica e moral.

É preciso, enfim, que pais e responsáveis compreendam que sua atuação na esfera digital é tão necessária quanto na esfera física.

A omissão nesse campo equivale, em muitos casos, a abandonar os filhos à própria sorte num território que, embora virtual, é real em seus efeitos e perigos.

O cenário digital exige que o direito acompanhe as transformações sociais, mas também que os pais exerçam com responsabilidade os deveres inerentes ao poder familiar.

Monitorar, orientar e proteger os filhos em suas interações online é não apenas um direito, mas um dever jurídico e moral inarredável.

Cabe, portanto, ao núcleo familiar ressignificar seus métodos educativos para que, sem autoritarismo, assegure-se à criança e ao adolescente uma vivência digital segura, saudável e compatível com seu estágio de desenvolvimento.